Manifestação da FAE/UFPel: retorno das atividades presenciais na E. B.

Desde sua criação, há 45 anos, a Faculdade de Educação tem demonstrado seu compromisso social com a educação básica e o direito à Educação, com os profissionais e trabalhadores da educação e suas associações de classe. Este compromisso pode ser traduzido por meio do seu engajamento com os processos de formação docente, tanto em nível de graduação como de pós-graduação, com atuação marcante em atividades de ensino, pesquisa e extensão.

Neste momento, um dos piores da Pandemia do COVID-19, a vacinação da população em geral é uma exigência de todos nós. A sociedade sofre a falta de políticas de saúde adequadas, com a perda de inúmeras vidas, ao mesmo tempo em que presenciamos um risco à saúde de professores/as, funcionários/as, crianças e famílias da comunidade escolar, com o pretendido retorno às atividades presenciais nas escolas.

Afirmamos estar juntos com essas comunidades, no sentido de defender que a vacinação em larga escala, as condições de higienização e a disponibilização de materiais necessários para a prevenção de contágio são imprescindíveis para um retorno às atividades presenciais.

As práticas de negação da ciência, da vacina, do distanciamento social, do uso de máscaras e de medidas adequadas de apoio social e econômico para as comunidades mais vulneráveis, só fazem aumentar as dificuldades que enfrentamos e distancia, cada vez mais, o retorno saudável e produtivo da população a suas atividades. Afirmamos a vida e não o obscurantismo. A experiência de outros países mostra que onde o retorno às atividades presenciais ocorreu de modo precipitado, houve um aumento no número de contágios e a necessidade de novas medidas de controle.

Nesse sentido, entendemos que toda e qualquer política de retorno a atividades presenciais deva ser antecedida de ampla discussão com as categorias e suas entidades representativas, com as famílias e com as universidades, para que possa ser construído um planejamento, envolvendo os órgãos gestores e as comunidades escolares, que inclua:

  • um retorno presencial planejado, com vacinação e com todas as condições de estudo e trabalho garantidas;
  • a discussão de políticas sociais para os trabalhadores/as da educação, a fim de atenuar os efeitos da pandemia;
  • a elaboração de projetos de formação docente, tanto para o período pandêmico quanto para o período pós-pandêmico;
  • a elaboração de programas que visem a melhoria do ensino e do reforço da aprendizagem das crianças e de seus vínculos sociais e educativos.

Por fim, a Faculdade de Educação da UFPel, na reafirmação de defesa da vida e do direito à educação de qualidade, coloca-se à disposição dos órgãos responsáveis pela educação no município e na região para colaborar com o planejamento e a elaboração dessas ações sociais e educativas.

Posição da FAE: calendário alternativo na UFPel

Pelotas, 13 de maio de 2020.

Docentes, discentes e técnicos administrativos da Faculdade de Educação, a partir da análise da proposta de calendário alternativo, em reuniões gerais interdepartamentais, realizadas em 05, 11 e 13 de maio, manifestam as seguintes posições.

Estamos vivendo um período de anormalidade; por um lado uma pandemia que avança em todos os cantos do país e, por outro, vivemos e somos diariamente atingidos por instabilidades inclusive no campo institucional, com  manifestações pelo fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal, aos moldes da ditadura implementada em 1964.

Nesse contexto, o papel do Estado é fundamental na garantia de uma educação pública, democrática e de qualidade. Há um crescente agravamento da disputa sobre a universidade pública, advindo das ações do governo, do mercado e do ensino privado, que ameaça a sua existência. É imprescindível manter a garantia da qualidade do ensino e do projeto de universidade pública, gratuita e inclusiva que se construiu no Brasil, ao lado dos interesses e das necessidades da maioria da população. É preciso amadurecer formas possíveis de trabalho durante o isolamento que não promovam a ruptura com um projeto de universidade e de educação pública, gratuita e de qualidade socialmente referenciada, que preserve as conquistas no campo da inclusão e permanência de estudantes e da carreira docente e de técnico administrativos em educação.

A função social da universidade só pode ser alcançada potencializando os três pilares do fazer universitário, através da indissociabilidade do ensino, da pesquisa e da extensão. A universidade não se faz com voluntarismo, com cada docente, cada unidade acadêmica ou cada colegiado decidindo o que fazer deforma isolada, sem uma referência coletiva. O voluntarismo no espaço público somado às táticas de controle e avaliação são estratégias de desmonte da carreira e da própria docência, com importantes prejuízos para a organização da universidade e para a formação dos/as estudantes.

A transposição de disciplinas, tanto obrigatórias como optativas, para a modalidade a distância significa uma ruptura com os projetos pedagógicos dos cursos e unidades acadêmicas. O aligeiramento por meio da migração dos projetos pedagógicos dos cursos para o modo remoto fragiliza a formação e desqualifica a própria educação a distância. A comunidade de estudantes da FaE é predominantemente constituída de mulheres, muitas mães que já têm uma sobrecarga de trabalho, com uma dupla jornada, e durante a quarentena ela se torna maior ainda, especialmente para as que têm filhos e filhas na educação básica, precarizando as condições de estudo, além de estudantes trabalhadoras e trabalhadores.

A solução para a retomada da normalidade na universidade deve ser estabelecida através de uma ampla discussão com todos os segmentos da comunidade (docentes, discentes, técnicos, professores da rede básica). O amplo e democrático debate é fundamental para evitar retrocessos nas conquistas históricas, como a expansão da universidade pública e as políticas de ações afirmativas implementadas na última década.

Diante destas ponderações, nossas proposições são:

 No intuito de construir a retomada das atividades acadêmicas na universidade,

esta deve ser estabelecida através de uma ampla discussão com todos os segmentos da comunidade. Nesse sentido, aprovamos o seguinte:

1 – somos contrários ao calendário alternativo proposto;

2 – O investimento e a ampliação das condições estruturais de acesso à internet e às tecnologias na Universidade;

3 – As atividades docentes devem ser concentradas em projetos de ensino, pesquisa e extensão, individuais ou coletivos, abarcando uma ou mais unidades acadêmicas;

4 – A utilização das tecnologias de informação e comunicação com finalidade política e pedagógica no sentido de ampliar e aprofundar o debate com os estudantes e comas escolas e os professores da educação básica sobre os desafios e problemáticas vivenciadas nos dias de hoje como, por exemplo: reflexão crítica/estudo sobre as condições objetivas de trabalho dos professores nas universidades e na educação básica e a precarização do trabalho docente; reflexão sobre o papel do Estado na garantia de uma educação pública, democrática e de qualidade; a defesa dos princípios da gestão democrática na educação, entre outras temáticas que emergem das pesquisas e desafios vivenciados na contemporaneidade;

5 – A organização de grupos de estudos(formação inicial e continuada de professores)para o planejamento, uso responsável e autônomo das tecnologias digitais na educação;

6 – É fundamental para a segurança jurídica relacionada à carreira docente, tanto noaspecto da avaliação, como da progressão e da promoção, que o Conselho Universitário faça a adequação de suas Resoluções ao que for aprovado pelo COCEPE no período de excepcionalidade imposto pela pandemia;

7 – Por fim, entendemos que, antes de tomar qualquer decisão sobre o primeiro semestre letivo de 2020, se analise, inclusive a partir de Parecer Jurídico emitido pela AGU, o significado e as consequências acadêmicas e trabalhistas do cancelamento ou da suspensão do semestre letivo.

Nota da FAE/UFPel: Educação Básica em tempos de pandemia.

A Faculdade de Educação da Universidade Federal de Pelotas, diante do seu compromisso histórico e político com a educação pública, gratuita, popular, democrática, laica e socialmente referenciada e considerando o momento de pandemia, se manifesta:

1 – contrária ao uso do chamado “ensino remoto” e outros similares na Educação Básica (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio) das redes públicas e privadas, bem como se posiciona em contrariedade ao retorno das aulas presenciais sem que existam condições sanitárias seguras e recomendadas pela Organização Mundial da Saúde e pela Comunidade Científica.

A partir do Princípio da Precaução, defendemos o adiamento do início das aulas por tempo indeterminado, uma vez que as pesquisas científicas estão acenando para o agravamento da pandemia nos meses de junho e de julho. No Rio Grande do Sul esta situação se agrava e se complexifica com o advento do inverno. Os números de infectados e de mortos por COVID-19 estão aumentando a cada dia. Só poderemos cogitar uma data de retorno às aulas quando as condições de segurança puderem ser garantidas para todos. Qualquer hipótese de data para um possível retorno, no presente cenário, causa uma insegurança na comunidade escolar e atenta contra a vida humana. Toda a discussão, neste sentido, deve ser efetivamente democrática e baseada em dados produzidos pela Organização Mundial da Saúde e pela Comunidade Científica. Quanto ao ensino remoto, no âmbito da Educação Básica, análises evidenciam que, quando usado indistintamente, fragiliza o processo educativo das crianças e jovens. O currículo das escolas está organizado para desenvolver-se de modo presencial e é inaceitável a sua simples transposição para um modo remoto, o que acarretaria precarização das práticas pedagógicas e das condições de aprendizagem, bem como aprofundaria as desigualdades de acesso e permanência na Educação Básica.
Diante do cenário apresentado, o ensino remoto: a) não garante a universalização do direito à educação; b) constitui-se uma “imposição” de normalidade pelo capital; c) está associado à lógica de mercantilização e privatização da educação pública; d) não assegura uma educação de qualidade para as classes populares.
Em se tratando especificamente da Educação Infantil, mas compreendendo que a similaridade com os demais níveis é evidente, torna-se inaplicável qualquer protocolo que oriente o distanciamento criança/criança e criança/adulto em um possível retorno às atividades presenciais. Deve-se considerar, especialmente: a) as características socioemocionais das crianças e suas necessidades de cuidado (higiene, alimentação, afeto, bem-estar); b) a estrutura física das escolas de educação infantil (públicas e privadas), uma vez que os espaços estão organizados para o convívio coletivo, a interação, a experiência corporal, sensorial, criativa; c) as características do trabalho das profissionais da educação, que exigem contato físico, mobilidade e agilidade corporal, habilidades que seriam inviabilizadas pelo uso dos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) para sua segurança.

2 – em defesa das trabalhadoras e dos trabalhadores em educação, de condições dignas e seguras para o exercício profissional e de uma formação continuada crítica e comprometida com um projeto educativo a favor das classes populares.

As análises sobre o ensino remoto, desenvolvido neste cenário de pandemia, indicam um quadro de aprofundamento da precarização das condições de trabalho para as educadoras e os educadores. Cabe destacar que investigações sobre o mundo do trabalho registram que, majoritariamente, a profissão docente na Educação Básica é desenvolvida por mulheres, o que gera uma sobrecarga das atividades produtivas desenvolvidas por essas mulheres-trabalhadoras em suas residências em tempos de pandemia. Trata-se de mais uma evidência para a não realização das atividades remotas na Educação Básica.
As condições objetivas para o desenvolvimento de um trabalho docente digno são imprescindíveis para a efetivação de uma educação de qualidade social. Portanto, torna-se necessária a manutenção dos postos de trabalho nas redes públicas e privadas, a garantia de pagamento dos salários (sem cortes e parcelamentos). A Faculdade de Educação se coloca à disposição para construir um amplo e substancial espaço de diálogo e de organização de propostas de formação continuada sustentada em elementos que permitam a compreensão da conjuntura social, histórica, cultural, política, educacional e que deem conta das novas exigências (subjetivas e profissionais). É relevante considerar ainda sobre a questão das formações continuadas que projetos apresentados de maneira célere e que estejam subsidiados a partir de uma lógica de mercado precarizam os processos de ensino e de aprendizagem, desqualificam a natureza da ação educativa, criam um ambiente favorável para o controle do trabalho docente e a privatização dos sistemas educacionais.

3 – pela produção de outras relações entre escolas e comunidades.

A escola é um espaço de encontro entre pessoas, culturas e saberes. É um lugar importante para as crianças e os jovens das classes populares, de acesso a diferentes visões de mundo e ao conhecimento historicamente organizado, o qual precisa ser constantemente reconstituído e ressignificado mediante a participação democrática de todos. É fundamental que existam aproximações das escolas com as suas comunidades.
Na Educação Infantil, por exemplo, podem ser construídas redes de apoio virtual às famílias com a finalidade de auxiliar no estabelecimento de um clima de segurança e proteção das crianças. As pesquisas do campo pedagógico e das culturas infantis indicam que não se justifica a preocupação expressa por algumas famílias sobre uma possível perda no processo de aprendizagem que as crianças estariam sofrendo por não frequentarem a escola neste momento. Aprendizagens diversas, mas igualmente importantes, estão ocorrendo agora com a convivência mais intensa com a família. A urgência da proteção da vida e da saúde configurou outras formas de desenvolver o processo educativo das crianças, assim como enfatizou o papel social do trabalho docente, realizado não só em sala de aula, mas também na gestão e orientação das relações com a comunidade escolar.
A defesa, acima exposta, também se aplica ao Ensino Fundamental e Médio, salvaguardando, evidentemente, as especificidades desses níveis. Ouvir a comunidade, os profissionais da educação, as crianças, os jovens e suas famílias, a partir das redes estabelecidas através de diferentes mecanismos, pode configurar-se como uma importante estratégia para repensar as propostas político-pedagógicas das escolas. De maneira muito criativa e reflexiva, várias experiências de diálogo entre escolas e comunidades estão acontecendo e precisam ser socializadas para que outras relações surjam nesse contexto de pandemia. Os saberes e conhecimentos produzidos nessa interação são essenciais para o enfrentamento das questões objetivas que se apresentam na atualidade.

4 – pela defesa e necessidade de um projeto popular e humanista, com políticas públicas sólidas e uma educação gratuita, democrática, laica e que atenda aos princípios da qualidade social.

A análise das questões conjunturais, que envolvem o contexto educacional, político, econômico e social, aponta que é imprescindível defender:

– a imediata revogação da Emenda Constitucional 95, que instituiu em 2016 o teto dos gastos públicos prejudicando a ampliação de investimentos na saúde e na educação;
– a proteção das famílias trabalhadoras, de seus empregos e rendas, através de políticas públicas e sociais, para que possam ficar em casa com seus filhos e em segurança;
– o maior controle sobre as medidas de isolamento social, considerando que as aglomerações (tanto ligadas às atividades laborais, como associadas aos deslocamentos via transporte público e para o lazer) estão se acentuando;
– a garantia da merenda escolar através de cestas básicas com os recursos estatais;
– a realização do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) somente quando existirem condições igualitárias e justas para que todos os estudantes possam prestar o exame; do contrário, haverá um acirramento das desigualdades sociais, impactando ainda mais as classes populares e se contrapondo com as políticas de justiça social de acesso ao Ensino Superior;
– a prorrogação da Lei do FUNDEB (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação), posto que estamos no último ano de vigência;
– a elaboração e aprovação de um Projeto de Lei que garanta os recursos necessários para a implementação do Plano Nacional de Educação e de políticas para a qualificação da educação pública;
– uma discussão ampla e democrática, envolvendo as entidades acadêmicas, científicas, sindicais, estudantis, com as representações de classe e os pesquisadores da área sobre as políticas educacionais implementadas pelo atual governo federal.

Pelotas, 27 de maio de 2020.