Em homenagem aos trabalhadores da terra do Brasil, que enfim despertaram e cuja luta ora inicia.
Senhores Barões da terra
Preparai vossa mortalha
Porque desfrutais da terra
E a terra é de quem trabalha
Bem como os frutos que encerra
Senhores Barões da terra
Preparai vossa mortalha.
Chegado é o tempo de guerra
Não há santo que vos valha:
Não a foice contra a espada
Não o fogo contra a pedra
Não o fuzil contra a enxada:
— União contra granada!
— Reforma contra metralha!
Senhores donos da Terra
Juntais vossa rica tralha
Vosso cristal, vossa prata
Luzindo em vossa toalha.
Juntais vossos ricos trapos
Senhores Donos de terra
Que os nossos pobres farrapos
Nossa juta e nossa palha
Vêm vindo pelo caminho
Para manchar vosso linho
Com o barro da nossa guerra:
E a nossa guerra não falha!
Nossa guerra forja e funde
O operário e o camponês;
Foi ele quem fez o forno
Onde assa o pão que comeis
Com seu martelo e seu torno
Sua lima e sua torquês,
Foi ele quem fez o forno
Onde assa o pão que comeis.
Nosso pão de cada dia
Feito em vossa padaria
Com o trigo que não colheis;
Nosso pão que forja e funde
O camponês e o operário
No forno onde coze o trigo
Para o pão que nos vendeis
Nas vendas do latifúndio
Senhor latifundiário!
Senhor Grileiro de terra
É chegada a vossa vez
A voz que ouvis e que berra
É o brado do camponês
Clamando do seu calvário
Contra a vossa mesquinhez.
O café vos deu o ouro
Com que encheis vosso tesouro
A cana vos deu a prata
Que reluz em vosso armário
O cacau vos deu o cobre
Que atirais no chão do pobre
O algodão vos deu o chumbo
Com que matais o operário:
É chegada a vossa vez
Senhor latifundiário!
Em toda parte, nos campos
Junta-se a nossa outra voz
Escutai, Senhor dos campos
Nós já não somos mais sós.
Queremos bonança e paz
Para cuidar da lavoura
Ceifar o capim que dá
Colher o milho que doura,
Queremos que a terra possa
Ser tão nossa quanto vossa
Porque a terra não tem dono
Senhores Donos da Terra.
Queremos plantar no outono
Para ter na primavera
Amor em vez de abandono
Fartura em vez de miséria.
Queremos paz, não a guerra
Senhores Donos de Terra …
Mas se ouvidos não prestais
Às grandes vozes gerais
Que ecoam de serra em serra
Então vos daremos guerra
Não há santo que vos valha:
Não a foice contra a espada
Não o fogo contra a pedra
Não o fuzil contra a enxada:
— Granada contra granada!
— Metralha contra metralha!
E a nossa guerra é sagrada
A nossa guerra não falha!
Vinicius de Moraes. Poemas para a Liberdade. Violão de rua. Civilização Brasileira: Rio de Janeiro, 1962.