Restauro e exposição de objetos históricos do Curso de Odontologia
O Museu de Arte Leopoldo Gotuzzo inaugurou exposição que conta parte da história da Faculdade de Odontologia da UFPEL. Esta exposição está ligada ao Projeto “O Museu do Saber e do Fazer: arte e ciência em ações educativas no Museu de Arte Leopoldo Gotuzzo”, aprovado no Edital Proext 2010 e coordenado pela professora do Curso de Conservação e Restauro Dra Francisca Michelon. Trata-se do resultado de uma busca por objetos, fotografias e documentos que indicam o percurso da Faculdade de Odontologia nesta cidade, de sua fundação, em 21 de setembro até seu ingresso na UFPel.
Vários colaboradores contribuíram com doações e empréstimo de material. Uma parte dos objetos recolhidos foi restaurada por alunos do Curso de Conservação e Restauro, coordenados pelo técnico em restauração Fábio Galli, também aluno do curso de Conservação e restauro, e será incorporada ao futuro Museu da UFPel. Alunos do Curso de Museologia também contribuíram para a montagem da exposição, que também inclui um Ciclo de Palestras, oficina de formação de professores, recepção a escolas, mediação e produção de material didático. “O principal objetivo é fomentar a curiosidade dos jovens estudantes pelas áreas de conhecimento que definem a UFPel, cativar público de crianças e adolescentes para os museus da Universidade e, claro, contribuir com as muitas comemorações que estão marcando os 100 anos da Faculdade de Odontologia”, explica a coordenadora do projeto, professora Francisca Michelon.
A história da Faculdade de Odontologia de Pelotas tanto acompanha a história da odontologia no país, como a história de Pelotas no séc. XX.
O trabalho filantrópico que marcou o percurso desta instituição na cidade está ligado a sua origem, mas, sobretudo às especialidades que foram definindo os rumos desta ciência jovem (se considerarmos que o primeiro curso superior só surgiu em 1840, nos Estados Unidos). A Faculdade de Pharmácia e Odontologia de Pelotas enfrentou a gripe espanhola que assolou a cidade em 1918, atendia os mais pobres e foi a primeira cidade no país a ter uma clínica dentária específica para atendimento às crianças. Clínicos e homens da ciência atuaram nesta instituição desenvolvendo métodos de tratamento aprimorados para a sua época. Afirmavam, de muitas formas, o caráter humanitário que a definia. Houve um momento difícil – o início até a municipalização, houve um momento áureo – a federalização até o final dos anos 1960 e há o momento atual – que se inicia quando a Faculdade de Odontologia passa a congregar a Universidade Federal de Pelotas. E cabe lembrar que em sua centenária existência, mais de 40 anos foram vividos nesta Universidade.
Mas, como em toda a ciência na qual a tecnologia acompanha e, simultaneamente, determina os seus avanços, certo desligamento com o passado é conseqüência recorrente. Assim, sob a égide de um necessário desejo de modernização, equipamentos, materiais, recursos didáticos, mobiliário e documentos de diversas naturezas foram sendo descartados para dar lugar aos novos. Pouco sobrou. Mas este pouco sobrevivente é capaz de apontar para muitos aspectos da história: como eram os locais, quem era o público atendido, com que recursos de estrutura a Faculdade contava, como se ensinava, como se atendia nas clínicas.
O curioso é que desde o início a Faculdade tinha um Museu de História Natural. O Professor Eurico Kramer de Oliveira escreveu um manuscrito no qual relata memórias e fatos históricos ocorridos na Faculdade de Odontologia, dentre esses menciona a existência de um Museu que, segundo suas palavras fazem entrever, existiu de fato. Nele havia um modelo da cadeira odontológica SS White, marca que produziu nos Estados Unidos a famosa cadeira Wilkerson, a primeira a ter o sistema hidráulico para elevação. Diz o professor ter aprendido a odontologia nessas cadeiras. O Museu da FOP sempre foi um projeto,ora existente, ora uma aposta. Ou seja, com uma longa história, sempre houve o que contar através dos objetos.
Para esta exposição foi possível conseguir por empréstimo um modelo da Peerless Harvard, cadeira dentária fabricada nos Estados Unidos com recursos aprimorados como o assento para atendimento infantil. Essa marca produziu bastante de 1915 a 1930. O modelo que estará em exposição pode ser de 1917-18. É um modelo que já apresenta o acionamento dos movimentos da cadeira por alavanca e inclinação de 180º. Assim como a cadeira, outra peça obtida com um particular é o trépano a pedal que foi inventado em 1871, mas que como idéia existia desde meados do séc. XVIII. O dentista acionava o pedal que gerava rotação em uma ponteira, suportada por uma caneta. Esse mecanismo retirava do dente por desgaste a porção cariada. Foi usado até as primeiras décadas do séc. XX e suplantado, totalmente, pelo motor de alta rotação, essencialmente elétrico.
Também é intensa e envolvente a história da confecção de peças anatômicas para o ensino da anatomia da cabeça. Há muitas destas peças ainda em uso no Departamento de Morfologia do Instituto de Biologia. Duas destas e um crânio com os ossos desarticulados foram emprestados para a exposição.
Também intensa e comovente é a história da confecção de próteses faciais, que se fazia no Departamento de Cirurgia e Prótese, hoje separados. As pessoas mutiladas contavam com este importante serviço da Faculdade. Na exposição há modelos de cabeças com base de gesso e moldagem em cera de rostos que apresentam mutilações. Essas moldagens faziam parte do processo de confecção das próteses. No mesmo Departamento os alunos estudavam em manequins as amarrias mandibulares e maxilares também em modelos, nos quais alguns estarão expostos.
O CDDB (Centro de Diagnóstico de Doenças da Boca) da FOP emprestou, dentre outros equipamentos já históricos, um projetor de lâminas histopatológicas, que foi usado por muitas décadas pelos professores em suas aulas de patologia.
E as fotografias atestam as mudanças: como era o prédio que alojou a FOP até a construção do atual. Esse prédio continha laboratórios, auditório, salas de aula, clínicas. Foi derrubado para a construção do novo, cujo projeto não se concluiu. As fotos mostram como eram as clínicas, como os clínicos atendiam, como eram as aulas práticas e isso ao longo de muitas décadas.
Então, é uma longa história. Não se pode contá-la toda em tão pouco espaço, com tão poucos objetos e recursos. Mas é muito bom saber que ela existe e que esta cidade tem o privilégio de sediá-la. Afinal são poucas Faculdades de Odontologia no Rio Grande do Sul. Esta é a segunda mais antiga, a primeira é a da UFRGS, fundada em 1898 e que, no entanto, esteve fechada por dez anos, entre 1922 e 1932. A FOP nunca esteve fechada. E é a única na região sul do Estado. Causa respeito pela sua longevidade, admiração pelo seu percurso e interesse pelo seu desenvolvimento. Também é uma história que conta a história de muitas pessoas: professores, funcionários, alunos, pacientes. Sem dúvida, é uma boa história. Vale à pena redescobri-la!
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