Elton Medeiros (UFPR)[1]
Desde sua descoberta, Beowulf tem atraído a atenção de diversos pesquisadores e tradutores. A história dessas traduções para o inglês moderno e para outros idiomas reflete não apenas o desenvolvimento dos estudos linguísticos e históricos em torno da obra, mas também as mudanças de atitude dos pesquisadores ao encararem o poema, o que se evidencia pela terminologia empregada e pelo estilo das traduções.
As primeiras traduções de Beowulf foram realizadas por Humfrey Wanley em 1705 (que traduziu não mais do que alguns versos), na Inglaterra, e por Grímur Jónsson Thorkelin em 1815, na Dinamarca. Thorkelin foi o primeiro a traduzir todo o poema para outro idioma: o latim. Apesar de seu pioneirismo nas traduções do poema, o resultado foi extremamente insatisfatório. Thorkelin não tinha grandes conhecimentos do inglês antigo e não compreendeu a narrativa da obra claramente, o que o levou a considerações errôneas de tradução sobre a trama do poema. Sua tradução traz a seguinte narrativa: os jutos e os frísios, unidos sob a liderança de Grendel, decidem investir contra os scyldingas do rei Hrothgar. Beowulf vai até a corte de Hrothgar para ajudá-lo e enfrenta Grendel por três vezes, ferindo-o na segunda vez e matando-o na terceira (quando são relatadas as histórias de Sigemund e Heremod). Mas Grendel retorna à vida e ataca novamente, sendo auxiliado por sua mãe numa batalha naval, quando Beowulf o derrota mais uma vez. Beowulf, então, volta para a sua terra natal cheio de tesouros, torna-se rei por cinquenta anos e, em sua velhice, enfrenta e derrota o dragão.
Após Thorkelin, a segunda tradução de maior importância foi realizada por N. F. S. Grundtvig em 1820, também na Dinamarca, sob o título Bjovulfs Drape: Et Gothisk Helte-Digt fra forrige Aartusinde af Angelsaxisk paa Danske Rim;[2] mais tarde, em 1841, ele alterou o título para Bjovulfs Drape eller det Oldnordiske Heltedigt,[3] reafirmando assim suas convicções sobre as supostas “verdadeiras origens” do poema. Apesar de reconhecer as falhas da edição e tradução de Thorkelin, Grundtvig era um admirador dela. Ainda assim, decidiu realizar sua própria tradução. Para que pudesse ter um maior entendimento e precisão sobre o conteúdo do poema, ele estudou inglês antigo e, supostamente, memorizou o texto inteiro. Isso teria lhe dado uma visão muito mais completa da narrativa, do contexto do poema e dos elementos que teriam faltado no trabalho de Thorkelin. Por estar familiarizado com a antiguidade, com a história dinamarquesa e o folclore germânico, Grundtvig foi capaz de corrigir vários equívocos de Thorkelin. Ele identificou diversos nomes próprios que Thorkelin não tinha identificado. Mesmo sem ter contato com o manuscrito, pôde deduzir trechos perdidos do poema e identificar a figura do rei Hygelac com a do histórico Chochilaicus, que teria atacado a região da Frísia no começo do século VI, ligando-o, assim, à narrativa de Beowulf.
Apesar de ser, em vários aspectos, superior à tradução de Thorkelin, o trabalho de Grundtvig não agradou aos pesquisadores da época. Naquele momento, os interessados em Beowulf desejavam ter um contato literal, direto, com o conteúdo do poema, diferentemente do que aquela nova tradução lhes oferecia. Grundtvig traduziu o poema para o dinamarquês (a primeira tradução de Beowulf para um idioma moderno) e classificou o poema como uma história a ser oferecida aos jovens, como um exemplo do passado de seu país. Considerava Beowulf uma obra com grande e belo potencial artístico, mas mal executada como um todo. Segundo ele, comparado às obras de Homero, este seria um poema heroico simplório, até mesmo infantil. Desta forma, alguns estudiosos veem a edição de Grundtvig mais como uma paráfrase do que como uma tradução, uma vez que ela seria uma tentativa de retificar as supostas falhas e imperfeições do poema original (segundo seu ponto de vista neoclássico), adaptando-o a uma forma mais adequada a sua época e a seus propósitos pessoais nacionalistas.
Em 1820, além da de Grundtvig, outra tradução também estava sendo elaborada, mas não na Dinamarca. Tratava-se da tradução de Sharon Turner para o inglês moderno. Embora tivesse realizado a tradução de alguns trechos do poema em 1805, Turner não compreendia o poema suficientemente. Para sua obra de 1820, os erros e a falta de precisão sobre a narrativa continuaram. Um de seus erros mais notórios foi ter interpretado o combate de Beowulf contra Grendel como sendo Hrothgar cometendo um assassinato.
Independentemente das traduções de Grundtvig e Turner, no mesmo ano de 1820 um terceiro trabalho era concluído, que, no entanto, só seria publicado em 1826. Tratava-se da tradução, também para o inglês, de John Josias Conybeare, que já em 1814 havia publicado uma tradução da Batalha de Finnsburh em latim (com uma paráfrase em inglês). Ele manteve alguns dos erros de Thorkelin e produziu uma tradução carregada de um linguajar poético semelhante ao Paraíso perdido de Milton. Ao contrário de Grundtvig, que via o poema simplesmente como uma bela obra artística, Conybeare encarava-o como um documento histórico que retratava a antiguidade dos povos germânicos.
A visão de Beowulf como mera obra artística primitiva ou como documento histórico da antiguidade do norte europeu só começaria a mudar a partir de Mitchell Bruce Kemble, que, em 1833, publicou uma edição do poema, revisada e atualizada em 1835, seguida, em 1837, de uma tradução em prosa. Sem qualquer outra pretensão além de tornar o poema mais acessível ao público em geral, Kemble traduziu o poema em prosa para o inglês, de forma tão literal quanto lhe foi possível, mas mantendo-o compreensível; acrescentou um glossário que fosse útil como elo com o original, uma forma de os leitores poderem interpretar o poema por si mesmos. A tradução de Kemble fez o interesse por Beowulf crescer, possibilitou melhores condições para trabalhar com o poema e tornou-o acessível àqueles que não eram especialistas na obra e não conheciam o inglês antigo.
Desde Thorkelin, Beowulf foi chamado de “épico” e comparado a obras da antiguidade clássica, como a Odisseia e a Eneida. Após a tradução de Kemble, surgiu a tendência de ver Beowulf como um épico desvinculado da tradição mediterrânea e até mesmo da cristã. Um épico da cultura germânica. Para tanto, em 1839 e 1840, surgem as duas primeiras traduções de Beowulf para um idioma moderno que não o inglês ou uma língua escandinava: o alemão. Em 1839, Heinrich Leo afirmava que o texto era na verdade alemão, como se pode ver no título de sua tradução: Bëówulf, dasz älteste Deutsche, in angelsächsicher Mundart erhaltene, Heldengedicht. Porém, foi a tradução de Ludwig Ettmüller, de 1840 — Beowulf: Heldengedicht des achten Jahrhunderts —, que se revelou a de maior relevância desde a de Kemble, na qual ele se baseou. Para sua edição do poema, Ettmüller tentou separar as supostas camadas do poema. Uma camada mais antiga (“original”) e uma mais tardia (“cristã”). Em 1875, ele publicou uma nova edição, onde são omitidas as passagens que ele acreditava serem interpolações de um autor cristão. Ettmüller buscava o “texto original”, e para isso ele ofereceu a tradução mais fiel possível, com versos que tentavam imitar a métrica aliterativa original. Sua tradução costuma ser criticada por utilizar palavras estranhas, muitas vezes as próprias palavras originais em inglês antigo (seguidas de notas explicativas). Apesar disso, Ettmüller foi um dos primeiros a elaborar a hipótese de múltiplos autores da obra, e trazer o poema para a esfera dos pesquisadores alemães, responsáveis por uma parte considerável dos estudos sobre Beowulf até o final daquele século.
Além de Ettmüller, em 1855, Benjamin Thorpe realizou uma nova tradução para o inglês, mas cheia de erros e sem grande impacto entre os pesquisadores do poema. Em 1857, C. W. M. Grein traduziu os versos de Beowulf linha por linha, realizando assim a primeira tradução do poema para o alemão diretamente do inglês antigo. Sua tradução foi publicada novamente em 1863 e mais uma vez em 1883, revisada por Richard Paul Wülker. Alguns anos depois, em 1859, Karl Simrock (que já havia traduzido a Nibelungenlied) produziu a terceira tradução de Beowulf em alemão. E, em 1863 (com reedição em 1898), Moritz Heyne realizou a quarta versão do poema, em versos livres. Assim, a partir do final do século XIX, surgiu uma tradição de traduções confiáveis de Beowulf em alemão.
Se os alemães se voltavam cada vez mais para o poema em novas traduções, na Inglaterra as coisas não eram muito diferentes. Em 1857, John Earle publicou uma versão de Beowulf intitulada A Primitive Old Epic, na revista Household Words, de Charles Dickens. Seria apenas em 1892 que publicaria oficialmente sua tradução, utilizando um linguajar arcaico, na tentativa de dar um aspecto heroico ao poema. Mas foi a tradução de William Morris e A. J. Wyatt que mais se utilizou de um linguajar formal e arcaico para o poema. Wyatt era o acadêmico, e Morris, o poeta (conhecido por ter traduzido obras como a Eneida e a Nibenlugenlied). Wyatt havia feito uma versão em prosa do poema, e em 1895 William Morris realizou sua tradução em versos, com base nela.
Além daquelas para o inglês moderno e para o alemão, novas traduções começaram a surgir no final do século XIX para outros idiomas. Em francês, no ano de 1877, L. Botkine realizou a tradução parcial de Beowulf. Hubert Pierquin, em 1912, fez uma tradução completa em prosa e publicou-a lado a lado com o texto original; em 1991, André Crépin publicou uma edição em verso.
Na Itália, Giuseppe Pecchio publicou uma versão parcial do poema em 1833, seguindo a tradução de Sharon Turner de 1820. Mas foi apenas em 1882 que uma tradução completa e mais precisa foi publicada por Giuseppe Schumann. Esta edição foi logo seguida pela de Giusto Grion, em 1883. Entretanto, foi apenas em 1934, com a tradução literal em prosa de Federico Olivero, que Beowulf se tornou mais popular entre o público italiano.
A primeira tradução do poema para o sueco foi realizada em 1889, por Rudolf Wickberg, em versos, evitando imitar a aliteração do texto original e visando à composição de uma versão de fácil leitura e moderna. Em 1954, Björn Collinder publicou uma nova tradução de maior qualidade; em 1958, o arqueólogo Sune Lindqvist excluiu, em sua versão, todas as passagens que considerava de caráter cristão, e publicou o restante na forma de uma crônica.
Na Holanda, a primeira tradução de Beowulf é de 1896, feita por L. Simons; uma segunda viria em 1930, e uma terceira em 1977 por Jan Jonk. Na Noruega, a primeira tradução foi em 1921, por Henrik Rytter. Na Finlândia em 1927, por R. Dillström. A primeira tradução no Japão foi feita por Fumio Kuriyagawa, em prosa, em 1931. Na Rússia, a primeira tradução foi realizada por Boris Iarkho, em 1934, e uma segunda, mais completa, em 1975, por V. Tikhomirova. Na Bulgária, os primeiros trechos de Beowulf foram traduzidos em 1937, por R. Rusev. Em 1966, Anna Przedpelska-Trzeciakowska realizou na Polônia uma versão para crianças, baseada na tradução em inglês de Rosemary Sutcliff, de 1961. Em 1964, Y. Magdi Wahba traduziu, no Egito, o poema para o árabe. A primeira tradução para o islandês é de 1983, por Halldóra B. Björnsson, e na Hungria a primeira tradução só surgiria em 1994, por Szegő György.
Na Espanha, uma tradução voltada para crianças foi publicada em 1934, por Manuel Vallvé. Mas a primeira tradução direta de passagens do poema foi feita por Maria Manent em 1947; já a primeira tradução completa, em prosa, foi realizada em 1959 (republicada em 1962), por Orestes Vera Pérez.
Em língua portuguesa, a primeira versão da narrativa de Beowulf apareceu no Brasil em 1955, numa revista em quadrinhos. Essa versão foi originalmente escrita em italiano, por Enrico Basari, para uma revista em quadrinhos, em 1941, e em 1955 a história surgiu, traduzida anonimamente para o português, sob o título O monstro de Caim. Dentre todas as versões já produzidas com base no poema (livros, filmes, quadrinhos etc.) está é a mais “criativa” de todas.[6]
Apesar de esta ter sido a primeira vez em que a história de Beowulf apareceu em língua portuguesa, foi só em 1992 que surgiu, no Brasil, sua primeira tradução de fato, realizada por Ary Gonzáles Galvão. Esta tem o mérito de ser a primeira tradução completa do poema para o português; entretanto, apresenta problemas. Galvão optou por uma tradução em versos livres, tentando por vezes imitar a aliteração do poema original (nem sempre com sucesso) e lembrando em certa medida as primeiras traduções do século XIX. Além disso, por vezes ele utiliza termos anacrônicos que não condizem em nada com o contexto e com o cenário do poema, lembrando muito mais as gestas de cavalaria do século XII-XIII do que o mundo norte-europeu dos séculos VI-X. Entretanto, o maior problema da obra de Galvão se refere aos versos do poema. Enquanto o texto original do manuscrito de Beowulf possui 3182 versos, a tradução de Galvão termina com 3129 versos, sem maiores explicações sobre os 53 versos faltantes, fato que, numa leitura mais atenta, pode ser explicado pela omissão de partes da narrativa original ao longo da tradução.
A segunda tradução de Beowulf em língua portuguesa — e a primeira integral — ocorreu em 2007, realizada dessa vez por Erick Ramalho.[7] A obra de Erick Ramalho é inegavelmente superior à de Galvão. Contudo, é necessário ressaltar que o autor claramente optou por priorizar, na tradução, os aspectos estéticos do poema, em detrimento de seus aspectos semânticos, fato que fica claro logo na introdução, que revela sua intenção de dar ao texto em língua portuguesa um ar altivo, ao verter o poema anglo-saxônico para versos decassílabos, e valendo-se de um linguajar que lembra muito o estilo lírico de Camões em Os Lusíadas, ou ainda as obras shakespearianas. O resultado, ainda que interessante, é bastante peculiar e anacrônico.
Em 2014, tivemos a publicação da tradução realizada por J. R. R. Tolkien, que até então encontrava-se inédita.[8] Tradução polêmica e que dividiu opiniões. Para o público em geral, sem sombra de dúvida, a publicação desse novo volume do autor de O senhor dos anéis é muito mais do que bem-vinda, por ser mais uma joia para o acervo da memorabilia tolkieniana. Para os estudiosos da biografia do autor, o Beowulf de Tolkien — assim como outros de seus trabalhos — é extremamente importante para a compreensão de seu processo criativo e da forma pela qual as obras do passado norte-europeu serviram como fonte de inspiração para o nascimento de suas obras de ficção. Sendo assim, essa nova publicação torna-se mais uma peça do mosaico que compõe a vida e a obra de seu autor, e, por meio desse enfoque, não apenas esse texto, como outros que fazem parte do corpus de Tolkien e que ainda permanecem inéditos, não apenas seriam muito bem recebidos, como deveriam ser publicados o quanto antes. Contudo, para o público acadêmico voltado aos estudos medievais, o livro realmente tem muito pouco a oferecer. Em primeiro lugar, Tolkien concluiu sua tradução de Beowulf em 1926,[9] e apenas quase noventa anos depois ela foi publicada. Além disso, apesar de a tradução ter sido concluída, ela nunca foi revisada por Tolkien. E, ao que tudo indica, nunca foi intenção do autor publicá-la. Uma das razões seria o perfeccionismo do autor e sua incapacidade de encontrar uma versão definitiva do texto que lhe agradasse, como ele explica em uma carta ao colega Kenneth Sisam, datada do mesmo ano: “Eu tenho Beowulf totalmente traduzido, mas dificilmente está de meu agrado. Eu lhe enviarei uma ‘amostra’ para sua livre apreciação — apesar de gostos divergirem e, de fato, ser difícil agradar a mente de alguém…” (TOLKIEN, 2014, p. 2). Isso poderia explicar muitas das “imprecisões” e o estilo antiquado, até mesmo pedante, que algumas vezes se encontra no texto, muito próximo do estilo das traduções do final do século XIX. E é este o grande e principal problema a respeito do Beowulf de Tolkien: trata-se de uma tradução de certa forma inconclusa.
Muitos quiseram traduzir Beowulf num estilo que acreditavam ser reconhecido como “heroico”. Outros tentaram reproduzir a aliteração e a estética da poesia do texto. Já outros evitaram qualquer tipo de imitação do estilo original da obra e tentaram recriar o poema num idioma moderno, enquanto outros ignoraram completamente o estilo poético e decidiram reconstruir o poema em prosa.
Entretanto, mais importante do que tudo isso é o fato de que, em todas as traduções, sempre estará presente o conflito entre um antigo poema num idioma germânico arcaico, que representa um universo e uma sociedade que remontam a um tempo mítico, e um público moderno. Ao traduzir um texto como Beowulf, é uma tarefa quase impossível impedir que o mundo e a época que nos cercam influenciem na tradução, assim como, em contrapartida, também é quase impossível não ser influenciado pelo poema. Desta forma, a tarefa de traduzir uma obra como Beowulf poderia ser muito bem resumida através das palavras de Friedrich Nietzsche ao dizer que “aquele que luta contra monstros deve cuidar para que, na luta, não se transforme também em monstro” (2001, p. 89).
Referências:
BJORK, Robert E. e NILES, John D. A Beowulf Handbook. Lincoln: Nebraska University Press, 1998.
MEDEIROS, Elton. Beowulf e outros poemas anglo-saxônicos (séculos VIII – X). São Paulo: Editora 34, 2022.
NIETZSCHE, Friedrich. Para além do bem e do mal.
TOLKIEN, J. R. R. Beowulf: A Translation and Commentary together with Sellic Spell. Londres: HarperCollins, 2014.
[1] Professor Adjunto do Departamento de História da Universidade Federal do Paraná (UFPR) na área de História Medieval. Lattes: http://lattes.cnpq.br/0301440474007673
[2] “O poema de Beowulf: um poema heroico gótico do milênio passado traduzido do anglo-saxão para versos dinamarqueses.”
[3] “O poema de Beowulf ou o antigo poema heroico nórdico.”
[4] “Beowulf, o mais antigo poema heroico alemão, composto no dialeto anglo-saxão.”
[5] “Beowulf: poema heroico do século VIII.”
[6] A reconstrução da história pode ter sido concebida sob a influência da tradução de Sharon Turner e de Giuseppe Pecchio e é extremamente distorcida em relação ao poema original. Por exemplo, a história começa com o pagão “Rogar” (Hrothgar) assassinando seu bom irmão cristão “Etheow” (Ecgtheow) numa disputa por terras, incentivada pelo maligno espírito Grendel; Beowulf, como filho do rei morto, é então obrigado a servir Rogar para pagá-lo pelos ritos fúnebres realizados. Temendo que Beowulf usurpe seu trono, Rogar envia-lhe uma mensagem em runas, dizendo-o para matar Grendel. Grendel intercepta a mensagem e promete matar Beowulf, mencionando o poder mágico de sua mãe, Frotha. Uma grande batalha envolve os “ringuedanos” (“Ring-Danes”, os daneses) contra os “geatos” (os geatas), enquanto Beowulf e Grendel (este, sob a influência da magia protetora de Frotha) confrontam-se a certa distância da batalha. Durante a luta, o sangue cristão de Beowulf espirra sobre o monstro, anulando a magia pagã. Isso possibilita a Beowulf cortar a cabeça de Grendel, e depois levá-la para o rei Rogar. Ao final da história, Rogar se torna um monge penitente e deixa seu reino para Gunnar. A história termina com o moribundo Beowulf carregado aos céus por um coro de anjos e sentado no trono de Thor. Como podemos ver, é óbvia a completa deturpação da narrativa original do poema.
[7] Um fato digno de nota é que, ao menos até o momento da redação final deste texto, todas as traduções do poema em língua portuguesa são de autoria brasileira. Não foi possível localizar nenhuma tradução de Beowulf realizada em solo português.
[8] J. R. R. Tolkien, Beowulf: A Translation and Commentary together with Sellic Spell, Londres, HarperCollins, 2014.
[9] Tolkien, que já lecionava na Universidade de Oxford, tinha por volta de 34 anos.
Publicado em 18 de abril de 2023.
Como citar: MEDEIROS, Elton Oliveira Souza de. Translatio Beowulfii: Traduzindo monstros e heróis em nossa contemporaneidade. Blog do Poiema. Pelotas: 18 abr. 2023. Disponível em: https://wp.ufpel.edu.br/poiema/texto-translatio-beowulfii-traduzindo-monstros-e-herois-em-nossa-contemporaneidade/. Acesso em: data em que você acessou o artigo.
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