Por Lívia Silveira e Paola Oliveira/Reportagem em Curso

A agricultura é uma atividade diretamente influenciada pelo clima, e qualquer alteração nesse fator pode comprometer as produções. As mudanças climáticas representam um grande desafio, pois as plantas são sensíveis a secas, altas temperaturas e excesso de água, exigindo constantes adaptações. O equilíbrio climático é essencial para o crescimento adequado das plantações, mas esse cenário tem se tornado cada vez mais instável.

Nos últimos anos, eventos climáticos extremos têm se tornado mais frequentes em todo o mundo. O principal fator que desequilibra o sistema natural da Terra é a ação humana, responsável por emissões cada vez mais altas de carbono. Segundo a Organização das Nações Unidas, 2024 foi o ano mais quente dos últimos 175 anos. Essas mudanças afetam especialmente os pequenos produtores da agricultura familiar, que, sem acesso a tecnologias avançadas, precisam lidar com os impactos de maneira mais rudimentar.

Fernando Santana Moraes, agricultor de Tapes/RS, relata como as mudanças climáticas afetam sua produção e quais medidas se tornam indispensáveis para mitigar os danos:

“No momento de preparação do solo para o plantio e também depois, na floração das lavouras, podem ocorrer períodos de seca. Nesses casos, os prejuízos são significativos, podendo levar a perdas de produtividade.”

Para reduzir os danos, ele destaca a importância de medidas como o armazenamento extra de água em açudes e o uso de sistemas de irrigação. Entre as soluções, estão a aspersão – que pulveriza umidade sobre as plantas – e a irrigação por gotejamento, que leva a água diretamente às raízes.

Como tem épocas que chove muito na região, o jovem produtor que aparece na foto que abre a reportagem, armazena água em açudes construídos em vários pontos da propriedade, mais o sistema de aspersão, que é um método de irrigação que simula a chuva, distribuindo água de cima para baixo sobre as plantas e o solo.

Quais são os efeitos climáticos extremos?

  • Baixas temperaturas: O frio intenso também pode prejudicar o plantio. A redução da incidência de raios solares nas folhas afeta a fotossíntese, processo pelo qual a planta produz energia. Além disso, o estresse hídrico e a queda na produtividade das culturas são consequências diretas do frio extremo.

  • Secas: A água é essencial para o desenvolvimento das plantas, que, na maioria dos casos, precisam ser irrigadas regularmente. Períodos prolongados de estiagem podem causar danos severos, reduzindo a produtividade, aumentando os custos operacionais e, em casos extremos, levando à perda total das colheitas.

  • Excesso de chuva: Embora a água seja fundamental para as plantações, seu excesso pode ser igualmente prejudicial. A quantidade ideal varia de acordo com cada cultura, e chuvas prolongadas podem causar enchentes, resultando na perda da safra. Além disso, o excesso de umidade pode dificultar o transporte dos alimentos, comprometendo sua qualidade, especialmente em regiões remotas.

  • Aumento da temperatura: A temperatura é um fator crucial para o crescimento saudável das lavouras. O estresse térmico pode reduzir a produtividade, acelerar a evaporação da água e diminuir a disponibilidade de recursos hídricos para irrigação.

Os mais impactados por esses eventos extremos são os pequenos produtores, muitos dos quais dependem exclusivamente da agricultura familiar para sobreviver. A perda das colheitas pode afetar não apenas suas rendas individuais, mas também a economia de comunidades inteiras. Sobre isso, Antônio Martins, agricultor há mais de 70 anos, desabafa:

“É muito triste, porque de uns tempos para cá, produções praticamente inteiras são dizimadas. Às vezes, é um ano inteiro de trabalho perdido.”

Contudo, quando falamos de produção agrícola é preciso ter cuidado ao diferenciar, o agronegócio, que é um produtor extensivo, já a agricultura remete a produções de menor porte. Nesse contexto as produções agrícolas se mostram mais vulneráveis. Além disso vale ressaltar que um país tão grande como o Brasil sofre não somente com mudanças climáticas a níveis mundiais, mas também com eventos isolados correspondentes ao clima de cada local.

Afinal, qual a causa desses efeitos?

Há décadas, instituições globais como a ONU alertam os países sobre o aquecimento global. Esse fenômeno tem diversas causas, sendo a principal delas o excesso de emissão de gás carbônico, que compromete a atmosfera e intensifica o efeito estufa. Além de contribuir diretamente para o aumento das temperaturas ano após ano, o efeito estufa provoca uma série de desequilíbrios ambientais que afetam todo o planeta.

A meteorologista Cláudia Rickes, formada pela Universidade Federal de Pelotas e especialista em Física da Atmosfera pela Universidade Estadual do Ceará, explica que o aumento do aquecimento global nos últimos 100 anos está diretamente relacionado à alta concentração de gases de efeito estufa na atmosfera, resultante das atividades humanas. No entanto, ela ressalta que também há variações naturais nas temperaturas do planeta em uma escala interanual, conhecidas como variabilidade climática natural.

Fonte: arquivo pessoal

Consequências socioeconômicas

As perdas na produção agrícola não afetam apenas aqueles que dependem diretamente desse trabalho para sobreviver, mas também colocam em risco a segurança alimentar de toda a população brasileira. Diante desse impacto, é fundamental destacar as consequências que enfrentamos como resultado da crise climática.

  • Perda de fonte de renda: Na agricultura brasileira, muitas famílias têm nessa atividade sua única fonte de sustento. Quanto mais as produções são afetadas por eventos climáticos extremos, maior o impacto na renda dessas pessoas. Em situações mais graves, a perda de uma safra inteira pode deixar esses trabalhadores totalmente desamparados.

  • Crise na segurança alimentar: Diferente do agronegócio, que tem como foco a exportação de alimentos em larga escala, os pequenos agricultores são responsáveis por grande parte dos alimentos consumidos diariamente pelos brasileiros. A quebra na produção afeta diretamente a disponibilidade desses itens no mercado interno.

  • Aumento de preços: Com a oferta reduzida, os alimentos se tornam mais escassos e, consequentemente, mais caros. Isso agrava a desigualdade social, pois alimentos ricos em nutrientes acabam ficando restritos à parcela da população com maior poder aquisitivo.

Os brasileiros já sentem esses impactos no dia a dia, como demonstra uma pesquisa realizada pelo Datafolha em junho de 2024.

Diante desse cenário, torna-se essencial adotar soluções e adaptações locais na agricultura – um dos setores mais vulneráveis às mudanças climáticas. Somente assim será possível reduzir os impactos, fortalecer a produção agrícola e garantir um futuro mais justo e sustentável.