Por Eduardo Ritter/Superávit Caseiro
Enquanto a população brasileira está desesperada pelo infindável aumento nos preços de produtos e serviços, o presidente Jair Bolsonaro (PL) se desespera pelas publicações de pesquisas para o pleito de outubro. Ao contrário do índice de pessoas que pretendem votar na reeleição do presidente, a taxa de inflação oficial do Brasil, medido pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), aumenta mês a mês, chegando aos 11,73% no acumulado de 12 meses. Nas pesquisas, por outro lado, Bolsonaro segue estagnado, independente do órgão que desenvolve o levantamento, e não consegue se aproximar do seu maior rival, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O desespero do presidente fez com que ele apelasse para uma parcela importante do seu eleitorado nas eleições de 2018: o empresariado e, mais especificamente, os empresários do setor de supermercados. Pressionado pela alta da inflação com a estagnação salarial e o valor lastimável do salário mínimo (R$1.212), o presidente e o ministro da Economia, Paulo Guedes, pediram hoje para que os empresários do setor segurem os preços da cesta básica, minimizando os seus lucros.
Eis a ironia do aperto presidencial: em um discurso que sempre defendeu um estado mínimo, é óbvio que o governo não vai ter recursos suficientes para investimentos sociais significativos. Bem como é lógico que a população vai sentir isso na pele. Menos arrecadação significa menos dinheiro para investimento social em saúde, educação, segurança, etc, e menos dinheiro para injetar na economia brasileira através de reajustes salariais e programas sociais mais robustos. Diante desse cenário, o que fazer? Ora, apelar para a parte dos apoiadores que estão no empresariado. Eis a sina do cachorro que corre atrás do próprio rabo: boa parte do empresariado apoiou Bolsonaro pensando, principalmente, em uma redução de impostos e no aumento do lucro. E eis que o presidente apoiado por parcela significativa do empresariado pede para que eles minimizem os lucros! Que coisa, não?
Durante evento realizado hoje na Associação Brasileira de Supermercados (Abras), participando virtualmente, o presidente declarou:
“O apelo que eu faço para os senhores, para toda a cadeia produtiva, é para que os produtos da cesta básica obtenham o menor lucro possível, para a gente poder dar satisfação a parte considerável da população, em especial os mais humildes”.
A logística de um governo que adota uma política de estado mínimo acredita na seguinte utopia: o Estado arrecada menos e gasta menos, afinal, tem menos dinheiro. Com isso, as empresas lucram mais e, teoricamente, dariam mais retorno para a sociedade. Acontece que em qualquer curso básico de Administração, Economia, Gestão, Sociologia ou Contabilidade, todos aprendem uma obviedade logística do mercado: o objetivo de uma empresa é o lucro, caso contrário, ela seria uma ONG sem fins lucrativos. A responsabilidade social de cada empresa/empresário vai ser sempre subjetiva. Ou seja, a sociedade fica à mercê da boa vontade de alguém que não tem nenhuma obrigação legal de fazer algo pela sociedade sem obter retorno financeiro. Eis que, em um cenário de crise inflacionária, o governo acaba se corroendo por dentro, pois ele não tem recursos para auxiliar à população e precisa apelar ao empresariado, que depois de ouvir as choradeiras governamentais, vai “pensar no caso”. Ou seja, temos um governo mendigando ajuda, submisso, encurralado, desesperado e sufocado pelo cenário eleitoral que vai sendo desenhando.
E o que faz boa parte da população quando não tem mais para onde correr? Apega-se à intervenção divina. E é exatamente isso que o presidente faz: “Temos fé em Deus que essa crise dos dois países [Rússia e Ucrânia] terá seu ponto final brevemente, assim como o vírus, que, ao que tudo indica, já teve o seu ponto final”, comentou. No entanto, do jeito que a coisa vai, não há intervenção divina que minimize o aperto econômico da população e o desespero eleitoral do presidente.