STF define que “revisão da vida toda” é constitucional

Gabriel Corrêa França
Marcus Lenin Silva dos Reis
Pedro Henrique Landim Oliveira de Souza
Rafael Cardoso Neves
Richardy da Silva Azevedo
Sérgio Luís da Silva Godoy Neto

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF)  concluiu por 6 votos a 5, no dia 1 dezembro de 2022, o julgamento sobre a chamada “revisão da vida toda”. O colegiado, por maioria dos votos, considerou possível a aplicação de regra mais vantajosa à revisão da aposentadoria de segurados que tenham ingressado no Regime Geral de Previdência Social (RGPS) antes da Lei 9.876/1999. Foi justamente esta lei que criou o fator previdenciário e alterou a forma de apuração dos salários de contribuição para efeitos do cálculo de benefício.

A matéria foi discutida no Recurso Extraordinário (RE) 1276977, com repercussão geral (Tema 1.102). O entendimento é de que, quando houver prejuízo para o segurado, é possível afastar a regra de transição introduzida pela lei, que exclui as contribuições anteriores a julho de 1994. A Previdência Social é um sistema de proteção social que garante renda e assistência financeira para trabalhadores e seus dependentes em caso de aposentadoria, morte, invalidez, doença, acidente de trabalho e outros eventos relacionados ao trabalho. O sistema é administrado pelo governo federal e operado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

A decisão do STF sobre a revisão para vida toda deve ser seguida por tribunais de todo o país, com isso, os processos que aguardavam o julgamento devem tramitar com mais celeridade, mas o acórdão do julgamento ainda não foi publicado, o que o INSS alega ser imprescindível para cumprir a decisão.

 O ministro Alexandre de Moraes observou que, consoante o entendimento do STF, eventual suspensão nacional de processos não é automática, cabendo ao relator verificar a conveniência da medida, a seu ver, os argumentos do INSS quanto às atuais dificuldades operacionais e técnicas para a implantação da revisão dos benefícios são relevantes, entretanto, os pedidos de suspensão vêm sendo reiteradamente rejeitados nas instâncias ordinárias, inclusive com a imposição de multa ao INSS. Em razão disso, requer que a suspensão seja mantida em controle concentrado até que o entendimento firmado no julgamento se torne definitivo com o trânsito em julgado.

Conforme o relator Ministro com o relator Marco Aurélio, quanto à evocação do artigo 97 da Lei Maior, a direcionar a atuação do Tribunal Pleno ou do órgão especial que lhe faça às vezes, o Colegiado de origem não incorre em erro de procedimento. Limitou-se a apreciar a controvérsia à luz da legislação de regência. Descabe confundir simples interpretação de norma, à luz do caso concreto, com declaração de inconstitucionalidade.  Cumpre ao Supremo definir a compatibilidade, ou não, com a Constituição Federal, do direito de o segurado escolher o melhor benefício, considerada a mudança do regime previdenciário promovida pela Lei n.º 9.876/1999.

No voto do Ministro Dias Toffoli manifestou-se pela repercussão geral da matéria, compreendendo, entre outras razões, que o “tema possui, inegavelmente, repercussão geral nos aspectos econômico e social, dado o impacto financeiro que a prevalência da tese fixada pelo STJ pode ocasionar no sistema de previdência social do país e o imenso volume de segurados que podem ser abrangidos pela decisão a ser proferida neste feito”, e, no aspecto jurídico, de eventual violação da cláusula de reserva de Plenário pelo acórdão recorrido. No mais, anotou que a temática em foco é diversa daquela objeto do Tema 616, que foi delimitada à incidência do fator previdenciário (art. 2º da Lei 9.876/1999) no cálculo do salário-de-benefício de segurados filiados ao RGPS até 16/12/1998, em contraposição à regra de transição trazida pelo art. 9º da Emenda Constitucional 20/1998. O Tribunal Pleno aderiu a essa compreensão, para reconhecer a existência de repercussão geral da questão suscitada. Antes de entrar no mérito, rapidamente, aqui é importante afastar a preliminar, porque o INSS arguiu ofensa à cláusula de reserva de plenário, ou seja, arguiu ofensa à Súmula 10 do Supremo Tribunal Federal, ao argumento de que o Superior Tribunal de Justiça teria afastado o art. 3º da Lei n.º 9.876 com base em fundamento constitucional, teria afastado a regra transitória, declarando-a inconstitucional.

 Mas, dado o impacto social da decisão, a suspensão deve ser analisada sob condições claras e definidas. A Adriane Bramante, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), afirma que os argumentos do INSS “são apelativos e sem fundamentação jurídica, pois a tese já teve julgamento favorável aos segurados e a ata, publicada — o que permite a tramitação dos processos normalmente”.

De acordo com a ministra do Supremo tribunal de justiça (STJ) a previdência social constitui direito social, e, nessa medida, garantia assegurada pela Constituição da República (art. 6º da CF/88), não seria razoável ignorar toda a vida contributiva do segurado por conta da regra de transição, na hipótese da referida regra implica menor renda mensal inicial do benefício, em relação à aplicação da regra permanente.

Os trabalhadores brasileiros contribuem para a Previdência Social por meio de descontos mensais em seus salários, que são repassados ao INSS. Com base nessas contribuições, os trabalhadores têm direito a benefícios previdenciários quando cumprem determinados requisitos, como tempo de contribuição e idade. Os benefícios da Previdência Social incluem aposentadoria por idade, aposentadoria por tempo de contribuição, aposentadoria especial para profissões com exposição a agentes nocivos à saúde, pensão por morte, auxílio-doença, auxílio-acidente, salário-maternidade e outros. Atualmente, a idade mínima para aposentadoria é de 62 anos para mulheres e 65 anos para homens. No entanto, há algumas exceções para profissões específicas, como professores, policiais e trabalhadores rurais. Para se aposentar por tempo de contribuição, é preciso ter 35 anos de contribuição, se homem, e 30 anos, se mulher. No entanto, desde a reforma da Previdência de 2019, essa regra mudou, e agora é preciso ter idade mínima de 61 anos, se homem, e 56 anos, se mulher, além de 35 e 30 anos de contribuição, respectivamente. Para aqueles que já estão no mercado de trabalho, há regras de transição que consideram a idade e o tempo de contribuição. Além da aposentadoria por tempo de contribuição, também é possível se aposentar por idade. Nesse caso, a idade mínima é de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres, com pelo menos 15 anos de contribuição. Aposentadoria especial: para profissões que envolvem riscos à saúde ou à integridade física, como mineiros e eletricitários, há aposentadoria especial, que permite a aposentadoria com menos tempo de contribuição. Pensão por morte: em caso de falecimento de um segurado do INSS, seus dependentes têm direito a receber a pensão por morte, calculada com base no valor da aposentadoria do falecido.

A revisão da vida toda se refere ao dispositivo transitório da Lei n.º 8.213/91 para os empregados inscritos no Regime Geral de Previdência Social (RGPS) antes da promulgação da Lei n.º 9.876/99, que modificou a metodologia de cálculo da aposentadoria. A regra de transição estabelece que a média das 80% maiores contribuições realizadas entre julho de 1994 e a data do pedido de aposentadoria deve ser utilizada para determinar o benefício de aposentadoria desses empregados. A revisão vitalícia implica pedir um recálculo do benefício de aposentadoria que leve em consideração todas as contribuições feitas pelo empregado, e não apenas as 80% maiores contribuições feitas desde julho de 1994.

A vinculação com a Lei n.º 8.213/91 é que ela especifica as regras para a concessão de benefícios, inclusive aposentadorias, e atua como alicerce da Previdência Social no Brasil. A própria Lei n.º 8.213/91 traçou a regra transitória aplicável aos empregados vinculados ao RGPS anteriores à Lei n.º 9.876/99, e a revisão vitalícia busca executar essa regra de forma mais favorável aos empregados.

Em 1999 a Lei n.º 9.876/1999  alterou o cálculo das aposentadorias no Regime Geral de Previdência Social (RGPS), que é o sistema previdenciário destinado aos trabalhadores do setor privado no país. A principal mudança introduzida pela lei foi a substituição do sistema de cálculo das aposentadorias, que antes levava em conta a média dos 36 últimos salários de contribuição, pelo sistema de média aritmética simples dos salários de contribuição de todo o período contributivo do segurado. A Lei n.º 9.876/1999 também estabeleceu regras de transição para a aplicação do novo sistema de cálculo das aposentadorias. Segundo essas regras, foram definidos coeficientes de redução que variavam de acordo com o número de anos de contribuição do segurado até a data da publicação da lei. Os segurados que já estavam próximos de completar os requisitos para se aposentar na data da publicação da lei também foram beneficiados por uma regra de transição específica.

Para pedir a revisão da vida toda é preciso apresentar no INSS todos os documentos que comprovem os salários altos antes de 1994, o pedido deve ser feito no INSS antes de ir para a Justiça. Para tal, o cálculo utilizado na RVT é de todos os salários desde a primeira contribuição até a data de aposentadoria. É imprescindível ficar atento ao prazo para pedir o benefício, o prazo é de 10 anos após a data em que o segurado ou pensionista começou a receber benefício e não a partir da data de aposentadoria ou pensão, por conta disso, é preciso ficar atento aos detalhes

É essencial observar que, a revisão do histórico de contribuição completo não é um direito concedido por lei, automaticamente, os beneficiários do INSS que julgarem ter direito a um benefício maior do que o concedido anteriormente, considerando o tempo total de contribuição, podem solicitar a reavaliação de todo o seu histórico de contribuição. É de extrema importância que os beneficiários estejam cientes de que essa revisão não é um direito automático, mas sim algo que precisa ser solicitado e avaliado caso a caso.

  A lei também tratou de outras questões relacionadas à Previdência Social, como a unificação das alíquotas de contribuição dos empregados, empregadores e autônomos e a criação do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), que é um banco de dados que reúne informações sobre a vida laboral e previdenciária dos trabalhadores brasileiros. Quem ainda vai se aposentar pode ter esse direito, desde que se aposente com as regras que valiam até 13 de novembro de 2019 e que tenha salários altos antes de 1994, ou seja, vale a pena para quem teve os salários altos antes de 1994. Sendo necessário analisar caso a caso, os meses sem comprovação de trabalho, o INSS irá considerar o salário mínimo, portanto é fundamental possuir todos os documentos em mãos.

As especificidades do tempo de contribuição e dos valores pagos ao longo dos anos são consideradas na análise individual de cada caso, assim, cabe ao INSS examinar, não advogar ou contrariar a revisão do histórico de contribuição integral. Como cada caso é analisado criteriosa e individualmente, levando em consideração as singularidades do tempo de contribuição e dos valores pagos ao longo dos anos. O benefício poderá, no entanto, ser revogado definitivamente caso a regularização não ocorra dentro do prazo.

É fundamental lembrar que, caso o segurado discorde da decisão de suspensão, poderá inserir recurso administrativo junto ao INSS e buscar a orientação de um especialista em direito previdenciário para resguardar seus direitos e interesses. Uma ação administrativa essencial que pode ser utilizada em circunstâncias específicas é o pedido de suspensão do INSS. Entre os fatores que podem levar ao pedido de suspensão, estão as informações cadastrais desatualizadas, a não apresentação da documentação comprobatória necessária para a concessão ou manutenção dos benefícios e o não comparecimento a intimações ou exames médicos do INSS. O segurado deverá ser informado por carta registrada ou outros meios oficiais caso o INSS decida pela suspensão do benefício, esta notificação deve incluir um tempo de regularização, bem como os fundamentos da suspensão. O benefício será restabelecido se o segurado regularizar a pendência dentro do prazo.

Os procedimentos da “revisão da vida toda”, que visam a permitir que os segurados recebam uma revisão do valor de seus benefícios previdenciários considerando todo o período de contribuição ao INSS, incluindo contribuições feitas antes de julho de 1994, foram suspensos pelo INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social). Nessa avaliação, é levado em consideração o acréscimo de valores de contribuições anteriores a essa data, que poderiam elevar o valor do benefício. O recurso segue uma ordem de suspensão desses processos expedida pelo Supremo Tribunal Federal em abril de 2021, que foi posteriormente derrubada em setembro do mesmo ano. O INSS alega que a decisão não é definitiva e que ainda existem recursos que podem afetar a interpretação da decisão.

Por haver recursos em curso que podem alterar como essa avaliação é vista, o INSS pediu a suspensão dos processos da revisão da vida toda. Em outras palavras, o INSS sustenta que a decisão do Supremo Tribunal Federal que  permitiu a “revisão da vida toda” não é definitiva e está sujeita a revisão. A revisão também pode aumentar significativamente o valor dos benefícios para muitos requerentes, o que teria um impacto financeiro substancial no sistema de seguridade social. Portanto, antes de dar andamento aos processos, o INSS solicitou uma especificação mais precisa de como será aplicada a revisão. A petição do INSS é um documento importante que apresenta os argumentos da instituição em relação à revisão da vida toda. Segundo o INSS, essa medida pode ter um impacto financeiro negativo para o sistema previdenciário, exigindo o pagamento de retroativos para muitos beneficiários e afetando a sustentabilidade financeira do sistema previdenciário. O INSS argumenta que a revisão da vida toda viola o princípio da segurança jurídica, um princípio fundamental do sistema jurídico brasileiro que visa garantir a previsibilidade das decisões judiciais e a proteção da confiança dos cidadãos nas instituições do Estado. Eles afirmam que a revisão da vida toda não tem previsão legal e que não se baseia em uma interpretação correta da legislação previdenciária.

De acordo com a opinião da Procuradoria Geral da República, é óbvio que ignorar as contribuições feitas antes da competência de julho de 1994 viola a expectativa do contribuinte, tendo como o seu direito a maior vantagem. De acordo com o princípio da segurança jurídica, é justo avaliar as melhores contribuições do período integral considerado na construção do salário de benefício. A conclusão aponta que o reajuste da vida completa não tem efeitos financeiros ou atuariais negativos sobre o RGPS (Regime Geral de Previdência Social). Por outro lado, é possível determinar as contribuições efetivamente realizadas, eliminando a limitação temporal e levando em consideração todo o histórico de contribuições do segurado. Note-se que este ajustamento não implica ganho de benefícios sem correspondente diminuição de custos. Simplesmente executar as regras de previdência social corretamente e contabilizar todo o histórico de pagamentos do segurado levará a um pagamento mensal inicial mais alto. Nessa situação, é importante seguir a regulamentação e determinar qual das normas transitórias ou definitivas é mais vantajosa para o beneficiário, considerando os requisitos de aposentadoria previstos na Lei n.º 9.876/99. Finalizando a opinião da PGR, a revisão de toda a vida é uma medida justa que valoriza a verdade das circunstâncias sem pôr em causa a capacidade de pagamento das obrigações da segurança social.

O INSS também menciona que a decisão do STF que permite a revisão ainda não é definitiva e que há recursos pendentes de julgamento que podem mudar o entendimento sobre o tema. Eles alegam que a suspensão do processo é necessária para evitar prejuízos irreparáveis e que a revisão da vida toda pode prejudicar o equilíbrio financeiro e atuarial do sistema previdenciário.

Por fim, o INSS reitera que a revisão da vida toda pode gerar custos administrativos elevados para a instituição, uma vez que seria necessário recalcular os valores de muitos benefícios previdenciários concedidos nos últimos anos. Dessa forma, a petição do INSS apresenta uma série de argumentos para justificar a suspensão do processo que envolve a revisão da vida toda, enquanto aguarda uma decisão definitiva do STF sobre o assunto.

Referências

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