Com remixes oficiais de Seu Jorge e Robin Gibb, o DJ e produtor Lucas Ferreira fala sobre carreira, desafios longe dos grandes centros e os seus próximos passos
Por Priscila Fagundes

LFERREIRA: “Um dos meus objetivos é ser o artista que mais remixou outros artistas brasileiros” Foto: Divulgação
Nascido em Pelotas e atualmente morando em Jaraguá do Sul (SC), Lucas Viera Ferreira — ou simplesmente LFERREIRA — construiu sua trajetória na música eletrônica longe dos holofotes dos grandes centros. O artista, que hoje soma mais de 100 mil plays no Spotify e coleciona parcerias com nomes de peso como Seu Jorge e Chemical Surf, começou ainda criança, gravando coletâneas com o irmão e se encantando com as trilhas dos filmes que o pai alugava na locadora.
Com uma rotina intensa de produção musical em seu home studio, LFERREIRA desenvolveu uma assinatura própria nos remixes e tem como missão ampliar a presença da música brasileira no universo eletrônico. Nesta entrevista, ele fala sobre sua relação com a música, os desafios do mercado, o papel das redes sociais e o que vem por aí.
Arte no Sul – Quais foram os maiores desafios de começar uma carreira na música eletrônica longe dos grandes centros?
LFERREIRA – O desafio de viver da criatividade ainda é grande. No começo, o mais difícil é fazer as pessoas conhecerem, conquistar espaço e criar uma conexão real com o público, agregar valor à marca de fato. Mas o desafio não para por aí. Hoje, tudo é muito rápido… as redes sociais exigem conteúdos curtos, dinâmicos e em constante evolução. Se você não acompanha esse ritmo, acaba ficando para trás.
Arte no Sul – Teus remixes têm uma identidade muito própria. Como tu escolhes as músicas que vai transformar? O que te chama atenção nelas?
LFERREIRA – Não sinto que sou eu quem escolhe a música, na verdade, parece que é ela quem me escolhe. Costumo me deixar levar por faixas com vocais marcantes e melodias que ficam na cabeça. Gosto de músicas elegantes, que trazem uma energia boa. Às vezes, uma track simplesmente aparece na minha mente, do nada… e quando vejo, já estou no estúdio produzindo.
Arte no Sul – Quais os maiores clássicos que tu já remixaste? Como foi a experiência? Como tu equilibras o respeito à obra original com tua própria assinatura?
LFERREIRA – Ainda me considero um produtor musical em início de jornada, especialmente quando comparo com grandes nomes do mercado internacional, muitos com mais de 30 ou 40 anos de carreira consolidada. Mesmo assim, uma das produções que mais me marcaram foi a releitura oficial de “Like A Fool”, do Robin Gibb. Quando produzi a faixa, Robin já havia falecido, então a oficialização veio por meio das editoras, com um acordo 100% liberado. Recriei todos os acordes da música do zero e convidei um cantor com uma voz muito próxima à de Robin. Apesar de não considerar essa a minha melhor produção, foi sem dúvida uma das mais significativas. Depois disso, tive a oportunidade de fazer um remix oficial de “Quem Não Quer Sou Eu” para o Seu Jorge, que teve uma repercussão ainda maior e representou um marco enorme na minha carreira. Já meu primeiro remix oficial foi em 2018, da música ”Ouriço”, do Juliano Holanda, que foi tema de uma minissérie da Globo. Em termos de estilo, procuro sempre manter a essência da música original, preservando certos acordes e mudando os timbres dos instrumentos — para que o ouvinte ainda consiga sentir a identidade da faixa original, mesmo numa releitura.
Arte no Sul – Existe alguma música que tu ainda sonhas em remixar? Aquele desafio que ainda não rolou… mas que está no radar?
LFERREIRA – Tenho várias vontades. Um dos meus objetivos é ser o artista que mais remixou outros artistas brasileiros, então cada remix acaba sendo parte do meu portfólio, uma nova experiência e um passo a mais nessa trajetória. Quero muito remixar oficialmente mais músicas do Seu Jorge, além de outros nomes da MPB que combinam com um ”Tech House gostozinho”, como Jorge Vercillo e Zeca Baleiro. Já no universo eletrônico, um grande sonho é fazer um remix oficial para Lukas Ruiz (Vintage Culture).
Arte no Sul – Tu já dividiste o palco com gigantes como Chemical Surf e Dubdogz. Como foi essa experiência e o que aprendeste com esses encontros?
LFERREIRA – Sempre encaro essas experiências de forma muito positiva. Estou ali pra trabalhar, sendo pago por isso… e ainda tenho a chance de fazer networking com artistas maiores, que têm carreiras que muitos sonham em alcançar. O aprendizado é constante. Gosto de observar, absorver. Nunca fui do tipo “deslumbrado”, sempre mantive minha postura, com respeito e profissionalismo. Já encontrei os meninos do Chemical Surf nos palcos e nas pistas por aí, é sempre muito bom trocar uma ideia com eles. São extremamente talentosos e merecem todo o sucesso que conquistaram.
Arte no Sul – Como tu enxergas o cenário da música eletrônica aqui no Sul do Brasil? Tem espaço para quem quer começar?
LFERREIRA – Não costumo acreditar muito em um “cenário eletrônico”, o que consigo afirmar é que existem eventos que funcionam. Alguns dão certo porque há um intervalo de meses entre uma edição e outra, o que permite que o público se organize financeiramente. Afinal, frequentar eventos de música eletrônica não é barato. Para que tudo aconteça de forma sustentável, existe toda uma estrutura por trás… preços, poder de compra, logística e isso é especialmente desafiador no Rio Grande do Sul, principalmente no interior. Sobre espaço no mercado, sempre vai haver. O problema é que hoje tudo está mais competitivo. Não basta ser DJ, é preciso produzir sua própria música, estar presente nas noites, se conectar com as pessoas, ser ativo nas redes sociais, conversar com o público, fazer novos amigos e, de algum modo, movimentar os ventos a seu favor. Se você quer tocar em determinado lugar, o mínimo é frequentá-lo como cliente antes.
Arte no Sul – Tu sentes que, de certa forma, também estás ajudando a abrir caminho para novos DJs da região? Te vês como uma referência?
LFERREIRA – Acredito que sim. Já ofereci mentorias gratuitas para artistas em início de carreira, pois, quando comecei, não recebi esse tipo de apoio e sei como isso faz diferença. Sempre que posso, procuro ajudar com conselhos e compartilhar os erros que cometi para que outros não precisem passar pelas mesmas dificuldades. Além disso, nos eventos “LFERREIRA & Convidados”, costumo abrir espaço para artistas novos, geralmente convidando-os para fazer o warm up, dando uma oportunidade para quem ainda não teve chances no mercado. Durante a pandemia, criei minha própria gravadora, a Stay On Main. Apesar de uma pausa de cerca de dois anos por questões financeiras, retomei o projeto este ano e lancei a faixa “Don’t Wanna Be”, em parceria com o DJ Fred Taboada. O próximo lançamento será de um artista novo que venho acompanhando, ele me enviou uma demo, fiz algumas sugestões e ele ajustou a track. Estamos com o lançamento programado para o próximo mês a princípio. Sempre que possível, faço questão de apoiar talentos emergentes, sem esperar nada em troca. Acredito que essa troca e colaboração são fundamentais para o crescimento coletivo na cena musical.
Arte no Sul – O que vem por aí? Algum lançamento, colaboração ou projeto novo que tu possas dar spoiler pra gente?
LFERREIRA – Neste ano estou focado na criação de conteúdo para as redes sociais. Desde o começo do ano, produzi muitas músicas… só falta finalizar algumas delas [risos]. Em breve, vou lançar uma nova série de sets exclusivos para o meu canal no YouTube. Estou migrando meu conteúdo do Instagram para o TikTok, onde pretendo compartilhar vídeos mostrando projetos abertos, meu processo criativo nas tracks, bastidores e outras novidades. A minha gravadora, Stay On Main, também terá novos lançamentos ainda este ano. Para 2025, planejamos ampliar os lançamentos autorais, e em 2026, além das novidades musicais, vamos celebrar os 10 anos do projeto com uma edição especial do “LFERREIRA & Convidados” em Pelotas/RS. Resumindo, tem muita coisa boa vindo por aí! Que Deus nos acompanhe para que tudo aconteça com sucesso.
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