Por Maria Rita Rolim/Superávit Caseiro

O empreendedorismo tem se destacado cada vez mais como uma opção de renda, sendo a necessidade um dos principais motivos que levam muitas pessoas a optar por empreender. Dentro da diversidade de tipos de empreendedorismo existentes, o afroempreendedorismo está ganhando espaço de destaque no cenário atual do Brasil. De acordo com dados publicados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2022, 56% da população brasileira se autodeclarou como negra, compreendendo tanto aqueles que se identificam como pretos quanto pardos (IBGE, 2022).

Além disso, o afroempreendedorismo refere-se a empreendimentos criados e administrados por pessoas negras, abrangendo uma variedade de nichos de mercado. Essa forma de empreendedorismo estimula, sobretudo, o “black money” (dinheiro negro), um conceito que busca promover a circulação de renda e reduzir as desigualdades.

Luciana Custódio, aos 51 anos, é professora e acadêmica no curso de Pedagogia na UFPEL. Além disso, fundadora da FeMENI Feira de Mulheres Empreendedoras Negras e Indígenas, proprietária da Original Empadaria, e apoiadora do Movimento Black Money. Luciana também é atuante na defesa dos direitos das mulheres, contribuindo nacionalmente para o PLPs Mulher Negra. Em sua narrativa sobre a experiência como empreendedora, ela relata:

“Na minha concepção de empreender, uma mulher negra já nasce empreendendo, sobrevivendo. Sou uma mulher que sempre arriscou; trabalho desde os meus 15 anos e, paralelamente, sempre busquei atividades que me proporcionassem autonomia financeira. Já produzi bijuterias feitas de miçangas, trabalhei como manicure, cabeleireira, salgadeira (e retornei a esse ramo), e também fui vendedora. No entanto, o marco que me fez compreender toda essa trajetória, e que me mantém nos três anos de existência da Original Empadaria, foi o período da pandemia”, comenta.

Ela acrescenta que durante a pandemia, além de ficar desempregada, enfrentou um problema de saúde que a impediu de ter contato com outras pessoas. “Esse momento desafiador me levou a me reinventar, a redescobrir nas receitas da minha mãe um caminho para me encontrar como pessoa, mulher e empreendedora. As minhas receitas representam mais do que simplesmente cozinhar; são uma busca pelas raízes que moldaram a minha identidade, um reencontro com as minhas memórias afetivas”, acrescenta.

Imagem: Adobe Communications Team

 A autoestima desempenha um papel crucial em sua jornada empresarial, em um contexto social onde persistem desafios relacionados à representatividade e igualdade de oportunidades. Muitas pessoas negras se deparam com estereótipos e preconceitos ao tentar iniciar um novo negócio ou até para manter o que já tem, o que ressalta a importância de uma autoestima e inteligência emocional bem estruturadas para resistir a essas pressões externas.

Nessa perspectiva, incentivar a autoestima não se limita apenas a uma questão pessoal; trata-se, também, de uma estratégia fundamental para fomentar um ambiente empreendedor mais inclusivo e diversificado. Conforme ressalta Thaiane Madruga, Terapeuta Integrativa e graduanda em gestão empreendedora, que também atua como autônoma, um dos desafios significativos enfrentados por pessoas negras no empreendedorismo é lidar com crenças limitantes relacionadas à ancestralidade e ao sistema familiar. Isso engloba a sensação de não pertencimento a determinados espaços, destacando a importância de abordar e superar esses obstáculos para promover a igualdade de oportunidades no mundo empreendedor.

“O caminho é muito mais difícil porque as nossas famílias não têm acesso à grana e, na maioria das vezes, não têm acesso ao estudo. E quando a gente tem esse acesso, ainda para nós, é algo muito novo. A gente se sente culpado, parece que não é permitido, parece que não pertencemos, parece que estamos deixando a nossa família de origem. Então, com certeza, as crenças em nível histórico são um dos maiores desafios que a gente pode enfrentar porque. Além disso, vem o julgamento, vem a parte social, histórica.  O Brasil é um país muito racista. Então, enfrentamos muito isso todos os dias, e não adianta apenas ganhar dinheiro, às vezes isso nos ilude, o dinheiro nos dá apenas um acesso melhor, mas os olhares continuam e nós notamos isso”, afirma Thaiane.

A população negra enfrenta uma exclusão mais acentuada no mercado de trabalho brasileiro. Ao analisar os dados do IBGE referentes ao primeiro trimestre deste ano, observa-se que entre os que se autodeclararam pretos, a taxa era de 11,3%, enquanto entre os pardos era de 10,1%, e entre os brancos, de 6,8%.

É aos poucos que o cenário vai mudando e, para isso, as políticas públicas destinadas ao afroempreendedorismo desempenham um papel fundamental na busca por equidade e inclusão no cenário empreendedor. Iniciativas como o Projeto de Lei 2.538/2020 promovem e fortalecem empreendimentos liderados por pessoas negras. Em 2023, o governo de Lula estabeleceu o Ministério da Igualdade Racial do Brasil, encarregado de planejar, coordenar e executar políticas públicas em âmbito nacional que promovam a igualdade racial e combatam o racismo. Essas ações refletem o compromisso em construir uma sociedade mais economicamente inclusiva.