Após as enchentes, a luta comunitária pelo recomeço

No Laranjal, moradores como Alexandre Quadrado trabalham, desde 2024, pela reestruturação do bairro

Por Martha Cristina Melo

Ilustração de um homem de cerca de 50 anos, com cabelos escuros e barba fechada. Ele veste um casaco de abrigo preto e está sentado.

Ilustração: Ana Alice Winter.

Quando Alexandre viu a água invadir as ruas, o susto já havia se transformado em emergência. Naquele momento, bombeiros e Defesa Civil já ocupavam a região, tentando conter o avanço da enchente que ameaçava aqueles relutantes em deixar seus lares. Entre eles, Alexandre. Dono de um bar local, saiu, de moto, como quem procura entender os estragos vizinhos. Ao voltar, a água já tornava impossível a entrada em casa a pé.

Com o mesmo caiaque que utilizou para entrar em casa, o morador do Laranjal explica que, posteriormente, veio a auxiliar no resgate — já que as equipes de apoio iniciais vinham de regiões como São Paulo e Mato Grosso e, por isso, não conheciam bem a área. Após mais de 6 horas remando, Alexandre encontrou idosos dormindo, sujeitos à hipotermia devido a água que já encostava nos colchões, além de animais amarrados e abandonados, ilhados em cima das casinhas. Ali, começavam longas semanas de recomeço. 

Alexandre Quadrado

Alexandre Quadrado de Ávila é morador do Laranjal há mais de 40 anos. Entre longas viagens de moto pelo Brasil, nunca deixou de ser apaixonado pelo bairro pelotense, assim como nunca se viu morando em outro lugar. “A qualidade de vida da praia é muito boa para sairmos daqui. Vou reformar e pintar minha casa, não quero ir embora”, afirmou Quadrado ao ser questionado se, após as enchentes, pensava em sair de onde mora. 

Durante a tragédia, Alexandre precisou ficar 31 dias fora de casa, hospedado na casa da ex-mulher, juntamente aos seus filhos, no centro da cidade. Foram 60 dias sem trabalhar normalmente e, após o retorno, foi obrigado a vender mercadorias a preços menores para garantir saída. Além do prejuízo financeiro e emocional, o morador relatou que também perdeu eletrodomésticos como freezer, geladeira e máquina de lavar — alguns, recuperados pelo trabalho do Centro de Engenharias da UFPel —  e, apesar do auxílio do Banco Federal destinado às vítimas das enchentes, ainda não conseguiu se reestruturar.

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Comunidade 

Segundo Alexandre, a comunidade local se organizou para montar uma cozinha improvisada na Paróquia de Santo Antônio, localizada em uma área elevada do Laranjal. Ele era o responsável pelo café da manhã e pelo almoço, enquanto seus colegas organizavam o jantar. Juntos, a comunidade atendeu cerca de 35 policiais do Batalhão de Choque e mais de 40 bombeiros, além de enviar comida para demais alojamentos. 

Dividindo seu tempo com a cozinha comunitária, Quadrado chegou a “monitorar” as residências que foram deixadas para trás durante a inundação. Diariamente, segundo Alexandre, mandava notícias sobre as casas para os moradores que precisaram deixar o Laranjal. Participante ativo na reestruturação do bairro, Alexandre chegou a instalar bombas flutuantes em sua região que ajudem a escoar a água caso o nível da Lagoa dos Patos suba novamente. 

O Laranjal vale a pena

Apesar de tantos esforços e urgências, como mencionado anteriormente, Alexandre não se vê em outro local. Aos poucos, conseguiu reestruturar seu negócio e, como próximos planos, planeja recuperar sua casa. Segundo o morador, não trocaria o movimento, a calmaria e as pessoas que vivem na praia por outro local. 

Alexandre Quadrado é uma das pessoas que formam uma comunidade engajada e apegada ao Laranjal. A enchente evidenciou vulnerabilidades mas, também, a força de quem mora lá. 

Saiba mais sobre a série de reportagens

A série de reportagens e conteúdo multimídia Artefatos Recuperados, Memórias Resgatadas faz parte do projeto de extensão de mesmo nome, desenvolvido por estudantes de Jornalismo e Artes Visuais para divulgar o trabalho do projeto Recuperando Lares e recontar a história das pessoas atingidas pela enchente no município.

Você também pode acessar o conteúdo da série seguindo o projeto no Instagram (@artefatosmemorias) e no Facebook (Artefatos Recuperados, Memórias Recontadas).

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