Entre livros e relíquias: Biblioteca e Museu celebram o saber do passado, presente e futuro da cidade
Por Chaiane Römer e Amanda Leitzke

Casa da Cultura Marlene Barbosa Coelho abriga as duas instituições Foto: Chaiane Romer
A Casa da Cultura Marlene Coelho, localizada no centro de Canguçu, é um espaço onde o passado e o futuro se encontram. Construído no século XIX, durante o período Imperial em estilo neoclássico, foi originalmente a residência da família Piegas, onde ocorreram memoráveis saraus e comemorações, como o casamento dos filhos da família. Em 12 de dezembro de 1901, os herdeiros venderam o palacete para a municipalidade de Canguçu. Desde então, o edifício testemunhou momentos históricos marcantes e hoje abriga a Biblioteca Municipal Clóvis Rocha Moreira e o Museu Municipal Capitão Henrique José Barbosa.

Biblioteca homenageia radialista e conta com cerca de 13 mil livros Foto: Reprodução Prefeitura de Canguçu
A Biblioteca Municipal Clóvis Rocha Moreira possui um acervo de quase 13 mil livros, incluindo títulos técnicos, profissionais e literários, além de exemplares históricos e uma seção dedicada a autores canguçuenses. A biblioteca homenageia, de acordo com a Lei nº 3323, Clóvis Rocha Moreira, um nome fundamental para a cultura e comunicação local. Apaixonado pelo rádio, Moreira foi um dos responsáveis pela fundação da Rádio Liberdade AM e contribuiu para a produção das primeiras novelas radiofônicas de Canguçu. Além disso, destacou-se como compositor e escritor, deixando um legado importante para a literatura e a música da cidade.
Segundo a biblioteconomista Carina Pires, “mais do que um espaço de leitura, a biblioteca desempenha um papel essencial na inclusão digital, oferecendo computadores de acesso público de forma gratuita e promovendo projetos de mediação e contação de histórias que incentivam a leitura e democratizam o conhecimento”. Os frequentadores mais assíduos são idosos do interior do município, além de estudantes, pesquisadores e escritores que buscam informação e inspiração.

Museu abriga cerca de 12 mil peças que ajudam a contar a história Foto: Reprodução Prefeitura de Canguçu
O Museu Municipal Capitão Henrique José Barbosa, fundado oficialmente em 1983, tem raízes ainda mais antigas, remontando a 1972, quando a professora e animadora cultural Marlene Coelho iniciou a coleta e preservação de objetos históricos da cidade. Seu nome homenageia o Capitão Henrique José Barbosa, que lutou nas guerras do Uruguai e do Paraguai, onde veio a falecer.
O museu abriga aproximadamente 12 mil peças que ajudam a contar a história de Canguçu e região. Entre os destaques do acervo estão uma unha de megatério, preguiça gigante que viveu há cerca de 20 mil anos, um piano de cauda do século XIX, peças indígenas, algemas utilizadas durante o período da escravidão, cartas da Guerra do Paraguai e o poncho do folclorista Barbosa Lessa.
A professora de história Miriam Zuleica Reyes Barbosa destaca que “o museu não apenas preserva objetos históricos, mas também funciona como um guardião da memória coletiva do município, permitindo que as novas gerações tenham contato direto com o passado através das visitas guiadas e exposições”.
A integração entre a biblioteca e o museu torna a Casa de Cultura um verdadeiro centro de referência histórica e cultural. Um exemplo disso é a exposição comemorativa aos 120 anos do nascimento de Érico Verissimo, que, neste ano de 2025, relembra sua obra “O Tempo e o Vento”. A iniciativa busca criar um diálogo entre literatura e história ao expor não apenas os livros do autor, mas também artefatos do museu que remetem às descrições presentes na obra.
A história da Casa de Cultura Marlene Coelho reforça sua importância para Canguçu. Nomeado em homenagem à professora Marlene Coelho, responsável pela idealização do Museu Municipal, o local é um marco da preservação cultural na cidade. Tombado pelo Patrimônio Histórico Municipal, foi ali que, em 1939, aconteceu a cerimônia de elevação do município à categoria de cidade. O local também recebeu figuras políticas marcantes, como o interventor federal Oswaldo Cordeiro de Farias e os governadores Leonel Brizola e Ildo Meneghetti. Durante anos, o Salão de Honra foi palco das posses de prefeitos e vice-prefeitos, bem como de despedidas fúnebres de governantes locais.
Além de sua relevância histórica, o edifício se destaca pela sua arquitetura imponente. Sua fachada eclética do final do século XIX apresenta acesso central com uma porta de duas folhas e um vitral superior. A escada principal é de legítimo mármore italiano, e o prédio possui 21 janelas com postigos internos e arestas arredondadas simetricamente à fachada frontal. O porão, provido de gateiras com grades, provavelmente servia para armazenar mantimentos e abrigar pessoas que foram escravizadas. No interior, o Salão Nobre exibe um magnífico entalhe no forro e mantém móveis originais da casa, preservando a elegância do período imperial.
O prédio é de grande importância para a cidade, pois além de testemunhar a antiguidade do município, ou seja, o 22º a ser criado no Estado do Rio Grande do Sul, no ano de 1857, vem resistindo ao tempo e às investidas da modernidade, guardando o seu aspecto original. Em 1982, quando a prefeitura foi transferida para outro edifício, o palacete passou a abrigar a biblioteca e o museu, consolidando-se como espaço de preservação e difusão cultural. Hoje, o prédio continua resistindo ao tempo e à modernização, mantendo-se como um ponto de encontro entre gerações, onde memórias do passado são guardadas e compartilhadas para iluminar o futuro.
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