Por João Madeira/Reportagem em Curso
A arte funciona como uma válvula de escape, permitindo que escapemos, de forma lúcia, da loucura do mundo, do cotidiano e das preocupações. Seja para matar o tédio, provocar reflexões sobre a vida ou oferecer uma nova perspectiva, ela exerce um papel essencial. A música, em particular, tem o poder de mexer com as emoções, fazer rir, chorar, dançar, pular ou até entrar em uma roda punk.
O punk rock é uma dessas expressões artísticas. Embora possa não parecer atraente à primeira vista, carrega uma beleza própria por sua agressividade, transgressão e espírito contestador. Ele tira as pessoas da zona de conforto, mas também diverte. O mais fascinante é sua acessibilidade: qualquer um pode tocar. Foi justamente essa simplicidade que deu origem aos Ramones.
“I Just Want to Have Something to Do” (Eu só quero ter algo para fazer)
Na Nova Iorque da década de 1970, em meio à Guerra Fria e às instabilidades políticas e econômicas da América do Norte, a classe trabalhadora sofria com o desemprego e a perda do poder aquisitivo. O sonho americano parecia distante. Sem muitas opções de lazer, os jovens se reuniam para jogar basquete, usar drogas, beber ou ouvir bandas como Beatles, Rolling Stones e Stooges, tentando imitar o som dos ídolos. Com limitações técnicas, o estilo era tocar rápido, com palhetadas para baixo e bateria no ritmo 4×4, semelhante ao de Ringo Starr, mas a 120 bpm.
Assim nasceu o movimento punk, que influenciou a indústria musical não apenas pelo som, mas também pela filosofia de vida, pelo “faça você mesmo” e pelo senso de comunidade. O objetivo não era fama ou sucesso no show business, mas sim participar de algo maior e espalhar mensagens para quem quisesse ouvir.
A cena de Pelotas e Marcelo Rubira
Em Pelotas, Marcelo Rubira foi impactado pelo Rock in Rio de 1985. Aos 14 anos, apaixonou-se pelo rock and roll e começou a buscar discos, fitas e informações em revistas da época. Não satisfeito em apenas ouvir, decidiu tocar. O quarto de sua casa se transformou em uma sala de ensaio, onde amigos se reuniam para fazer música. Hoje, aos 53 anos, Rubira é uma figura fundamental no apoio à cena independente de Pelotas. Seu estúdio, conhecido como “Bokada do Rubira”, recebe inúmeras bandas para ensaios, gravações e produções musicais. Além disso, ele opera o áudio dos shows organizados pelas bandas locais.
Espaços de resistência e comunidade

Imagem: Galpão Satolep
O Galpão e a Ocupação Canto de Conexão, conhecida como “Okupa”, são fundamentais para a cena underground da cidade. Eles recebem bandas de metal e punk rock e, com os eventos, arrecadam fundos para apoiar causas sociais, ajudando estudantes e pessoas em situação de vulnerabilidade. A “Cozinha das Mais Velhas” é um exemplo de solidariedade, fornecendo alimentação para quem precisa. Durante a pandemia e as enchentes de maio de 2024, vários eventos foram organizados para arrecadar doações, demonstrando o forte engajamento social do movimento.
Marinas Found
Pedro Soler, vocalista, guitarrista e compositor da banda Marinas Found, sempre foi apaixonado por punk rock. Com amigos do colégio, decidiu formar uma banda para se divertir e tocar músicas que gostavam. Mais do que isso, era uma forma de canalizar a raiva da política e gritar o que tinha para dizer. Para ele, a música é um meio de expressão, fuga dos problemas e troca de ideias com diferentes pessoas. Em 2024, o Marinas Found completou 10 anos, com músicas no Spotify e apresentações em diversas cidades do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. A banda já participou do clássico programa Radar, da TVE, e, em 2025, lançará um novo álbum de forma independente.
HardCorePride
O HardCorePride (HCP) é um coletivo e selo musical fundado em 2013 pelo músico e produtor Esmute, baterista da banda Suburban Stereotype. O HCP tem como objetivo fomentar o cenário underground com shows e festivais. Entre os destaques, trouxeram bandas como Dead Fish e Sugar Kane, referências no hardcore nacional. Os Ratos de Porão também tocaram em Pelotas, no Galpão, com Marcelo Rubira na parte técnica.
O selo de Esmute, pelo Avapor Estúdio, lançou bandas como She Hoos Go, Suburban Stereotype e o rapper Zudizilla, que, em 2025, se apresentará no Lollapalooza em São Paulo, rompendo a bolha do underground.

Under também é resistência. Imagem: João Madeira
O mais importante nessa comunidade é o espírito do “faça você mesmo”. Eles fazem as coisas acontecerem, fomentam cultura, compartilham mensagens de reflexão e ajudam o próximo — tudo isso com muita música, barulho e festa.