O filme da Letônia comprova que criatividade e inovação estão presentes no cinema internacional mesmo com recursos limitados
Por Lorenzo Goulart Bonone

História: Um gato que vive na floresta vê o seu lar ser tomado por uma enchente rapidamente
Quem acompanhou as premiações de cinema da temporada 2024/2025 viu um gatinho preto virar um fenômeno global. Dirigido por Gints Zilbalodis, “Flow” conquistou 54 prêmios em 70 indicações, incluindo Melhor Animação nos principais eventos como o Oscar, Globo de Ouro, Festivais de Veneza e Cannes e o Globo de Ouro. Neste caminho, desbancou os estúdios Pixar (com “DIvertidamente 2”) e Dreamworks (com o ótimo “Robô Selvagem”). O longa-metragem contou com uma equipe de apenas 20 pessoas, utilizou o software gratuito Blender e um orçamento de apenas U$3,7 milhões (conquistado com apoio de políticas do governo da Letônia). A título de comparação, “Divertidamente 2” e “Robo Selvagem” contaram com orçamento de US$ 200 milhões e U$78 milhões, respectivamente.
No país de origem, a equipe do filme foi recebida com festa, e as estatuetas estão em exposição no Museu Nacional de Arte Letã, e o diretor divulgou diversas animações comemorando o feito. Em Riga, capital da Letônia, foi erguida uma estátua do protagonista.
A história do personagem principal é a de um gatinho preto que vive na floresta e vê o seu lar ser rapidamente tomado por uma enchente. Na tentativa de sobrevivência, ele se encontra em um barco que une a uma capivara, um cachorro labrador (inspirado no cão do diretor), um lêmure e um secretário (espécie de ave de rapina). O filme narra os perigos, convivências e adaptações do grupo com a sua nova realidade.
Narrativamente, a obra cativa o público com cenas fofas que imitam características de gatos, como a curiosidade, brincadeiras com reflexos ou as famosas bolas de pelo, ao menos tempo que cria uma forte relação de sobrevivência entre animais que seriam inimigos naturais. Mesmo sem falas, o filme capta diálogos nas expressões, atitudes e sons dos animais, seja nos conflitos, momentos de calmaria ou aprendizados. As situações de risco encaradas pelo gatinho são o ponto de maior tensão no roteiro, deixando o espectador tenso.

“Flow” estreou nos cinemas brasileiros no dia 20 de fevereiro Imagens: Divulgação/Prime Video
Aqui cabe destacar o trabalho fantástico do engenheiro de som Gurwal Coïc-Gallas. que por diversas horas gravou animais reais para encaixar no longa de duas horas. Um dos desafios foi o som da capivara, que acabou sendo substituída por um camelo filhote. Nas redes sociais, Coïc-Gallas compartilhou a captação das “vozes” de sua gatinha Miut, que serviu de base para o protagonista.
Além da óbvia mensagem sobre um futuro em que não conseguimos combater as mudanças climáticas, o filme traz mensagens interpretativas ao maior estilo David Lynch e Hayao Miyazaki. As mensagens dependem de cada espectador, mas é possível buscar no roteiro entender o que Zilbalodis quis transmitir. Mesmo que a narrativa seja feita pelo drama dos animais tentando sobreviver, a presença de uma baleia na enchente da floresta pode indicar que nem sempre o que é negativo para alguém, não pode ser positivo para o outro. A subida e descida da água também pode indicar que todas as adversidades são passageiras.
“Flow” está em exibição nos cinemas do Brasil, e ainda não tem previsão para estreia digital.
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