Simulações da trajetória da nuvem de gafanhotos: uma estimativa para o dia 19/7

Os pesquisadores do GDISPEN têm trabalhado em simular a trajetória da nuvem de gafanhotos que está atualmente na Argentina.

Um grande deslocamento da nuvem de gafanhotos aconteceu entre os dias 11 e 20 de junho, fazendo com que o enxame se aproximasse da fronteira do Rio Grande do Sul e causando preocupação à população e as autoridades. Depois deste período, o deslocamento diminuiu e a nuvem ficou circulando pela província de Corrientes na Argentina. No dia 28/6 a nuvem estava a pouco mais de 100 km da fronteira brasileira, nas proximidades da cidade de Curuzú Cuatiá, província de Corrientes. No último 16/7, parte da nuvem foi detectada perto do rio Ávalos, departamento de Curuzú Cuatiá. (https://www.argentina.gob.ar/noticias/corrientes-se-detecto-parte-de-la-manga-de-langostas-en-sitios-de-monte-sin-acceso). Esta “permanência” foi causada principalmente devido a ocorrência de baixas temperaturas na região. Ainda na reportagem é citada que uma nuvem de insetos foi detectada pelo SENAVE do Paraguai a aproximadamente 300km da fronteira brasileira, na área de Teniente Pico, departamento de Boquéron.

Segundo o SENASA (https://www.argentina.gob.ar/senasa), que tem monitorado a nuvem desde o final de maio, a nuvem de gafanhotos pode ser formada por até 40 milhões de insetos em aproximadamente um quilômetro quadrado, comendo pastagens equivalentes ao que 2.000 bovinos podem consumir em um dia (https://catracalivre.com.br/mais/argentina-encontrou-uma-forma-de-combater-a-nuvem-de-gafanhotos/). Depois de operações aéreas contra os insetos, pelas autoridades argentinas, estima-se que esta nuvem tenha reduzido em torno de 30%.

Todo dia, após o nascer do sol e se a temperatura permitir, os enxames alçam voo, seja qual for o tipo de ambiente onde estavam pousados. Os deslocamentos realizam-se em direções variadas, determinadas em 80% dos casos pela direção do vento, podendo chegar a 150km/dia.  A espécie se alimenta especialmente de gramíneas, incluindo culturas, pradarias e flora nativa, o que causa diversos problemas na agricultura e pecuária (https://www.argentina.gob.ar/senasa/micrositios/langostas).

Cientes de que temperaturas mais altas propiciam o deslocamento da espécie, e da previsão de temperaturas elevadas neste final de semana no estado, apresenta-se uma simulação de uma possível movimentação da nuvem no domingo, 19/7.

Simulação da trajetória da nuvem de gafanhotos:

Na simulação, são utilizados números aleatórios para criar a nuvem de gafanhotos de forma circular, distribuídos uniformemente em um diâmetro de 10 km (https://www.emaisgoias.com.br/nuvem-de-gafanhotos-de-10-km-de-extensao-avanca-rumo-ao-brasil-video/). A técnica utilizada consiste em seguir a nuvem por toda sua trajetória.

Com o intuito de rastrear a nuvem durante sua trajetória, empregam-se as variáveis (x,y) para as coordenadas espaciais e θ para a coordenada da direção da  nuvem. A trajetória da nuvem pode ser construída como uma sucessão de estados, onde cada estado sucessivo é uma função somente do estado anterior, a partir de um estado inicial pré-determinado.

Neste trabalho, essas condições iniciais são obtidas através das informações do site do SENASA (https://geonode.senasa.gob.ar/maps/1806/view), que fornece os registros reais das coordenadas da latitude e longitude da localização da nuvem de gafanhotos.

 As variações da posição e da direção são determinadas por dados gerados pelo modelo de pesquisa e previsão do tempo WRF (Weather Research and Forecasting Model). Por meio deste, obtém-se o campo de vento em 850hPa, ou seja, os valores u e v das componentes da velocidade do vento, para cada ponto de grade espacial. Então, determina-se o ângulo , o qual define a direção que a nuvem irá se deslocar (uma vez que os deslocamentos da nuvem são determinados em 80% dos casos, pela direção do vento). Assim, a cada iteração atualiza-se a nova posição e assumem-se os valores correspondentes das componentes das velocidades.

 As simulações realizadas são feitas de forma que se escolha o melhor horário que coincida com os dados reais, fornecidos no site do SENASA. Aqui, o melhor horário significa os dados do campo do vento que geram resultados mais próximos da trajetória da nuvem.

Na figura abaixo pode-se visualizar o trajeto total percorrido pela nuvem de gafanhotos entre os dias 11 e 20 de junho. Após este período, os gafanhotos ficaram sobrevoando em torno da mesma região do último ponto simulado até o dia 10 de julho. No gráfico, os pontos verdes representam a nuvem de gafanhotos e os pontos coloridos são os locais onde os insetos foram avistados nos dias em questão. Percebe-se que o modelo conseguiu reproduzir de forma bastante satisfatória o caminho percorrido pelos insetos. As imagens de satélite da região foram retiradas do Google Earth.

Na sequência são apresentadas duas animações. Na primeira, é apresentado o campo de vento obtido pelo modelo WRF, e que foi utilizado nas simulações do período considerado. Na segunda, o deslocamento da nuvem. Para visualizar a animação clique nas figuras abaixo.

Estimativa do deslocamento da nuvem para o domingo, 19/7:

Na sequência é apresentada uma estimativa de como a nuvem de gafanhotos poderia se deslocar no domingo 19/7, supondo que até esta data eles permaneçam na região atual.  O modelo WRF foi utilizado para fazer uma previsão dos campos de vento, inicializada no dia 17/7 as 12UTC, conforme as figuras abaixo (no horário local, as 9h da manhã e as 15h da tarde do dia 19/7).

Utilizando este campo de vento, conforme descrito anteriormente, pode-se fazer uma estimativa de 3 possíveis trajetórias. Simulou-se um trajeto de até 150 km de distância do ponto de partida, sabendo que este valor é o maior registrado para deslocamento da nuvem de gafanhotos, ou seja, a nuvem pode parar nos pontos intermediários do percurso. As trajetórias são descritas na figura a seguir, e diferenciadas por cores. Em verde, a trajetória estimada para um voo vespertino. Em vermelho, uma trajetória estimando um voo  matutino e um voo vespertino. Em azul, uma trajetória estimando um voo matutino.

Utilizando os dados da trajetória descrita pela cor vermelha, segue uma animação do possível trajeto. Se a previsão se confirmar, no final do domingo 19/7, estima-se que a nuvem poderá atingir a província de Entre Ríos na Argentina, fronteira com o Uruguai. Para visualizar a animação  clique na figura abaixo.

É importante lembrar que estas simulações advêm de um modelo matemático, e como tal é uma aproximação da realidade, e, portanto, possui erros inerentes. Além disso, a trajetória pode ser alterada de acordo com mudanças devidas ao deslocamento da espécie, além de mudanças climatológicas como chuva e frio.

Este estudo tem objetivo puramente acadêmico e científico, mostrando a grande aplicabilidade da modelagem matemática em problemas reais. As discussões, opiniões, idéias e publicações geradas a partir dos resultados do modelo utilizado são de autoria dos respectivos autores, e não necessariamente representam aquelas das instituições a que estes pertencem.

Os pesquisadores do GDISPEN envolvidos nesta pesquisa são os doutores Fernanda Tumelero, Viliam Cardoso da Silveira, Guilherme Jahnecke Weymar, Daniela Buske, Régis Sperotto de Quadros, Glênio Aguiar Gonçalves, Igor da Cunha Furtado, Alexandre Sacco Athayde e Luciana Piovesan.