Por Eduardo Ritter/Superávit Caseiro

O mercado financeiro nada mais é do que o lugar onde ocorre a compra e venda de ativos financeiros. Para que o leitor possa entender melhor como o mercado de capitais funciona e deixar de ver a Bolsa de Valores e outros lugares possíveis de investimento como um bicho de sete cabeças, o Superávit Caseiro conversou com o coordenador do curso de Economia da Universidade Federal de Pelotas, Marcelo de Oliveira Passos, sobre mercado de capitais. Além de docente da UFPEL, Oliveira Passos é graduado em Ciências Econômicas pela FAE Business School, tem mestrado e doutorado em Desenvolvimento Econômico pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Além disso, ele também foi pesquisador visitante (estágio pós-doutoral) no Research Unit on Complexity and Economics (ISEG – Universidade de Lisboa. Ao longo de sua trajetória, Marcelo de Oliveira Passos tem experiência na área de Economia, com ênfase em Economia Monetária e Financeira e Economia computacional, atuando principalmente nos temas: finanças computacionais, economia computacional (análise de redes complexas), teoria monetária e teoria do investimento.

SUPERÁVIT – O mercado de capitais surgiu na sociedade justamente devido às demandas financeiras dos sujeitos e dos grupos. Como explicar para a população em geral o conceito de mercados de capitais?
MARCELO DE OLIVEIRA PASSOS –
A melhor forma de explicar à população é mostrar que, no longo prazo, os investimentos em ações podem render bem mais do que a caderneta de poupança. E, na realidade, bolsa de valores é uma forma muito eficaz de fazer poupança de longo prazo (dizer que os fundos de previdência investem em ações, por exemplo). E que a melhor forma de ingressar no mercado é investir em fundos de índices (que copiam o desempenho de um índice como o Ibovespa ou de um setor específico, como o mercado de energia). Desta forma, deixaríamos claro para todos que não é preciso ser expert para ganhar dinheiro com ações, basta escolher um bom fundo de investimento e contratar um especialista para fazer a escolha.

SUPERÁTIV – Pode se dizer que na sociedade contemporânea é impossível não existir o mercado de capitais. Por que ainda há muitas vezes um tom pejorativo quando se fala em “mercado”, especialmente como se fosse necessariamente um antagonismo às políticas sociais? Não é possível haver uma convivência harmônica entre o “mercado” e as políticas públicas para reduzir as diferenças sociais?
MARCELO DE OLIVEIRA PASSOS –
Este é um problema que remete à má reputação dos especuladores em razão de eventuais turbulências que trouxeram às empresas e às pessoas físicas. Muitos ainda vêem o investimento em ações como um cassino, ou um antro de espertalhões loucos por dinheiro. Na verdade, no longo prazo, quem ganha mais são justamente os investidores que aliam prudência, paciência e sabedoria nos investimentos. E uma pessoa pode ter essas qualidades mesmo não sendo um expert em finanças, embora o conhecimento e a educação financeira sempre ajudem muito neste processo. A educação financeira, que foi contemplada na reforma do ensino médio, ainda não foi implementada nas escolas. Ela seria um caminho interessantíssimo para reverter noções errôneas sobre o mercado acionário.
SUPERÁVIT – Quais orientações você daria para quem não é especialista em Economia e áreas afins e pretende ingressar em investimentos no mercado de capitais?
MARCELO DE OLIVEIRA PASSOS –
Buscar o auxílio de um consultor financeiro, evitar dicas de amigos ou de gerentes de bancos e escolher um bom fundo de investimentos. Se possível, investir em bons cursos de educação financeira (fugindo de cursos de traders e que vendem sonhos irrealizáveis).
SUPERÁVIT – mudança no comando do governo federal está completando 3 meses. Como o mercado de capitais brasileiros está reagindo a essa troca de comando? Quais são as principais diferenças entre as políticas que afetam o mercado de capitais do antigo e do novo governo?
MARCELO DE OLIVEIRA PASSOS –
A relação com o mercado de capitais começou difícil, mas o mercado já precificou o arcabouço fiscal e a política de juros elevados para combater a inflação. O pior cenário é o arcabouço fiscal não ser votado na próxima quarta, a inflação subir e os EUA não resolverem a situação da sua dívida. Porém, a relação do mercado com o ministro da fazenda melhorou bastante nas últimas semanas, o que pode ser visto pela queda dos juros futuros, pela apreciação cambial e pela melhora nas cotações das ações do Ibovespa.

SUPERÁVIT – Tivemos recentemente a quebra do banco americano SVB. Como essa falência afetou o mercado brasileiro?
MARCELO DE OLIVEIRA PASSOS – Afetou muito pouco. O que afetou mais foram as declarações do presidente e de alguns ministros nos primeiros meses do ano. E o que pode afetar mais é justamente a questão da dívida norte-americana e das negociações envolvendo o arcabouço fiscal.
SUPERÁVIT – Na sua opinião, quais são os grandes investidores do mercado de capitais tanto em nível nacional e internacional? Qual é o diferencial que esses grandes investidores apresentaram para chegar ao sucesso?
MARCELO DE OLIVEIRA PASSOS –
Há na história das finanças vários grandes investidores como Phillip Fisher, Benjamin Graham, Warren Buffett, Ray Dalio, Charles Munger, George Soros, Luiz Barsi, Lírio Parisotto, Jorge Paulo Lemann, Luiz Cesar Fernandes, André Esteves entre outros. O que todos têm em comum é a sabedoria de saber esperar quando o mercado está desfavorável e ousar quando ninguém mais confia no mercado. Além disto, todos possuem grande capacidade de análise e conhecimento de contabilidade, além de uma percepção especial para conhecer a utilidade de saber aproveitar os momentos de pânico e de euforia dos mercados.
SUPERÁVIT – No Brasil, houveram mudanças na bolsa de valores até a formação da B3. Há alguma indicação de novas mudanças? Quais as tendências do mercado de capitais para os próximos anos no Brasil?
MARCELO DE OLIVEIRA PASSOS –
Os setores de energia (sobretudo transmissão), bancos, saneamento, saúde (hospitais e planos de saúde), gás e mineração devem trazer bons retornos ao longo dos próximos anos. Para quem prefere investir em ações boas pagadoras de dividendos, ações como WEG, Itaúsa, Transmissão Paulista, Taesa, Ambev e Itaú são boas opções.
SUPERÁVIT – Para encerrar, há algum outro ponto você gostaria de destacar ao leitor?
MARCELO DE OLIVEIRA PASSOS – Um ponto importante é também considerar que, em função dos juros altos, há ótimas oportunidades de investimentos em títulos públicos prefixados e de maturidade mais longa. Mas é para comprar e guardar, isto é, comprar esses títulos e não vendê-los no curto e médio prazo, mas vendê-lo somente no vencimento. O risco desses títulos é baixíssimo e o retorno é dos mais altos do mundo.