A objetificação da mulher negra na sociedade

Nayane Ximendes Menezes
Taiane Teixeira Mendes

O presente estudo aborda a questão da objetificação da mulher negra na sociedade, desde como era no passado até os dias atuais. Ainda assim, de modo a enfrentar parte da história de Sarah Baartman e trazendo também dados de uma pesquisa desenvolvida no Brasil,  “Visível e Invisível: a vitimização de mulheres no Brasil”, desenvolvemos este ensaio acadêmico. Além disso, buscando problematizar o contexto brasileiro, trazemos como elemento de discussão a figura da “Globeleza”, para que possamos refletir sobre a objetificação da mulher negra neste país. Diante disso,  questionamos como a objetificação feminina opera nos corpos de mulheres negras? Sendo assim, a pesquisa tem como objetivo geral salientar que as mulheres negras foram durante muitos anos violadas invariavelmente, e atualmente, são mulheres capazes de lutar pelos seus direitos e devem ser respeitadas.

Para iniciarmos essa discussão, é necessário que se compreenda o conceito de objetificação. A objetificação consiste em analisar o indivíduo como um objeto, invalidando o emocional e o psicológico do ser humano. Geralmente está ligado à objetificação sexual feminina, a fim de que a mulher seja desumanizada, onde somente sua aparência importa, sendo considerada apenas para oferecer prazer ao público masculino (LIMA, 2016).

Ao longo da história se tem diversos exemplos da objetificação da mulher negra, desde as escravas que eram usadas para iniciar sexualmente os filhos dos patrões durante o período colonial, ou até mesmo as escravas que eram comercializadas sexualmente a outros homens, no qual serviam como uma fonte de renda para seus “senhores”. Perante este cenário, podemos citar como exemplo Sarah Baartman.

Nascida na África do Sul, pertencente à etnia khoisan, em meados de 1800 foi levada para Europa por um colono, com a promessa de trabalhar em espetáculos, porém, passou a ser exposta seminua em circos devido as suas nádegas sofrerem uma condição chamada esteatopigia, que faz com que a pessoa tenha nádegas protuberantes devido à acumulação de gordura (PARKINSON, 2016).

Tida como um “fenômeno bizarro humano”, Sarah era exibida em feiras europeias, ridicularizada, hipersexualizada e tinha suas nádegas tocadas sem consentimento, sendo mais tarde explorada sexualmente onde acaba viciada em álcool e cigarro, levando a sua morte precoce aos 26 anos (PARKINSON, 2016).

Segundo Lélia Gonzalez, em seu livro “Por um feminismo Afro-latino-americano aponta que:

“Branca para casar, mulata para fornicar, negra para trabalhar” — tornou-se uma síntese privilegiada de como a mulher negra é vista na sociedade brasileira: como um corpo que trabalha, e que é super explorado economicamente, ela é uma  faxineira, cozinheira, lavadeira etc. que faz o “trabalho pesado” das famílias de que é empregada; como um corpo que gera prazer e que é super explorado sexualmente, ela é a mulata dos desfiles de Carnaval para turistas, de filmes pornográficos etc., cuja sensualidade é incluída na categoria do “erótico-exótico. (GONZALEZ, 2020, p. 154).

Diante dessa consideração, podemos analisar que historicamente a mulher negra era considerada como uma mulher explorada, aquela que era responsável por todas as atividades, como dito acima, a que faz o trabalho pesado. Ainda assim, Lélia ressalta que:

Durante os desfiles das escolas de samba que a mulata, em seu esplendor máximo, perde o anonimato e se transforma em uma Cinderela: adorada, desejada e devorada por aqueles que foram até lá justamente para cobiçá-la. Sabendo que amanhã sua fotografia estará nas páginas de todos os jornais e revistas internacionais, elogiada e admirada pelo mundo inteiro, ela segue magicamente, mais e mais brilhante naquele espetáculo luminoso. (GONZALEZ, 2020, p. 150)

Ademais, nota-se que, o corpo da mulher negra nos dias atuais continua sendo objetificado e temos como exemplo, a mulata globeleza, que surgiu na década de 90 durante o período de carnaval.

A imagem da globeleza a ser passada na televisão era de uma mulher negra, nua, com o corpo pintado e sambando como uma passista. Diante disso, nunca se disse que deveria ser uma mulher negra, mas sempre foi. Há na sociedade um estereótipo de que o samba ou a capoeira estão no sangue, sendo relacionados às pessoas negras. O Dossiê Patrícia Galvão, enfatiza que:

A reflexão sobre a imagem das mulheres também é uma parte importante do enfrentamento a estereótipos discriminatórios que autorizam violências. No caso  específico das mulheres negras, no Brasil, esses estereótipos são agravados pela  carga histórica escravagista de objetificação e subalternidade que reforçam mitos racistas como o da mulher negra hipersexualizada sempre disponível. (GALVÃO, Online)

Dito isto, é notório que a partir da objetificação surge o assédio. A pesquisa Visível e Invisível: a vitimização de mulheres no Brasil, com a realização do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e o Instituto de Pesquisas Datafolha de 2023, aponta que a mulher negra (preta + parda) apresenta porcentagens maiores em relação às mulheres brancas, quando se trata de assédio. Por exemplo, a mulher negra com um percentual de 49,1% já as mulheres brancas com um percentual de 42,2% quando o assunto é assédio. Por conseguinte, é notável que as mulheres negras são mais vulneráveis a sofrerem este tipo de violência devido a sua invisibilidade.

Portanto, observa-se que, diante do que foi expresso acima, a objetificação é uma temática atual, pois ainda encontra-se momentos em que este assunto é discutido. No geral, as mulheres não têm o direito de ser quem são, principalmente as mulheres negras, que são desvalorizadas, marginalizadas e sexualizadas constantemente. Atualmente, através da luta dos movimentos sociais, as mulheres negras estão trazendo mais visibilidade para a sociedade, mobilizando direitos previstos constitucionalmente e pautando essas questões em âmbito de Estado..

O principal objetivo desta discussão é expor como a mulher negra é vista na sociedade, desde o passado até os dias atuais. Branca para casar, mulata para fornicar e negra para trabalhar, é assim como são vistas pelo patriarcado.

A mulher negra ainda é condicionada à servidão, ou seja, explorada de todas as maneiras, servindo na sociedade como “mucama”, a que não pode se posicionar e exigir seus direitos. Embora a legislação preveja uma dita igualdade, como é possível observar da discussão travada neste ensaio, há um longo caminho entre o previsto em lei e a realidade enfrentada por essas sujeitas.

Vale ressaltar que, atualmente, o cenário encontra-se um pouco melhor, pois apesar das discussões levantadas por Lélia Gonzalez na década de 1980, estas são ainda consideradas extremamente atuais, devido aos movimentos de resistência presentes. Há, historicamente, a união de mulheres negras lutando pelos seus direitos, a fim de mostrar que são capazes e podem ser muito mais que um objeto de satisfação masculina e isso acaba dando uma visibilidade melhor na sociedade, tendo em vista que suas vozes ecoam na produção de políticas públicas e mudanças institucionais. Porém, há um longo caminho a ser percorrido.

Referências

GONZALEZ, Lélia. Por um feminismo afro latino americano. Zahar, 2020. Disponível em: https://mulherespaz.org.br/site/wp-content/uploads/2021/06/feminismo-afro-latino-americano. pdf

LIMA, Iana. O que é objetificação da mulher? Politize, 11 fev. 2016. Acessado em: 11 dez. 2023. Online. Disponível em: https://www.politize.com.br/o-que-e-objetificacao-da-mulher/

PARKINSON, Justin. Sarah Baartman: a chocante história da africana que virou atração de circo, BBC NEWS BRASIL, 11 jan. 2016. Acessado em 11 dez. 2023. Online. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/01/160110_mulher_circo_africa_lab

SENA, Isabela. Sarah Baartman e a hipersexualização da mulher negra, 23 mar. 2015. Acessado em 11 dez. 2023. Online. Disponível em: https://blogueirasnegras.org/sarah-baartman-e-a-hipersexualizacao-da-mulher-negra/.

Violência e racismo. S/d, Dossiês Agência Patrícia Galvão. Acessado em 11 dez. 2023. Online. Disponível em: https://dossies.agenciapatriciagalvao.org.br/violencia/violencias/violencia-e-racismo/.

Visível e Invisível: A Vitimização de Mulheres no Brasil, 2023, 4º Edição. Fórum Brasileiro de Segurança Pública; Instituto de Pesquisas Datafolha. Acessado em 11 dez. 2023. Online. Disponível em: https://assets-dossies-ipg-v2.nyc3.digitaloceanspaces.com/sites/3/2023/03/visiveleinvisivel-20 23-relatorio.pdf