Conversa de senhoras [Ana Cristina Cesar]

Não preciso nem casar
Tiro dele tudo que preciso
Não saio mais daqui
Duvido muito
Esse assunto de mulher já terminou
O gato comeu e regalou-se
Ele dança que nem um realejo
Escritor não existe mais
Mas também não precisa virar deus
Tem alguém na casa
Você acha que ele aguenta?
Sr. ternura está batendo
Eu não estava nem aí
Conchavando: eu faço a tréplica
Armadilha: louca pra saber
Ela é esquisita
Também você mente demais
Ele está me patrulhando
Para quem você vendeu seu tempo?
Não sei dizer: fiquei com o gauche
Não tem a menor lógica
Mas e o trampo?
Ele está bonzinho
Acho que é mentira
Não começa

(A teus pés, 1982)

[O tempo fecha] [Ana Cristina Cesar]

O tempo fecha.
Sou fiel aos acontecimentos biográficos.
Mais do que fiel, oh, tão presa! Esses mosquitos que não
largam! Minhas saudades ensurdecidas por cigarras! O que faço
aqui no campo declamando aos metros versos longos e sentidos?
Ah que estou sentida e portuguesa, e agora não sou mais, veja,
não sou mais severa e ríspida: agora sou profissional.

(A teus pés, 1982)

Psicografia [Ana Cristina Cesar]

Também eu saio à revelia
e procuro uma síntese nas demoras
cato obsessões com fria têmpera e digo
do coração: não soube e digo
da palavra: não digo (não posso ainda acreditar
na vida) e demito o verso como quem acena
e vivo como quem despede a raiva de ter visto

(Inéditos e dispersos, 1985)