Artigo novo: Hiperpartidarismo, Desinformação e Conversações Políticas no Twitter nas Eleições de 2018

Principais pontos:

  • Pesquisa realizada no Twitter mostra que a desinformação aumentou do primeiro para o segundo turno das eleições de 2018, fortemente associada à polarização política das conversações.
  • Essa desinformação foi também associada à presença de veículos hiperpartidários que ganharam mais espaço nas conversas, ao mesmo tempo em que os veículos jornalísticos perderam espaço.

Overview

Recebemos o aceite (ICWSM-2020) para publicação de mais um artigo com resultados da pesquisa sobre desinformação e as eleições de 2018.  Este artigo (que estará disponível em breve)  trata do papel dos sites hiperpartidários e da polarização no espalhamento de desinformação no Twitter.  Sites hiperpartidários são aqueles que divulgam apenas informações que favorecem um certo partido, viés político ou candidato, geralmente travestidos de “notícias”, porém enviesadas.  Neste trabalho, mostramos três coisas: (1) Um contexto extremamente polarizado das conversações no período eleitoral; (2) Forte associação entre os veículos hiperpartidários e desinformação (notamos a presença conteúdo manipulado ou enganoso, principalmente, mais do que conteúdo fabricado); (3) Neste contexto, os veículos hiperpartidários circularam cada vez mais conforme as eleições se aproximavam, enquanto os veículos informatívos mais legítimos, como jornais, cada vez menos, principalmente no grupo de apoio ao atual presidente. Essa tendência ocorreu nos dois grupos.

Nesse trabalho, portanto, argumentamos que a circulação de veículos hiperpartidários está sim associada à desinformação em um determinado grupo, e que em contextos polarizados, as pessoas tendem a dar maior visibilidade para informação  que favorece seus próprios pontos de vista em detrimento de conteúdo jornalístico (que supostamente tem informação que foi apurada).

Método

Este trabalho traz resultados baseados em um conjunto de mais de 8 milhões de tweets em português coletados durante a última semana do primeiro e do segundo turno das eleições de 2018. Para discutir os dados, usamos uma combinação de métodos denominada “métodos mistos”.

Para a análise da polarização, utilizamos análise de redes e algoritmos que calculam a tendência de todos os nós em pertencerem ao mesmo grupo a partir de seus retweets e citações (você tende a estar mais próximo das pessoas que retuita/comenta). Analisamos a tendência desses grupos de continuarem conectados em cada turno das eleições medindo níveis de conectividade. Dentro dos grupos que identificamos, analisamos a influência dos nós a partir do número de citações.

Também usamos outro método de análise de conceitos (Connected Concept Analysis) para verificar os termos que mais co-ocorrem em conjunto em cada um dos grupos (clusters) identificados, de modo a perceber sua filiação política.

Finalmente, analisamos qualitativamente os  veículos com maior influência em cada grupo (108 no primeiro turno e 92 no segundo), classificando-os em veículos hiperpartidários ou jornalísticos, de acordo com o tipo de conteúdo que divulgavam. Também observamos os 20 últimos tweets de cada uma dessas contas, de modo a identificar desinformação.

Resultados

Como explicamos, há uma forte tendência à polarização dessas conversações. Ou seja, em todos os mapeamentos que fizemos, há uma tendência à formação de dois grupos nessas conversações, aqueles que apoiaram o atual presidente e aqueles que eram contrários à sua eleição. Nas imagens abaixo temos a comparação dos grupos presentes no primeiro e no segundo turno, o grupo vermelho favorável ao candidato Bolsonaro e o azul, contrário.

Grupos no primeiro turno

Grupos anti (azul) e a favor (vermelho) de Bolsonaro no primeiro (acima) e no segundo turno (abaixo).

Esses grupos tornam-se mais fechados com a aproximação do turno final. É importante também ressaltar que denominamos os grupos como favoráveis e contrários ao atual presidente porque não aparece, no grupo contrário, com tanta força, o candidato da oposição, mas sim, o sentimento contrário a Bolsonaro.

No entanto, essa polarização também facilita a circulação de veículo hiperpartidários, que consideramos , de acordo com a literatura, aqueles que  (1) apoiam claramente uma ideologia, partido, candidato ou viés político; (2) apresentam o foco do seu conteúdo como “verdade” ou “notícia” ( ou a “verdade alternativa” à mídia tradicional); (3) usam de sensacionalismo e linguagem emocional no conteúdo e; (4) produzem/compartilham informações tendenciosas e enviesadas.

Nas imagens a seguir, vemos os veículos hiperpartidários (em vermelho) e os veículos jornalísticos (em preto). Em ambos os casos, os veículos hiperpartidários ganham centralidade nos dois clusters enquanto os veículos noticiosos perdem espaço (e vão para a periferia do grupo). No entanto, a centralidade dos veículos hiperpartidários é maior entre os apoiadores do atual presidente (círculo).

Circulação de veículos hiperpartidários e jornalísticos nos grupos durante o primeiro (acima) e o segundo turno (abaixo).

Finalmente, também analisamos a quantidade de desinformação que circulou nesses grupos. O resultado foi que, conforme aproximou-se a data do 2o turno, mais desinformação circulou nos dois grupos. Porém, o número total é maior no cluster de apoiadores do que no de detratores.

Circulação de desinformação pelos veículos hiperpartidários no primeiro e no segundo turno nos dois grupos.

Relevância

A mídia social tem uma importância extraordinária nas eleições de 2018 no Brasil. O candidato Bolsonaro, por exemplo, tinha pouquíssimo tempo na mídia de massa, enquanto o candidato Haddad tinha o maior tempo. A campanha do atual presidente foi, assim, realizada em larga medida no Facebook e no Twitter, através de lives e mensagens aos eleitores.  O Twitter, de modo particular, é um espaço mais público, onde a informação circula mais livremente (ao contrário do Facebook, onde a informação tende a circular menos porque precisa passar de uma rede social a outra através de compartilhamentos). Além disso, observamos que essas várias plataformas são interconectadas em termos de conteúdo, uma refletindo parte do conteúdo que passa pela outra. Esses dois fatores colocam o Twitter com um laboratório interessante e relevante para observar as estruturas das conversações e da própria campanha eleitoral.

Os resultados que trazemos neste estudo são bastante preocupantes, pois indicam que a polarização política (ou seja, a criação de grupos com características de câmaras de eco, que tendem a circular apenas informações com as quais concordam) pode influenciar fortemente a circulação de desinformação, tornando fértil o espaço para conteúdo enganoso e falso. No nosso estudo, o aumento da polarização foi relacionado ao aumento da circulação de desinformação e de veículos hiperpartidários e o pior, a não circulação dos veículos jornalísticos, que poderiam desmentir a informação falsa. 

Autores e financiadores

Esse trabalho é resultado de um esforço conjunto entre o MIDIARS e o Social Media Lab (Ryerson/Toronto) e foi realizado por Raquel Recuero (UFPEL/UFRGS), Felipe Soares (UFRGS) e Anatoliy Gruzd (Social Media Lab/Ryerson University).  É um trabalho que também contou com o financiamento da FAPERGS (Edital de Internacionalização), do CNPq (bolsa de pesquisa)  e da CAPES (Print).

MIDIARS e Social Media Lab divulgam resultado de pesquisa sobre Toxicidade, Linguagem e Eleições

Está disponível o relatório do Digital Ecosystem Research Challenge, projeto que reúne 18 pesquisas sobre as eleições canadenses. O grupo Midiars participou de um destes projetos em parceria com o Social Media Lab (Ryerson University), do Canadá. O projeto realizado pelos dois grupos focou na toxicidade online direcionada a candidatos nas eleições canadenses.

A nossa pesquisa tem dois objetivos principais: (1) observar a prevalência de mensagens toxicas enviadas a candidatos no Twitter e (2) identificar se há diferença na frequência de mensagens tóxicas direcionadas a homens e mulheres que se candidataram nas eleições canadenses. Para a realização desta pesquisa, coletamos tweets públicos em inglês direcionados a uma lista de 1.344 candidatos com perfil público no período de um mês (28 de setembro a 28 de outubro de 2019). Neste processo, coletamos 363.709 tweets direcionados a 1.116 candidatos.

Para a primeira fase da pesquisa, recrutamos e treinamos três codificadores para analisar uma amostra de 1% do nosso conjunto de dados (3637 tweets). Os codificadores leram estes tweets e identificaram os que eram tóxicos, quando a mensagem é rude, desrespeitosa ou irracional, e insultos, quando a mensagem é inflamatória ou negativa em relação a uma pessoa ou um grupo de pessoas. Ao final, realizamos um teste estatístico (chi-square) para identificar se havia relação entre gênero e a frequência de mensagens tóxicas.

Os resultados da primeira fase mostraram que 8,4% das mensagens eram tóxicas e 2,8% eram insultos. O teste estatístico determinou que não havia associação entre o gênero dos candidatos e receber mensagens tóxicas. Ainda que outros estudos semelhantes também não tenham encontrado associação sobre gênero e a frequência de mensagens tóxicas, análises complementares mostraram que as mulheres costumam receber mais frequentemente alguns tipos de mensagens tóxicas, como discurso de ódio, mensagens que reforçam estereótipos e mensagens sexistas.

Nos estudos futuros, para as próximas fases da pesquisa, nós vamos aplicar técnicas de machine learning para analisar o conjunto de dados inteiro. Assim, podemos verificar se os resultados da primeira fase se confirmam para todo o conjunto de dados. Além disso, vamos usar modelagem de tópicos para identificar as diferenças nos tipos de mensagens tóxicas entre os gêneros.

Dentre as implicações deste estudo, destacamos que não apenas a frequência das mensagens tóxicas, mas também sua severidade pode afetar o bem-estar de candidatos. Além disso, alguns candidatos experimentam casos mais extremos de violência. Entendemos que as plataformas devem assumir papéis mais proativos no combate a campanhas de ódio. Por exemplo, a maioria dos tweets que identificamos como tóxicos ou insultos ainda estão disponíveis no Twitter.

O lançamento do relatório ocorreu em conferência que reuniu os grupos dos 18 projetos na Universidade de Ottawa, no Canadá, nos dias 20 e 21 de fevereiro. O Felipe Soares, integrante do Midiars que está em doutorado-sanduíche no Social Media Lab, participou da conferência e apresentou os resultados da primeira fase da pesquisa. O relatório está disponível em inglês e francês (os nossos resultados estão detalhados a partir da p. 30).

 

Por Felipe Soares

MIDIARS com canal no Youtube

Um dos nossos mais recentes esforços para aproximar o que fazemos da comunidade é um canal no Youtube.  Ali, vamos divulgar, em alguns vídeos o que temos feito e quais as novidades em termos de pesquisa. Dá para conferir, em poucos minutos, os principais resultados, dados e métodos que temos trabalho.

Apareçam por lá!

Violência de Gênero: Nova publicação

Recentemente, as bolsistas de Iniciação Científica e participantes do grupo, Lisandra Miranda e  Camila Santos, participaram do INTERCOM SUL, em Porto Alegre, onde apresentaram o trabalho “Análise das conversações no Twitter a partir de notícias dos jornais brasileiros sobre a violência contra a mulher“. O trabalho traz o resultado de um trabalho focado na análise de como os jornais brasileiros oportunizaram (ou não) a discussão sobre a violência contra a mulher em crimes de feminicídio.

 

MIDIARS na 10th International Conference on Social Media and Society

Felipe Soares, integrante do grupo, esteve em julho no Canadá, onde apresentou um dos trabalhos desenvolvidos pelo grupo na  10th International Conference on Social Media & Society aconteceu entre 19 e 21 de julho na Ryerson University em Toronto.  O evento foi uma ótima oportunidade para receber feedback sobre a pesquisa, além de conhecer o trabalho de outros pesquisadores de diversos lugares do mundo e os projetos desenvolvidos pelo Social Media Lab, grupo parceiro do Midiars.

O artigo “Asymmetric Polarization on Twitter and the 2018 Brazilian Presidential Elections” (Polarização assimétrica no Twitter e as eleições presidenciais brasileiras de 2018) buscou compreender as dinâmicas de polarização em conversações no Twitter durante as eleições presidenciais do último ano. Foram analisadas as interações de quase 3 milhões de tweets, divididos em quatro datasets. No trabalho, os pesquisadores  identificaram dois grupos principais nas conversações analisadas, um bastante centrado em Jair Bolsonaro (que chamamos de pró-Bolsonaro) e outro composto pelo resto da rede, que compartilhava um sentimento contrário a Bolsonaro (e, por isso, chamamos de anti-Bolsonaro). Os resultados apontam  mostram que o grupo anti-Bolsonaro deu maior visibilidade a veículos de mídia e teve um consumo mais variado deles, incluindo veículos jornalísticos tradicionais do Brasil e até mesmo veículos estrangeiros. Já o grupo pró-Bolsonaro deu pouca visibilidade a veículos de mídia, tendo preferência por veículos que claramente apoiaram o candidato durante a campanha. Este tipo de comportamento representa o conceito de polarização assimétrica, cunhado por pesquisadores da Universidade de Harvard. A ideia de polarização assimétrica se aplica quando há dois grupos antagônicos em uma conversação política em mídias sociais, mas um deles possui comportamento mais radicalizado, limitando o acesso a veículos jornalísticos tradicionais e dando preferência a veículos hiper-partidários.

MIDIARS apresenta pesquisa no INTERCOM SUL 2019

Nesta última semana, as bolsistas de graduação do MIDIARS, Lisandra Miranda e Camila Santos participaram do Intercom Júnior, evento de pesquisa da graduação do INTERCOM SUL 2019, que aconteceu na UNIRITTER, em Porto Alegre. As  pesquisadoras tiveram o trabalho “Análise das conversações no Twitter a partir de notícias dos jornais brasileiros sobre a violência contra a mulher” aceito para o evento.  A seguir, um pequeno resumo da pesquisa que foi apresentada, feito pela Lisandra.

O artigo focou na violência contra a mulher e a maneira que os jornais brasileiros por meio de suas notícias relatam esse tipo de violência. O objetivo foi analisar a conversação dos usuários a partir das notícias postadas no Twitter dos jornais brasileiros sobre a violência contra a mulher. Como objetos da pesquisa foram destacados dois casos de 2018 no Brasil de feminicídio, sendo eles o caso de Stéfane Gomes, morta a facadas pelo companheiro no Rio Grande do Sul, e Tatiane Spitzner, agredida e atirada do quarto andar do prédio onde morava pelo marido no Paraná. Sendo esses casos relacionados aos conceitos de autores como Foucault (1960), Bourdieu (1999) e Žižek (2009), sobre discurso e violência simbólica. 

As metodologias empregadas foram de análise de co-ocorrência, que tem objetivo de identificar os termos que mais ocorreram nas respostas e suas conexões como os outros, e a análise de conteúdo das conversações, que permite a classificação dos sentidos dos dados obtendo os significados deles. Sendo métodos de análise escolhidos para evidenciarmos a violência simbólica dentro das conversações dos usuários a partir desses casos de feminicídio.

Os resultados obtidos apontam para o desfoque da conversa dos casos de feminicídio. Em que, temos o apagamento das vítimas nas conversações, como no caso de Spitzner os jornais e a conversão a mostraram somente como a advogada e o mesmo acontece com Gomes, que tem seu nome substituído pelo substantivo jovem. Também, os usuários saem do foco de discutir sobre os casos de feminicídio e focam em discussões paralelas, como porte de arma e pena necessária para cada um dos homens dos casos. 

Dessa forma, foi evidenciada a presença da violência simbólica dentro da conversação dos usuários em relação os casos de feminicídio de Stéfane Gomes e Tatiane Spitzner a partir de notícias sobre esses atos de violências contra a mulher. 

A manifestação no Twitter sobre #DitaduraNuncaMais

Por Felipe Soares

Por meio do porta-voz da presidência, Jair Bolsonaro (PSL) determinou ao Ministério da Defesa que faça as “comemorações devidas” no dia 31 de março pelos 55 anos do golpe que iniciou a ditadura militar brasileira em 1964. No Twitter, diversas manifestações utilizaram #DitaduraNuncaMais como forma de protesto ao posicionamento de Bolsonaro, assim a hashtag esteve entre os trending topics durante o dia 26 de março – um dia após a declaração de Bolsonaro. Foram coletados tweets que utilizaram a hashtag até o meio dia de 26 de março para observar as características das manifestações a partir de um recorte da rede. Abaixo está a representação da conversação no Twitter a partir deste recorte, com destaque para os usuários que receberam mais RT em suas mensagens nos dados coletados.

A rede de conversação sobre #DitaduraNuncaMais tem como característica o alto número de RT. A grau médio da rede é 3,194 e os 11.668 nós realizam 18.631 conexões, o que indica que muitos dos usuários aparecem apenas retuitando mensagens de outros. Isto também é visível na representação da rede, já que mesmo em um núcleo central com mensagens que produzem um discurso bastante homogêneo, é possível identificar diversos módulos, todos com um ou poucos usuários de grande destaque – como Marcelo Freixo no módulo verde e Igor Julião no módulo dourado. Esta característica indica que muitos usuários compartilhavam mensagens de apenas um dos “influenciadores” com maior visibilidade da rede, formando como que “caudas” nos pequenos módulos. Já aqueles que fazem parte do centro do núcleo foram os que compartilharam mensagens de mais de um usuário dentre os “líderes de opinião”.

O conteúdo das mensagens com maior visibilidade na conversação é bastante homogêneo. De modo geral, a rede tem posicionamento político bastante vinculado a tendências de esquerda. Dentre os usuários com maior grau de entrada, ou seja, os que receberam mais RT e menções, quatro são políticos do PSOL: Marcelo Freixo, maior grau de entrada da rede, David Miranda, segundo maior, Talíria Petrone e Sâmia Bomfim. As mensagens destes usuários são bastante críticas a Bolsonaro e lembram as barbáries ocorridas durante o período ditatorial, como nos exemplos abaixo.

Além de políticos, a rede também conta com presença de jornalistas e veículos de mídia. A razão da presença de @jairbolsonaro entre os usuários com maior grau de entrada está justamente na menção ao seu usuário, como no tweet de The Intercept Brasil (abaixo). Dentre os veículos de mídia, BuzzFeed Brasil é o que recebeu maior visibilidade na rede, já dentre os jornalistas, William de Lucca é o que teve mais mensagens compartilhada nos dados coletados.

A presença de políticos, jornalistas e veículos de mídia é uma tendência em rede de conversações políticas, já que fazem parte de uma espécie de elite entre os influenciadores. Ainda assim, entre os usuários com maior visibilidade também aparecem pessoas públicas conhecidas por sua atuação em outras áreas, como o jogador de futebol Igor Julião, terceiro maior grau de entrada da rede, e a cantora Maria Rita. Suas mensagens seguem a tendência das anteriores e destacam a crueldade do período militar.

Dentre os usuários com maior visibilidade na rede apenas um possui posicionamento político associado a direita no contexto brasileiro. O movimento político Livres aparece de forma periférica na rede, na parte superior direita (em cinza, cor utilizada para representar nós que não estão nos oito principais módulos da rede). Mesmo que o movimento tenha posicionamento político divergente dos principais usuários da rede, a mensagem do Livres mantém o padrão de crítica a comemoração dos 55 anos do golpe militar.

De forma geral, a rede é bastante crítica ao posicionamento de Bolsonaro e a comemoração dos 55 anos do golpe militar – o que poderia ser esperado em função do teor da hashtag. A maioria dos usuários mais centrais na rede estão associados a posicionamentos de esquerda no espectro político brasileiro e fazem questão de relembrar as barbáries do período militar em suas mensagens.

A coleta dos tweets foi realizada com o software NodeXL. Para a análise da rede e sua visualização foi utilizado o software Gephi. Na análise, foi utilizada a métrica de grau de entrada para identificar os usuários com maior visibilidade, já que este cálculo indica quem recebeu mais menções e RT. Esta métrica está representada no grafo pelo tamanho dos nós. Também foi utilizada a métrica de modularidade, que identifica grupos em que as conexões entre os nós são mais densas. Os módulos são representados na rede por suas cores.

 

Retrospectiva 2018 – Artigos do MIDIARS

Em 2018 o grupo conseguiu correr atrás e publicar várias coisas sobre as pesquisas desenvolvidas no Lab. Alguns dos artigos (quem quiser cópia pode enviar um email:

Discurso Político, Polarização,  Desinformação e Fake News:

• Recuero, Raquel; ZAGO, Gabriela, SOARES, Felipe B. . Mídia Social e Filtros Bolha nas Conversações Políticas do Twitter. In: Joaquim Fialho, José Saragoça, Maria da Saudade Baltazar, Marcos O. dos Santos. (Org.). Redes Sociais: Para uma Compreensão Multidisciplinar da Sociedade. 1ed.Lisboa: Edições Sílabo, 2018, v. 1, p. 119-142.
• SOARES, Felipe B. ; Recuero, Raquel ; ZAGO, Gabriela . Influencers in Polarized Political Networks on Twitter. In: International Conference for Social Media and Society (SMSociety)., 2018, Copenhagen, Denmark. Proceedings for the International Conference for Social Media and Society Copenhagen, Denmark, 2018. p. 1-10.
• Recuero, Raquel; ZAGO, Gabriela ; SOARES, Felipe B. . Using social network analysis and social capital to identify influencer roles on polarized political conversations on Twitter. In: INTERNATIONAL ASSOCIATION FOR MEDIA AND COMMUNICATION RESEARCH (IAMCR), 2018, Oregon, USA. Proceedings of the INTERNATIONAL ASSOCIATION FOR MEDIA AND COMMUNICATION RESEARCH 2018, 2018. p. 1-10.
• Recuero, Raquel; Zago, Gabriela ; SOARES, Felipe B. . Political Fandoms and Superparticipants in Political Conversations on Twitter. 2018. (Apresentação de Trabalho/Congresso).
• Recuero, Raquel. Analyzing Public Conversations in Social Media. 2018. (Apresentação de Trabalho/Conferência ou palestra).
• SOARES, F. B.. Hashtags ativistas e a estrutura de redes sociais no Twitter. In: XXVII Encontro Anual da Compós, 2018, Belo Horizonte. Anais do XXVII Encontro Anual da Compós. São Paulo: Compós, 2018.

Os influenciadores na discussão sobre a saída de Cuba do Mais Médicos

por Felipe Soares

No dia 14 de novembro Cuba deixou de fazer parte do programa Mais Médicos. A decisão repercutiu em grande escala no Twitter – Mais Médicos se manteve entre os trending topics brasileiros ao longo do dia. Na discussão, formaram-se dois grupos: um grupo associado à direita (roxo) e demonstrando apoio ao presidente eleito Jair Bolsonaro e outro grupo próximo da esquerda (verde) criticando o posicionamento do político que causaram a saída de Cuba do programa. Para esta análise, foram observados os 30 usuários com maior grau de entrada em cada grupo – ou seja, os usuários que receberam mais visibilidade na discussão. O objetivo é identificar que tipos de influenciadores são mais importantes para cada um dos grupos.

Figura 1: Rede de conversação sobre a saída de Cuba do programa Mais Médicos

 

Os nós (usuários) mais centrais foram divididos em cinco categorias: 1) políticos; 2) organizações políticas; 3) jornalistas; 4) veículos jornalísticos; 5) outros, que inclui páginas de humor, páginas de conteúdo político, artistas e usuários em geral. A distribuição em cada grupo foi a seguinte:

Tabela 1: Distribuição dos influenciadores nos grupos

  Direita (roxo) Esquerda (verde)
Políticos 5 9
Organizações políticas 1 0
Jornalista 2 6
Veículos jornalísticos 3 5
Outros 19 10

A distribuição entre os grupos possui algumas distinções. Enquanto o grupo da direita dá especial atenção a usuários da categoria “outros”, no grupo da esquerda políticos, jornalistas e veículos jornalísticos também possuem visibilidade. Há também grande diferença no tipo de veículo jornalístico que aparece em cada grupo. No grupo da esquerda aparecem veículos internacionais e a mídia tradicional brasileira. Já no grupo da direita estão presentes somente veículos partidários.

No grupo da esquerda aparecem: Deutsche Welle Brasil, Folha de S. Paulo, G1, Estadão e BBC Brasil. Os dois primeiros são, respectivamente, 7º e 11º nós com maior grau de entrada – o que indica que receberam bastante visibilidade na rede. Ainda aparecem seis jornalistas de grupos de mídia distintos, incluindo veículos internacionais e mídia tradicional brasileira.

No grupo da direita, entre os veículos de conteúdo jornalístico, aparecem apenas: O Antagonista, Renova Mídia e Conexão Política. Os três são veículos que produzem conteúdo com caráter partidário. Além disso, O Antagonista, veículo com maior visibilidade, é somente o 17º em grau de entrada no grupo. Da mesma forma, os dois jornalistas que recebem visibilidade no grupo são críticos tradicionais do PT e participaram da campanha pró-Bolsonaro durante o período eleitoral.

Entre os políticos na rede, no grupo da direita quem recebem principal destaque é Jair Bolsonaro (nó com maior grau de entrada da rede), acompanhado por seu filho Carlos. Ainda no grupo da direita, o MBL aparece com o segundo maior grau de entrada do grupo (e quarto na rede). Já na esquerda, há distribuição de visibilidade entre partidos como PSOL, PT e PC do B, com Guilherme Boulos e Manuela D’Ávila em destaque – respectivamente segundo e quarto maior grau de entrada do grupo.

Na categoria “outros”, no grupo da direita aparecem páginas como Caneta Desesquerdizadora e Socialista de Iphone, que produzem conteúdo crítico à esquerda. Ainda estão presentes usuários que costumam receber destaque em conversações políticas entre os usuários conservadores, como Flavio Morgenstern e o músico Roger Machado.

Já no grupo da esquerda, entre os “outros” aparecem a ferramenta Moments Brasil, do Twitter, o site Youtube, além de usuários que também frequentemente aparecem com destaque em conversações políticas. Há, ainda, a página Quebrando o Tabu que produz conteúdos diversos, especialmente vinculados a diversidade e direitos humanos.

 

O que isso quer dizer?

Há um desequilíbrio entre os influenciadores (as contas com mais visibilidade) nos grupos de esquerda e direita. Enquanto a esquerda busca entre suas fontes veículos jornalísticos e jornalistas internacionais ou consolidados no Brasil, a direita dá preferência ao conteúdo partidário. Da mesma forma, o alto índice de usuários da categoria “outros” mostra o fortalecimento de um discurso menos institucionalizado e com mais fontes alternativas no grupo da direita. Enquanto na esquerda há veículos entre os nós mais centrais, na direita sua presença é mais periférica (mesmo com conteúdo partidário).

Isto tem influência no conteúdo que circula nestes grupos. Entre os usuários de direita, há um discurso mais padronizado, fortemente alinhado com Jair Bolsonaro (que tem grande destaque na rede) e com fontes, incluindo veículos e jornalistas, alinhados ao político. Na esquerda, por outro lado, o conteúdo é mais diversificado, contando com fontes internacionais, com veículos tradicionais da mídia brasileira e maior diversidade entre os jornalistas.

 

Método de coleta e análise

Para esta análise, foram coletados 39.780 tweets com o auxílio do software NodeXL. A coleta foi realizada a partir dos termos “mais médicos”. A análise foi realizada no software Gephi. Duas métricas foram analisadas: grau de entrada, que permitiu identificar os usuários com maior visibilidade; e modularidade, que separou os usuários da rede em grupos conforme suas interações na rede. O grau de entrada é representado pelo tamanho dos nós e a modularidade pelas cores dos grupos.

Os discursos de Bolsonaro e Haddad no primeiro e segundo turno      

Por Felipe Soares

 

No próximo domingo, dia 28 de outubro, o Brasil vai definir seu próximo presidente. Com o objetivo de analisar o discurso dos candidatos Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) durante o primeiro e o segundo turno, foram coletados todos os tweets e retweets dos dois presidenciáveis nos últimos 34 dias, entre 15 de setembro (quando Haddad criou seu perfil no Twitter) e 25 de outubro.

O que se observa dos dados é que Bolsonaro manteve um discurso centrado no antipetismo e no sentimento de mudança. Haddad mostrou maior variação temática, tendo Lula como figura central no primeiro turno. Já no segundo turno o petista focou a campanha no antagonismo com seu adversário e na defesa da democracia.

As mensagens dos candidatos no Twitter foram separadas por dois períodos: até o dia 7 de outubro, quando ocorreu a votação em primeiro turno; e após esta data, quando começaram as campanhas do segundo turno. O passo seguinte foi realizar uma análise de conteúdo e de co-ocorrência entre os termos mais frequentes nas mensagens. Para visualização desta análise, foram formados quatro redes de conceitos, que serão analisadas da seguinte forma: 1) tweets de Bolsonaro no primeiro turno (237 mensagens); 2) tweets de Bolsonaro no segundo turno (304 mensagens); 3) tweets de Haddad no primeiro turno (448 mensagens); e 4) tweets de Haddad no segundo turno (456 mensagens).

Confira a seguir a análise completa.

 

O discurso de Bolsonaro

Figura 1: rede de conceitos de Bolsonaro no primeiro turno

O antipetismo é uma das bases do discurso de Bolsonaro durante o primeiro turno. “PT” aparece no grupo roxo de conceitos, associado também a termos como “lama”, de mensagens que sugerem que o PT deixou o país na “lama”, “fim” e “mentiras”. Outro termo presente é “corrupção”, que Bolsonaro associa ao PT e se coloca como um candidato não envolvido em esquemas ilícitos. O discurso contrário à esquerda também aparece no grupo verde em que estão os conceitos “esquerda” e “adversários”. Há, ainda, menções a Lula no grupo azul, em que estão os termos “presidiário” e “cadeia”.

Baseado na associação do PT com os problemas do Brasil, inclusive a corrupção, Bolsonaro se lança como o candidato da mudança. Esta ideia aparece no uso de conceitos como “mudar”, bastante central na rede, e “resgatar” (ambos no grupo roxo). Este último também aparece como ideia de resgatar valores importantes para o brasileiro. Dentre estes valores estão entidades como “Deus” e “família”, também bases fortes do discurso de Bolsonaro.

A questão do atentado ao candidato, ocorrido em 6 de setembro, não aparece com muita força na rede. Isto se dá também em função da data inicial de coleta, estabelecida em 15 de setembro, já que antes desta data Haddad não possuía seu Twitter oficial de campanha. Ainda assim, os termos “atentado” e “hospital” aparecem no módulo verde.

O grupo laranja possui alguns conceitos com fortes associações, como pode ser visto pelo tamanho das arestas que os conectam (quanto maiores as arestas, maior a frequência com que os termos aparecem nos mesmos contextos). Os principais são “obrigado”, “forte” e “abraço”. Estas palavras aparecem com muita frequência quando Bolsonaro compartilha mensagens de apoiadores, mostrando também que a reprodução de mensagens de apoio foi uma de suas estratégias durante a campanha.

Outro grupo que possui arestas pesadas entre conceitos é o módulo preto, composto somente por três termos. Dois destes representam mais uma das estratégias utilizada pelo candidato: a realização de transmissões ao vivo (“live”) pelo “Facebook”. Estas ocorriam também em função do estado de saúde do candidato, que estava hospitalizado e não podia realizar campanha nas ruas.

A visualização geral dos termos mais utilizados pelo candidato revela também que Bolsonaro não focou seu discurso em propostas. Sobre temáticas deste tipo, podem ser identificados os termos “economia” e “impostos” no grupo verde água, reforçando as ideias liberais da equipe do candidato. “Segurança” (grupo roxo) também aparece como uma das áreas de foco do candidato.

 

Figura 2: rede de conceitos de Bolsonaro no segundo turno

 

No segundo turno, Bolsonaro centraliza ainda mais o seu discurso no antipetismo. “PT” assume maior centralidade na rede de conceitos em função de sua coocorrência com outros termos em diversos contextos. “PT” segue fortemente associado a “cadeia” e “bandidos”, reforçando a ideia do partido como corrupto e de Haddad como um candidato guiado por Lula, que está preso.

“Violência” que não tinha destaque nos tweets de Bolsonaro durante o primeiro turno passa a assumir posição mais central no segundo turno. Um dos contextos de seu uso é relacionado mais uma vez ao “PT”, que aparece entre as conexões mais fortes do conceito. Isto ocorre porque Bolsonaro argumenta que a violência cresceu durante o período de governo petista, citando inclusive a violência a minorias – as quais o PT historicamente defende. O conceito também aparece em função de ataques violentos associados a apoiadores do candidato, como o assassinato de um mestre de capoeira após o homem declarar que votou no PT. O site #VítimasDaIntolerância também reúne diversas acusações do tipo.

Bolsonaro, por sua vez, se isentou de culpa por atos violentos e afirmou em entrevista que quem foi vítima de violência foi ele próprio: “Esta pergunta não deveria ser invertida? Quem levou a facada foi eu. Um cara lá, que tem uma camisa minha, comete um excesso, o que eu tenho a ver com isso? Eu lamento. Peço ao pessoal que não pratique isso, mas eu não tenho controle sobre milhões de pessoas que me apoiam. Agora, a violência vem do outro lado, e eu sou uma prova viva disso”. Reafirmando isto também em seu Twitter.

Outro conceito bastante conectado a “PT” é “fake news”. Esta aparece em dois contextos: criticando seus opositores de espalhar informações falsas sobre Bolsonaro; e desmerecendo as acusações apresentadas em reportagem da Folha de S. Paulo de uso de caixa 2 para espalhar mensagens de ataque ao PT via whatsapp, ironizando inclusive adversários (como o próprio “PT” e também o “PSOL”, no grupo laranja) por reproduzirem a informação. O termo “mentiras” (módulo laranja) também aparece algumas vezes neste contexto.

Termos como “abraço”, utilizado em compartilhamentos de mensagens de apoiadores, e “Facebook”, plataforma utilizada também para campanha e transmissões ao vivo, voltam a aparecer. Da mesma forma, “Deus” e “família”, entidades defendidas por Bolsonaro continuam a receber destaque no seu discurso.

Novamente propostas de governo não recebem destaque nas mensagens de Bolsonaro. O termo “saúde” se refere a saúde do próprio candidato, que foi reavaliado em função de sua recuperação durante o segundo turno. Além de “economia”, agora aparece também “educação”. Já os temas sobre segurança perdem destaque.

 

O discurso de Haddad

Figura 3: rede de conceitos de Haddad no primeiro turno

 

No primeiro turno, a estratégia discursiva de Haddad foi associar seu nome a Lula, ex-presidente pelo PT. Isto fica claro por dois motivos: 1) o conceito “Lula” é bastante central na rede, é o segundo termo que aparece em mais contextos (atrás apenas de “Brasil” – “Haddad” é o sexto); e 2) a conexão entre “Haddad” e “Lula” é a mais forte da rede, o que indica que foram os termos que mais apareceram em coocorrência. Há também forte conexão entre “Lula” e “presidente” – por exemplo, “presidente” aparece associado a “Lula” quase duas vezes mais que a “Haddad”. Isto ocorre porque este sempre menciona aquele como “presidente Lula”.

Haddad também menciona sua vice, “Manuela” D’Ávila – este tipo de menção não ocorre nas mensagens de Bolsonaro (que não cita seu vice). As referências Manuela, porém, ocorrem em contextos pouco variados, sendo mais frequentes em algum tipo de atividade de campanha, por isto a associação com os termos “caminhada” e “ato”, todos no módulo laranja.

Diferentemente do que ocorre com Bolsonaro, um dos focos do discurso de Haddad são os projetos de governo. Estes aparecem principalmente em termos presentes no grupo rosa e com especial atenção a “educação” (também associada com “prouni” e “universidades”) e “empregos” (associado ainda com “trabalho” e “trabalhador”). Haddad ainda toca em temas como “economia” e “direitos”, presentes no módulo verde.

Associado aos projetos de governo de Haddad e seu plano para o Brasil está o termo “retomar”, que auxilia a compreender o tipo de discurso proposto pelo candidato. A base de sua ideia está em retomar o crescimento do Brasil, aproximando esta retomada com ênfase nos dois mandatos de Lula e também aos programas sociais desenvolvidos pelo PT.

O fundamento da “democracia” também está bastante enraizado no discurso do petista. A defesa da democracia aparece como uma temática em diversos contextos e é usada como um valor básico das propostas e do ideal de país apresentados por Haddad. Além disso, no discurso, Bolsonaro é apresentado como um candidato contrário aos fundamentos democráticos.

Aparecem ainda na rede, no módulo azul, os termos “fake” (news – notícias falsas), “mentiras” e “denuncie”. Estes conceitos estão conectados na rede porque Haddad menciona informações falsas que estavam sendo produzidas durante a campanha e incentiva seus seguidores a denunciar este tipo de prática.

Figura 4: rede de conceitos de Haddad no segundo turno

 

O discurso de Haddad muda bastante seu foco no segundo turno. “Bolsonaro”, também muitas vezes mencionado como “adversário” passa a ser uma figura central nas mensagens. Um dos pontos frequentemente mencionados por Haddad foi a decisão de Bolsonaro de não participar de “debate” durante o segundo turno. Estes dois termos possuem a conexão mais forte da rede, o que mostra que são os dois termos mais utilizados em conjunto.

“Bolsonaro” e “adversário” também estão associados a “mentiras” e “whatsapp”. Haddad acusa Bolsonaro de construir sua campanha com base em mentiras sobre o petista vinculadas via whatsapp. Haddad cita, inclusive, fontes de veículos jornalísticos para realizar esta crítica, como a própria reportagem da Folha de S. Paulo anteriormente mencionada.

“Adversário” também aparece associado a “ditadura”, o que leva a outro argumento central de Haddad no segundo turno: a “defesa” da “democracia” (ambos no grupo verde escuro). Estes termos possuem a segunda conexão mais forte da rede. “Democracia” também está entre os termos mais mencionados por Haddad em seus tweets e é o quinto que aparece em mais contextos na rede. A indicação de Bolsonaro como um candidato antidemocrático, já presente no discurso de Haddad no primeiro turno, é intensificada. Desta forma, o candidato se constrói como a alternativa democrática no pleito. “Democracia” também aparece associada a valores como “liberdade” e “diálogo” no módulo verde escuro.

O foco em uma candidatura do campo democrático retira a figura de “Lula” do papel central que possuía no primeiro turno. Além do núcleo argumentativo na democracia, Haddad também assume um papel mais central como o candidato que representa este campo. O termo “presidente”, por exemplo, agora está fortemente associado ao candidato. Haddad também se preocupa mais em construir a si mesmo como candidato, apresentando-se como “professor”, inclusive em mensagem no Dia dos Professores. Até mesmo o logo de campanha muda do primeiro para o segundo turno (imagens abaixo).

 

Figuras 5 e 6: logos de Haddad no primeiro e segundo turno

 

Por fim, Haddad segue utilizando o Twitter para apresentar seus projetos de governo para áreas como: “educação”, “segurança”, “economia”, “emprego” (“trabalho”), além de mencionar “direitos” relacionados a estas e outras áreas. Estes termos formam o grupo roxo, que tem como principais conceitos “propostas” e “projeto”. Neste grupo aparece ainda “violência” que está principalmente associada a violência de militantes de Bolsonaro, em atos de violência física e em estratégias violentas (também discursivamente) por eles apoiadas.

 

Análise geral

Bolsonaro mantém uma mesma estratégia principal ao longo da campanha: o antipetismo. Este já está presente em suas mensagens no primeiro turno e é ainda mais forte durante o segundo turno. O candidato associa os problemas brasileiros, em especial a corrupção, ao partido e se apresenta como a via da mudança para isto.

No segundo turno, o discurso de Bolsonaro acaba tocando também em outros temas. Um deles é associado a fake news, em função da reportagem da Folha de S. Paulo que o acusa de ter utilizado caixa 2 para espalhar informações falsas sobre o PT. Bolsonaro desmerece a publicação e ainda acusa seus adversários de espalhar fake news sobre ele. Da mesma forma, “violência”, em decorrência de diversos atos violentos após o dia 7 de outubro, aparece nas mensagens de Bolsonaro no segundo turno. O candidato, porém, se exime de qualquer responsabilidade por estes atos.

Haddad, ao contrário de Bolsonaro, tem estratégias distintas no primeiro e segundo turno. Enquanto no primeiro turno associa fortemente sua imagem a Lula, no segundo turno Bolsonaro passa a ser central como um personagem antagônico. Neste cenário a defesa da democracia também entra como um argumento central no discurso de Haddad, que se estabelece de forma mais central como candidato e chama todo o campo democrático para demonstrar apoio a sua candidatura, já que a constrói como a única via democrática no pleito.

Haddad também dá destaque para suas propostas e seu plano de governo – ao contrário do que faz Bolsonaro. Este poucas vezes menciona propostas e quando o faz se resume a poucos temas, como economia e educação. Já Haddad mantém parte de suas mensagens focadas em apresentar projetos para diversas áreas, como educação, segurança, economia, emprego e ainda na defesa de direitos.

De forma geral, Bolsonaro é monotemático, focando principalmente no antipetismo. Haddad tem variações em seu discurso, destacando em suas mensagens o apoio de Lula, a defesa pela democracia, o antagonismo de Bolsonaro e ainda suas propostas de governo. Enquanto Bolsonaro se move pela ideia da mudança, Haddad destaca a retomada do crescimento, associando-o principalmente a gestão de Lula durante o primeiro turno e a defesa da democracia no segundo.

É importante mencionar que o Twitter é apenas um dos meios de campanha dos candidatos. Outros espaços e comunicação e mesmo as campanhas por meio de militâncias também tomam parte central nos significados explorados pelos candidatos durante o período eleitoral. Ainda assim, o discurso institucionalizado dos candidatos no Twitter permite vislumbrar algumas das principais características de suas campanhas.

 

Coleta e análise

Os tweets foram coletados diretamente dos perfis dos candidatos com o auxílio do plug-in Web Data Research Assistant. A análise de conteúdo e contingência foi realizada por meio do site Textometrica. A visualização dos grafos foi feita no Gephi. Foram utilizadas duas métricas para a análise: 1) grau (representado pelo tamanho dos nós), que identifica as vezes que um conceito aparece associado a outros nas mensagens analisadas (quanto maiores os nós, em mais contextos os conceitos aparecem); 2) modularidade (representada pela cor dos grupos), que facilita na identificação de conceitos que aparecem mais frequentemente em um mesmo contexto.