Amavisse (XII) [Hilda Hilst]

Se tivesse madeira e ilusões
Faria um barco e pensaria o arco-íris.
Se te pensasse, amigo, a Terra toda
Seria de saliva e de chegança.
Te moldaria numa carne de antes
Sem nome ou Paraíso.

Se me pensasses, Vida, que matéria
Que cores para minha possível sobrevida?

Amavisse (1989)

Amavisse (XIX) [Hilda Hilst]

Empoçada de instantes, cresce a noite
Descosendo as falas. Um poema entre-muros
Quer nascer, de carne jubilosa
E longo corpo escuro. Pergunto-me
Se a perfeição não seria o não dizer
E deixar aquietadas as palavras
Nos noturnos desvãos. Um poema pulsante

Ainda que imperfeito quer nascer.

Estendo sobre a mesa o grande corpo
Envolto na sua bruma. Expiro amor e ar
Sobre as suas ventas. Nasce intensa
E luzente a minha cria
No azulecer da tinta e à luz do dia.

Amavisse (1989)