Modelagem Urbana: Crescimento Urbano e a preservação dos recursos hídricos em Santiago/RS

Por: Ana Cláudia Machado Grossi

Introdução

O estudo realizado na Disciplina de Modelagem Urbana 2, aborda o assunto de modelagem urbana por meio de autômatos celulares para a simulação de crescimento urbano e a preservação dos recursos hídricos em Santiago/RS. Propõe-se a analisar as variáveis ambientais e urbanas que influenciam no desenvolvimento de uma cidade como estudo de caso, simula o crescimento futuro de trinta e seis anos a partir do modelo calibrado e de experimentação de outras alternativas. O trabalho permite visualizar e analisar prováveis evoluções urbanas a partir de aspectos morfológicos e da acessibilidade. A cidade escolhida para o estudo foi Santiago no Rio Grande do Sul, próximo à fronteira com o Argentina. Resultando na valorização ao meio ambiente, sem prejudicar o crescimento e desenvolvimento urbano. Será abordada a influência de fatores como bacia hídrica, topografia, matas nativas e a BR de acesso à cidade no desenvolvimento urbano.

A cidade de Santiago/RS

A Cidade de estudo foi Santiago, Rio Grande do Sul. Utilizando-se de modelagem urbana realizou-se um estudo de crescimento no desenvolvimento de uma estrela de cinco pontas do município de Santiago. Localizado no estado do Rio Grande do Sul, 354 metros de altitude, de Santiago tem as seguintes coordenadas geográficas: Latitude: 29° 10′ 23” Sul, Longitude: 54° 51′ 21” Oeste. Limita ao Norte com o município de Bossoroca (45 Km) e Itacurubi (75 Km), ao Sul com o município de São Francisco de Assis (56 Km), Nova Esperança do Sul (36Km) e Jaguari (47Km), ao Leste com o município de Jarí (120 Km) e Capão do Cipó (53 Km) e ao Oeste com Unistalda (42 Km). Apresenta 73.2% de domicílios com esgotamento sanitário adequado, 85.4% de domicílios urbanos em vias públicas com arborização e 41.4% de domicílios urbanos em vias públicas com urbanização adequada (presença de bueiro, calçada, pavimentação e meio-fio. A população no último censo [2010] é de 49.071 pessoas. As imagens ilustradas abaixo e as demais, foram posicionadas no mesmo ângulo para a simulação do programa.

Figura 01_ imagem do mapa da cidade /RS

Figura 02_ imagem de satélite da cidade Santiago/RS

Autômatos celulares e o programa CityCell

A simulação do crescimento urbano utilizou-se o software CityCell – Urban Growth Simulator, desenvolvido por Saraiva e Polidori (2014). O programa foi concebido com base no modelo de autômatos celulares que consiste em um modelo matemático que simula o desenvolvimento urbano no espaço e no tempo. Echenique (1975) indica que para trabalhar com um modelo matemático é necessário ter um objeto de estudo, uma intenção, um processo de observação e abstração, tradução para os meios de representação, verificação e obtenção de conclusões. Resulta na simulação de uma simplificação da realidade, composta por principais características eleitas pelo observador. O modelo de autômato celular pode ser construído a partir de simples células e por regras de transições implementadas no modelo que exercendo a auto organização e reproduzindo padrões semelhantes, permite expressar o complexo desenvolvimento urbano ao longo do tempo, em um espaço celular. Autômato celular é um elemento que possui características próprias espaciais e mecanismos para processar suas características próprias e as externas. Os autômatos individuais são arranjados em um  grid, malha digital.

O uso da plataforma CityCell implica em três etapas. Inicialmente inserem-se as variáveis consideradas relevantes para o estudo, traduzindo-as para a linguagem da plataforma. Essa etapa consiste na entrada de dados, os chamados Inputs. As variáveis adicionadas, também chamados de atributos, recebem um parâmetro, ou seja, um valor relacionado ao seu peso de interação. A segunda etapa consiste no processamento. No Grid do CityCell as células dos atributos interagem entre si a partir de tensões de atração ou resistência à urbanização, geradas pelos atributos. A somatória dessas tensões provoca diferenças de centralidade, que indicam o potencial de mudança de estado da célula. A mudança de estado da célula promove o crescimento urbano. Na etapa final, constitui na obtenção e análise dos resultados, os outputs.

  1. CityCell_ Urban Growth Simulator , programa computacional de simulação

A simulação do modelo no CityCell é baseada em autômatos celulares. Nos estudos sobre o espaço urbanizado e a paisagem natural, são modificadas pela ação humana relacionando as semelhanças teóricas e metodológicas. Propõe-se uma versão ampliada de uma dessas medidas, denominada Acessibilidade Ponderada. O CityCell apresenta um plano de trabalho com células quadradas dispostas em um grid. Para este estudo configurou-se a dimensão da célula em 200 metros e utilizou-se referência geográfica em Projeção UTM. Os Inputs, ou dados de entrada, foram modelados com base em imagens de satélite e em antigos desenhos urbanos. Verificou inicialmente os seguintes atributos urbanos como importantes para o desenvolvimento do estudo: o mapa de cursos d’água, mapa esgoto, mapa de matas nativas, topografia e o mapa das estradas de acesso. Sendo o principal meio de transporte é o rodoviário. O Município é cortado pela Rodovia Federal BR 287, a qual faz ligação com São Borja e com Santa Maria, sendo que neste Município a Rodovia Federal 392 dá acesso até Rio Grande.  Possui também duas Rodovias Estaduais: a RS 168, que faz ligação com Bossoroca e a RS 377 que liga ao Município de São Francisco de Assis, Alegrete, Uruguaiana e Capão do Cipó. Passa pelo Município a Ferrovia STG 365 que faz ligação com Jaguari, São Borja e Bossoroca, utilizada exclusivamente para transporte de cargas. O Município conta também com um aeroporto com campo de pouso para aviões de pequeno porte, cuja pista está em vias de ser asfaltada.

Figura 3_Inputs, imagem de satélite e grades

Figura 4_Inputs, nascentes e olho d’água Fonte: autora

Figura 3: Inputs. a) topografia em escala de 1 a 5. b) matas nativas (verde imagem) e cursos d’água (azul claro). c) configurações urbanas (marrom1985), configurações urbanas (verde 2021) Fonte: autora

Figura 4: Inputs. Ao fundo da imagem a) topografia em escala de 1 a 5. b) matas nativas (verde imagem) e cursos d’água (azul claro). c) configurações urbanas (marrom1985), configurações urbanas (verde 2021), nascentes em blocos (azul anil), olho d’água entre a nascente e curso d’água (azul) Fonte: autora

Na figura 1a é apresentada a topografia, sendo legendada em três níveis. O número 1 representa o nível mais baixo ocupado pela urbanização através da imagem por satélite. A ocupação urbana encontra-se nas zonas numeradas por 2 e 3. Essas foram as zonas adotadas como mais favorável ao crescimento urbano para esse estudo. A mata nativa e os cursos d’água estão representados, respectivamente, em verde e azul na figura 1b. Os atributos urbanos estão apresentados na figura 1c. Em tons de verde musgo encontram-se as configurações urbanas de 2021 (mais claro), 1985 em marrom no centro da imagem. Os atributos naturais e os urbanos como atração ao crescimento.

Na figura 2a é apresentada como fonte do estudo, as nascentes estão representadas por blocos de quatro células em azul anil e o olho d’água em azul, no caminho do curso da d’água representado de azul mais claro, como base de estudo nas simulações seguintes.

Em seguida, iniciou-se o processo de calibração do modelo. Esse processo foi estudado valores e aplicados aos atributos, que definam as relações entre as células, visando uma configuração próxima à realidade. Utilizando a regra de interação “Threshold Potencial”, ou potencial de crescimento limiar, realizou-se uma série de processos de quarenta interações buscando um resultado próximo à configuração urbana de 2021. Considerou-se a configuração urbana de 1985 com valor 1; atração de 0,2 para as estradas; como atração 0,8 para o corredor das tropas; 1 para os demais atributos (matas nativas, cursos d’água e aleatório). Nessa simulação inicial observou-se um crescimento esperado e principalmente exagerado nos pontos circulados em vermelho na figura 2. Nessa figura representa-se em verde a configuração da cidade de 2019 (alvo da simulação) e em marrom, a evolução urbana resultante da simulação.

Figura 05_ Calibrado crescimento 1,95%

Figura 06_ Calibrado, Fuzzy R1 0,715%   Fonte: autora          

Figura 07_ Gif animação do crescimento urbano Fonte: autora

Identifica-se, observando a figura 5 que as regiões em que houve maior crescimento em relação ao alvo adotado encontram-se nas altitudes mais favoráveis ao desenvolvimento (representadas nas cores verde musgo e verde claro). Nas figuras 5 e 6 também estão representadas congeladas, as configurações urbanas de 1985 e 2021, e em vermelho, aparece crescimento atrativo nas estradas. Nas simulações seguintes variou-se os valores de resistência de acordo com os níveis, sem a preocupação em preservação das águas, buscando obter informação do avanço urbano sem preservação comparando com a simulação com preservação das águas e nascentes no avanço nos pontos identificados.

Figura 8, 8.1: simulação com valores de R1 71,4% taxa acerto. Fonte: autora

Figura 9, 9.1: simulação com valores de R2 71,5% taxa acerto. Fonte: autora

Na simulação da figura 8 foram utilizados parâmetros de 1 a 1,95, para R1 71,4% a taxa de acerto dentro da topografia em escala de mais  favorável. Enquanto que na simulação da figura 9.1, R2 71,5% taxa de acerto, adotou-se valores com maior intervalo. Em ambos casos persistiu o crescimento nos pontos circulados em vermelho. Em outra tentativa de calibrar o modelo, optou-se por considerar também o princípio de cidade, configuração urbana de 1885, utilizando os demais parâmetros da simulação da figura 9.1.

  1. Prosses, Processo em análise no futuro sem e com a preservação das águas

A simulação do modelo sem a devida preservação das nascentes, olho d’água e curso da mesma, identifica um crescimento urbano concentrado como processo espacial demográfico numa concentração urbana. Chamando atenção no desenvolvimento de habitações verticalizadas, como, por exemplo: a diminuição de exposição à luz solar; a maior dificuldade na circulação do ar. Na figura 10, 10.1, 10.2 a simulação de 36 anos futuros sem a preservação reflete em crescimento 1,8% Average Growth%.

Figura 10 crescimento, 10.1 crescimento concentrado, 10.2 imagem da tabela_ Tables  Fonte: autora

Figura 10.3 Gif imagem sem preservação das águas  Fonte: autora

A simulação do modelo com a devida preservação das nascentes, olho d’água e curso da mesma, identifica um crescimento urbano concentrado como processo espacial demográfico numa concentração urbana. Chamando atenção no desenvolvimento de habitações verticalizadas, como, por exemplo: a diminuição de exposição à luz solar; a maior dificuldade na circulação do ar. Na figura 11, 11.1, 11.2 a simulação de 36 anos futuros com a preservação reflete em crescimento 1,12% Average Growth%. O parâmetro na Lambda Ext ,value 2.

Figura 11 crescimento, 11.1 crescimento concentrado, 11.2 imagem da tabela_ Tables  Fonte: autora

Figura 11.3 Gif imagem Com preservação das águas  Fonte: autora

  1. Outputs, visibilidade e resumo da divulgação dos resultados

A simulação do modelo sem e com a devida preservação das nascentes, olho d’água e curso da mesma, obteve grau de crescimento em números de células, demostrando através da simulação que a preservação e o crescimento urbano  estão num processo espacial demográfico onde a preservação não atrapalha o crescimento e desenvolvimento urbano. Não resulta em prejuízo na urbanização e seu crescimento, a preservação das nascentes, olho d’água e curso das águas, representa o respeito com o meio ambiente no qual usufruímos dos recursos. A análise demonstra que a preservação garante uma qualidade de vida aos recursos do meio ambiente. A Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, denominado Código Florestal, estabelece que as nascentes, num raio de 50 metros, são áreas de preservação permanente. Dessa forma, as nascentes do País já se encontram legalmente protegidas. A conservação do solo na proteção de uma nascente e de suas margens evita a erosão hídrica. Existem várias técnicas para controlar a erosão hídrica, impedindo que enxurradas soterrem a nascente ou a exagerada compactação do solo impeça a infiltração da água.  O plantio de árvores e vegetação resulta na recuperação do solo, qualidade de vida ao desenvolvimento de habitações, a exposição à luz solar; a circulação do ar. Na figura 12 a simulação de 36 anos futuros com a preservação reflete em crescimento 1,95% Average Growth%.

O atual Código Florestal sugere acompanhar basicamente esse entendimento, mas promove uma distinção pouco clara entre nascente e olho d’água: Art. 3º Para os efeitos desta Lei, entende-se por: XVII – nascente: afloramento natural do lençol freático que apresenta perenidade e dá início a um curso d’água; XVIII – olho d’água: afloramento natural do lençol freático, mesmo que intermitente. A seguir o Código determina: Art. 4º Considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei: IV – as áreas no entorno das nascentes e dos olhos d’água perenes, qualquer que seja sua situação topográfica, no raio mínimo de 50 (cinquenta) metros;¹

_1. LEI Nº 12.651, DE 25 DE MAIO DE 2012. Seção II,Do Regime de Proteção das Áreas de Preservação Permanente, Art. 7º e Código Florestal¬

Figura 12 Gif imagem Com preservação das águas  Fonte: autora

Foi deixado os inputs das estradas em vermelho forte, representado em roxo a malha urbana existente em 2021, em vermelho claro crescendo ao redor a simulação futura de 36 anos. Diante das necessidades urbanas, pode ser a adoção de APPs e a ela associada, todos esses aspectos considerados, como diretriz as seguintes orientações a serem adotadas e explicitadas claramente pelo Código Florestal:

– surgências do lençol freático originadas de ações antrópicas não devem ser consideradas nascentes a serem protegidas. A melhor indicação no caso estaria na estratégia de proteção dos aqüíferos subterrâneos com o tamponamento das referidas surgências; em Santiago refere-se ao aqüífero Guarani

– nascentes intermitentes deverão ser objeto de delimitação de APP correspondente quando situadas em regiões de clima semi-árido e com período de intermitência inferior a 2 (dois) anos;

– nascentes intermitentes situadas em espaço urbano deverão ser objeto de delimitação de APP correspondente caso apresentem período de intermitência inferior a 1 (um) ano;

– nascentes efêmeras não deverão ser objeto de delimitação de APP correspondente.

Considerações

O estudo na simulação do modelo no CityCell é baseada em autômatos celulares, que simula o desenvolvimento urbano no espaço e no tempo, para contribuir no planejamento e argumentação de projetos viáveis ao progresso urbanístico de modo qualitativo e quantitativo. No caso, desse estudo, os planos de bacia urbano, Planos Diretor, Lei Orgânica do município, deve ser elaborados em concordância com o plano estadual e estabelecer diretrizes para a implementação dos demais instrumentos de gestão, como outorga do direito de uso dos recursos hídricos, enquadramento dos corpos de água e cobrança. A ONU e a Agenda 2030, já alertam da preocupação de preservar a água, para saúde humana (física e mental). A contribuição, responsabilidade e a veracidade desse trabalho visa servir de base para mais estudos, não esgotando as inúmeras possibilidades que o modelo no CityCell pode simular.

Referências:

_¹ LEI Nº 12.651, DE 25 DE MAIO DE 2012. Seção II,Do Regime de Proteção das Áreas de Preservação Permanente, Art. 7º e Código Florestal­

ECHENIQUE, Marcial. Modelos matemáticos de la estructura espacial urbana, aplicaciones en América Latina. Buenos Aires: Ediciones SIAP/ Ediciones Nueva Visión, 1975.

INSTITUTO BRASILERO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). IBGE, 2021. Cidades. Disponível em:< https://cidades.ibge.gov.br/brasil/rs/santiago/panorama/. Acesso em:27-abril-2022

LIU, Yan. Modelling Urban Development with Geographical Information Systems and Cellular Automata. Estados Unidos: Taylor & Francis Group, 2009.

SARAIVA, Marcus Vinicius Pereira; POLIDORI, Maurício Couto. CityCell: Urban Growth Simulator (software). LabUrb – Laboratório de Urbanismo da FAUrb. Pelotas: UFPel, 2015. Acesso em: 09-maio-2022

RIBEIRO, F. A física das cidades. Revista de Morfologia Urbana. Porto, Portugal. v. 1 n. 00159,2020.  http://revistademorfologiaurbana.org/index.php/rm. Acesso em: 16-set-2020

Open StreetMap, 2020. Disponível em: https://www.openstreetmap.org/. Acesso em: 30-Jul-2020

Google Maps, Google 2020. Disponível em: https://www.google.com/maps/. Acesso em: 05-Set-2020

SENAR, Proteção Nacional de Nascentes em :https://www.cnabrasil.org.br/projetos-e-programas/programa-especial-prote%C3%A7%C3%A3o-de-nascentes . Acesso em: 09-maio-2022

Geól. Álvaro Rodrigues dos Santos, Publicação Ambiente Legal, 22/03/2021; 2016, Edição: Ana A. Alencar.

Simulação de impacto na malha urbana de Santiago/RS com a implantação de uma rodovia interligando a BR-377 e RSC-287

Por Gabriel Delpino da Silveira

Este trabalho tem como proposta a modelagem urbana através de simulações de crescimento na cidade de Santiago/RS por um sistema de autômatos celulares. Utilizando o programa CityCell é possível informar dados que possibilitem, previamente, a calibração do modelo e, em seguida, a experimentação de alternativas que alterem o crescimento da cidade, como influência de estradas, matas nativas, nascentes e outros elementos.

Modelagem Urbana

De acordo com Almeida (2003) “modelos são representações simplificadas da realidade”. A construção de modelos urbanos permite a simulação de estudos que propiciem e definam o planejamento de uma cidade. 

Existem quatro maneiras de classificar um modelo: descritivo, que busca compreender o funcionamento de um sistema real; exploratório, que possibilita a exploração de novos cenários a partir da descrição da realidade; preditivos, que incluem o tempo na simulação, explorando passado e futuro dinamicamente; e modelos operacionais, que servem preferencialmente aos planejadores urbanos, auxiliando nas escolhas dos agentes públicos de planejamento (ECHENIQUE, 1968). Este estudo aborda um modelo urbano descritivo, preditivo e exploratório.

Autômatos Celulares e CityCell

Segundo White et al (1997) autômatos celulares são sistemas espaciais e dinâmicos onde o estado de cada célula depende do estado das células vizinhas e seus conjuntos de regras de transição entre elas. O grid celular é esse espaço onde o autômato existe, por meio de um conjunto de células.

O programa CityCell – Urban Growth Simulator foi desenvolvido por Saraiva e Polidori (2014) e utiliza a base de grid celulares para o seu funcionamento. Ele fornece ferramentas básicas de geoprocessamento e dados necessários para a manipulação dos dados, visualização, análise e avaliação dos resultados gerados. Os atributos inseridos são divididos em três itens: atributos naturais, fatores do ambiente natural como sistemas de águas, cobertura do solo e fatores geomorfológicos; atributos urbanos, onde mostram o mapeamento do solo urbanizado; atributos institucionais, que possibilitam representar praticas de planejamento urbano, como leis e incentivos (POLIDORI, 2004).

A cidade de Santiago/RS

Localizada no estado do Rio Grande do Sul – Brasil, a cidade de Santiago se encontra na latitude de 29º Sul e longitude 54º Oeste, a 354 metros de altitude. Divide limites com os municípios de Unistalda, Nova Esperança do Sul e Capão do Cipó. É considerada uma cidade de baixo porte por conter 49.298 habitantes (atualizado em 2021) e uma média de 20,33 habitantes por quilometro quadrado (IBGE, 2022). Seus principais acessos se dão pelas rodovias BR-377 e RSC-287, onde a cidade se encontra próximo a intersecção de ambas.

Simulações do modelo através do CityCell

A primeira etapa para a realização deste trabalho ocorreu ao reunir todas as informações relevantes ao crescimento de Santiago e informá-las através de “inputs” no programa CityCell. Ao longo dos testes foi possível reconhecer aspectos que impactaram na transformação da malha urbana da cidade desde 1985 (ano escolhido para o início do estudo e para a etapa de calibração do modelo). 

Para reunir as imagens georreferenciadas foram utilizados dois programas-base: Global Mapper (GM) e Google Earth (GE). Com o GM foram baixadas imagens de satélites já georreferenciadas da cidade de Santiago/RS com qualidade de 10 metros, as linhas de drenagem, curvas de nível e bacias hidrográficas. Com o GE foram baixadas imagens de satélites que demonstravam a malha urbana em períodos diferentes, especificamente 1985 e 2021 (que futuramente foram utilizadas para a etapa calibração). As imagens do Google Earth precisaram ser georreferenciadas através de outro programa, neste caso foi utilizado o AutoCad com o plugin Raster Design para realizar o procedimento.

Tendo estas imagens, o próximo passo foi adicioná-las ao programa CityCell e informar ao sistema de células o que se via nas fotos. Com isso, os inputs realizados numa malha de 200x200m foram os seguintes:

Fig. 1 – Fundo com cores de 1 a 5 para o funcionamento do programa. Fig. 2 – Linhas de drenagem de água. Fig. 3 – Párea urbana da cidade em 2021. Fig. 4 – Párea urbana da cidade em 1985.

Fig. 5 – Malha viária em 1985 (rodovias e estradas de acesso a cidade). Fig. 6 – Malha viária em 2021 (rodovias e estradas de acesso a cidade). Fig. 7 – Resistência da topografia em dois níveis (1 e 2). Fig. 8 – Áreas militares

Fig. 9 – Intersecções nas rodovias de acesso a cidade. Fig. 10 – Corredor das tropas, via histórica de Santiago. Fig. 11 – Matas nativas. Fig. 12 – Rodovia nova (simulação de futuro)

Com a inserção destes inputs foi possível a realização da simulação de crescimento de Santiago. Começando pela etapa de calibração do modelo, alguns destes dados foram relevantes para a efetivação da calibração e, consequentemente, a utilização do sistema para futuras simulações.

Como regra de interação foi aplicada a “Threshold Potential”, ou potencial de crescimento limiar, e considerou os seguintes atributos e pesos: Fundo com peso 1, ambiental e resistência; linhas de drenagem com peso 1, ambiental e resistência; párea urbana de 1985 com peso 1, urbano e atração; malha viária de 1985 com peso 0.2, urbano e atração; resistência da topografia com peso 1, ambiental e resistência; áreas militares com peso 1, urbano, atração e congelamento de células ativo; intersecções nas rodovias com peso 0.8, urbano e atração; corredor das tropas com peso 0.8, urbano e atração; matas nativas com peso 1, ambiental e resistência. Foram realizadas 36 iterações (anos entre 1985 e 2021) para buscar o melhor resultado próximo a párea urbana de 2021.

Na figura a seguir consta o resultado na última iteração em comparação com a párea urbana de 2021. É possível observar que a calibração acertou nas áreas centrais porém ocorreram alguns erros nos extremos da párea urbana. O falta de acerto mais considerável está localizada na área nordeste do modelo, onde não foi possível replicar o crescimento urbano totalmente.

Fig. 13 – Em marrom claro párea urbana existente. Em marrom escuro párea urbana gerada pelo sistema

Quando comparado utilizando a opção “Fuzzy Comparision” que determina as porcentagens de acerto em 3 níveis diferentes, os resultados são os seguintes: Coincidência total com 50% de acertos e coincidência com 200m (1 célula) de erro com 70% de acertos. Para princípios de calibração, a segunda opção (com 70% de acerto) foi considerada.

Fig. 14 – Coincidência Total Fig. 15 – Coincidência com 200m de acerto

Fig. 16 – GIF coincidência com 200m de acerto

Com o modelo devidamente calibrado, foi possível prever o crescimento urbano de Santiago até 2057, através da regra “Threshold Potential” e utilizando os seguintes atributos e pesos: Fundo com peso 1, ambiental e resistência; linhas de drenagem com peso 1, ambiental e resistência; párea urbana de 2021 com peso 1, urbano e atração; malha viária de 2021 com peso 0.2, urbano e atração; resistência da topografia com peso 1, ambiental e resistência; áreas militares com peso 1, urbano, atração e congelamento de células ativo; intersecções nas rodovias com peso 0.8, urbano e atração; corredor das tropas com peso 0.8, urbano e atração; matas nativas com peso 1, ambiental e resistência. Foram realizadas 36 iterações (anos entre 2021 e 2057).

Fig. 17 – GIF de crescimento urbano entre 2021 e 2057. Em vermelho – rodovias existentes. Em marrom claro – párea urbana existente. Em marrom escuro – futura expansão da párea urbana.

Iniciando a etapa de simulação de transformações na párea urbana com a adição de outros atributos, foi pensado na possibilidade de união de duas rodovias importantes (BR-377 e RSC-287) através de uma nova rodovia na parte sul de Santiago. O processo foi o mesmo utilizado anteriormente, apenas com a adição do atributo “estrada nova” com peso 1, urbano e atração. A imagem a seguir demonstra o impacto que se obteve:

Fig. 18 – GIF crescimento urbano com nova rodovia com peso 1

Logo após foi simulado a possibilidade deste rodovia com peso ainda maior (4) para entender se o impacto seria mais significativo. A principio de entendimento, o peso 4 significa uma  estrada com excelente infraestrutura, o que atrairia o crescimento populacional para aquela área, como incentivos financeiros, grande oferta de loteamentos, dentre outros.

Fig. 19 – GIF crescimento urbano com nova rodovia com peso 4

Fig. 20 – Nova rodovia peso 1. Fig. 21 – Nova rodovia peso 4

Considerações finais

O presente trabalho teve como objetivo testar, simular e experimentar diferentes possibilidades de crescimento para a cidade de Santiago/RS através de modelagem computacional por autômatos celulares. A calibragem do modelo demonstrou diversos aspectos importantes que impactaram na malha urbana atual da cidade, atributos como as rodovias, áreas militares e intersecções das rodovias foram de suma importância para o crescimento da cidade entre 1985 e 2021 e, possivelmente, seguirão sendo elementos estruturadores da malha futuramente.

A expansão da malha ocorreu na borda da rodovia RSC-287 e há grande probabilidade da cidade seguir expandindo suas bordas até ocupar as margens das rodovias. Na área nordeste onde a etapa de calibragem não foi atingida, não foi possível buscar algum atributo que simulasse a expansão naquela direção.

Com a construção de uma rodovia que interliga a BR-377 e RSC-287 no setor sul da cidade, foi possível determinar algumas hipóteses: uma simples rodovia que não conecta na cidade, mas sim está ao redor dela, pode não ser capaz de transformar significativamente a malha urbana, apenas se essa rodovia contar com grande infraestrutura capaz de atrair a população, como a construção de  importantes equipamentos urbanos, iniciativas e incentivos municipais, oferta de lotes, dentre outros. 

Referências

ALMEIDA, C. M. D. Modelagem da dinâmica espacial como uma ferramenta auxiliar ao planejamento: simulação de mudanças de uso da terra em áreas urbanas para as cidades de Bauru e Piracicaba (SP), Brasil. Tese de Doutorado INPE. São José dos Campos, p. 351. 2003.

ECHENIQUE, M. Models: a discussion. Land Use and Built Form Studies, Cambridge, 1968.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). IBGE, 2022. Cidades. Disponível em:< https://www.ibge.gov.br/cidades-e-estados/rs/santiago.html >. Acesso em: 14 de maio de 2022

POLIDORI, M. C. Crescimento urbano e ambiente: um estudo exploratório sobre as transformações e o futuro da cidade. Tese de Doutorado UFRGS PPGECO. [S.l.]. 2004.

SARAIVA, Marcus Vinicius Pereira; POLIDORI, Maurício Couto. CityCell: Urban Growth Simulator (software). LabUrb – Laboratório de Urbanismo da FAUrb. Pelotas: UFPel, 2015.

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WHITE, R.; ENGELEN, G.; ULJEE, I. The use of constrained cellular automata for
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B: Planning and Design, 24, n. 3, 1997. 323-343.