A realidade das mulheres brasileiras diante da violência de Gênero

Bruna Ferreira Dynczuk
Felipe José Santos
Leandro Costa Cantos
Rafaél de Lima
Rudy Machado Karsburg

A luta pelos direitos das mulheres é uma pauta fundamental na construção de uma sociedade mais justa e igualitária, no entanto, apesar dos avanços conquistados ao longo dos anos, a violência de gênero ainda é uma triste realidade. Nesse contexto, algumas decisões proferidas pela justiça brasileira têm se mostrado significativas na luta contra os diversos tipos de violência que afetam as mulheres e cerceiam seus direitos.

Podemos analisar o caso prático, que teve sentença pelo STJ (Supremo Tribunal de Justiça), em 2019, da relatoria do Ministro Marcos Bellizze. O caso em questão trata de uma ação de indenização por danos morais movida por uma mãe em virtude da morte do seu recém-nascido durante o parto, devido a práticas médicas que configuraram violência obstétrica. Trazemos aqui um trecho da decisão que ilustra o fato: “Efetivamente, em sua contestação, o demandado, médico responsável pelo parto, Sérgio Souza Martins, confessou haver tentado a utilização do fórceps, bem como confessou a realização da manobra de Kristeller (f. 75)”.

A decisão do STJ foi favorável à mãe da criança, reconhecendo a responsabilidade civil do médico pelos danos morais causados pela morte do recém-nascido. O trecho citado é parte da fundamentação da decisão, em que o médico confessa a realização de práticas médicas, que são consideradas violência obstétrica e que podem ter contribuído para a morte da criança.

Nesse contexto, a mãe teve o direito de mover a ação de indenização por danos morais, uma vez que a prática de violência obstétrica causou a morte do seu filho e, consequentemente, um grave sofrimento psicológico. A decisão do STJ reconheceu a responsabilidade civil do médico e determinou o pagamento de indenização por danos morais à mãe, que foi fixada em R$ 100.000,00. A decisão ainda reforça a importância da adoção de práticas obstétricas humanizadas, que respeitem os direitos e a autonomia das mulheres, e sejam baseadas em evidências científicas atualizadas.

A manobra de Kristeller é contra indicada pela Organização Mundial de Saúde (OMS, 1996), sendo um procedimento proibido pelo Ministério da Saúde, pelos Conselhos Regionais de Medicina e por diversos Hospitais, exatamente porque é causa de inúmeros traumas maternos. A referida manobra consiste em pressionar a barriga da mulher com força para agilizar o parto e isso configura ato de violência obstétrica. Manobra essa justificada pelo médico em questão, em virtude de “longo período expulsivo”, [fase na qual a mãe faz força para o bebê nascer], mas a ordem cronológica dos registros do fato provou um tempo transcorrido do início dos procedimentos do parto até o ato em questão, de 43 minutos.

Conforme o “American College of Obstetricians and Gynecologists”, a duração normal do período expulsivo pode variar de uma a três horas, dependendo do uso de anestesia e do fato de ser ou não a primeira gestação da mulher. Portanto, 43 (quarenta e três) minutos não se configuram como “longo período expulsivo” a justificar a utilização de manobra proibida. (ACOG, 2003).

Os direitos da mulher são fundamentais para garantir a igualdade de gênero e o pleno exercício da cidadania feminina. A violência contra a mulher afeta profundamente a garantia dos seus direitos, constituindo uma violação direta dos direitos humanos das mulheres. Quando uma mulher é vítima de violência, ela tem seus direitos à integridade física e psicológica, à segurança, à liberdade e à dignidade violada. Além disso, a violência de gênero também pode afetar negativamente outros direitos, como o direito à saúde, ao trabalho e à educação.

Ainda, no contexto do Brasil, podemos destacar ações significativas nos últimos anos, o ministro Ricardo Lewandowski foi o relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.581, que resultou na decisão do STF sobre a presença de doulas (acompanhantes de parto) em hospitais e estabelecimentos de saúde durante o parto. A decisão se deu no julgamento da ação proposta pela Associação de Doulas do Estado do Rio Grande do Sul, que questionava a constitucionalidade de dispositivos da Lei Federal n.º 8.080/1990 e da Portaria do Ministério da Saúde n.º 1.459/2017, que limitavam a presença de doulas em hospitais e estabelecimentos de saúde.

Em março de 2020 a decisão foi unânime em considerar inconstitucional a Portaria do Ministério da Saúde, reconhecendo a importância dessas profissionais no auxílio e suporte às mulheres durante o trabalho de parto. A partir dessa decisão, os hospitais e estabelecimentos de saúde devem permitir a presença delas durante o parto, conforme orientações do Ministério da Saúde.  A decisão também revisitou a discussão sobre a humanização do parto e a importância do respeito aos direitos das mulheres durante esse momento tão importante da vida.

Em maio de 2020, uma decisão passou a ser um marco importante na luta pelos direitos das mulheres no Brasil e na erradicação da violência obstétrica. Ao reconhecer o direito das mulheres a um parto respeitoso e humanizado, livre de práticas que configurem violência obstétrica, o STF reafirmou a importância da dignidade, da integridade física e psicológica e da não-discriminação como valores fundamentais da nossa sociedade. (STF, 2020)

A decisão se deu no julgamento da ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) n.º 635, movida pelo Partido dos Trabalhadores (PT), que buscava garantir o direito das mulheres a um parto respeitoso e humanizado, livre de práticas que configurem violência obstétrica. Na decisão, que teve como relatora a ministra Rosa Weber, o STF reconheceu o direito das mulheres a um parto respeitoso e humanizado, sem violência obstétrica, e determinou que o poder público adotasse medidas para garantir esse direito.

O processo teve como base relatos de mulheres que sofreram violência obstétrica durante o parto, bem como de organizações que lutam pelos direitos das mulheres e dos movimentos feministas. A ação argumentava que as práticas de violência obstétrica violam os direitos humanos, a dignidade das mulheres e sua integridade física e psicológica, além de ferir a Constituição Federal e tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário.

A ADPF foi julgada procedente pelo plenário do STF, por unanimidade, e estabeleceu uma série de diretrizes para o atendimento obstétrico no Brasil, tais como o respeito à autonomia da mulher, a proibição de intervenções desnecessárias ou sem o consentimento da mulher, o direito à presença de acompanhante escolhido pela mulher durante todo o trabalho de parto, entre outras.

Assim, o STF reconheceu o direito das mulheres à assistência adequada durante o parto, incluindo o direito à presença de doulas e à escolha da posição de parto mais confortável para elas. Além disso, a Corte reafirmou que a violência obstétrica configura uma forma de violência de gênero e pode ter consequências graves para a saúde física e psicológica das mulheres.

As mulheres têm direito a uma assistência obstétrica respeitosa e humanizada, que garanta sua integridade física e psicológica. No entanto, a realidade é outra: muitas mulheres ainda sofrem com intervenções desnecessárias, negação de seus direitos reprodutivos, falta de informação sobre seu próprio corpo e sobre os procedimentos médicos que serão realizados, entre outras práticas abusivas.

Em março de 2021, o STJ reconheceu, por unanimidade, que a violência obstétrica é uma forma de violência de gênero. A decisão foi tomada no julgamento de um recurso especial interposto pelo Ministério Público do Rio de Janeiro em um caso de violência obstétrica.

O caso em questão envolvia uma mulher que sofreu violência obstétrica durante o parto, tendo sido submetida a procedimentos invasivos sem o seu consentimento e sem justificativa médica, além de ter sido tratada de forma desrespeitosa e humilhante pela equipe médica. O caso ocorreu em 2013, no Hospital Municipal Rocha Faria, na cidade do Rio de Janeiro. A mulher em questão, identificada apenas como G.M.R., foi submetida a um parto cesáreo, no qual teria sido passado por procedimentos invasivos sem o seu consentimento, como a episiotomia (corte na região do períneo), além de ter sido submetida a manobras de Kristeller e de supino (posição onde a mulher fica deitada com as pernas elevadas), que não são recomendadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS).

Além disso, a equipe médica teria tratado a mulher de forma desrespeitosa e humilhante, utilizando termos inadequados e fazendo comentários ofensivos. A mulher procurou o Ministério Público para denunciar a violência obstétrica sofrida, e o MP moveu a ação civil pública em seu nome. Em primeira instância, o pedido de indenização por danos morais coletivos foi julgado improcedente, mas a sentença foi reformada em segunda instância, que condenou o Estado do Rio de Janeiro e a instituição hospitalar a pagar indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 50.000,00, além de determinar a implementação de medidas para prevenção e combate à violência obstétrica.

O caso chegou ao STJ por meio de recurso especial interposto pelo Ministério Público do Rio de Janeiro, que alegou violação a dispositivos do Código de Defesa do Consumidor e do Código Civil. Em março de 2021, a Quarta Turma do STJ reconheceu, por unanimidade, que a violência obstétrica é uma forma de violência de gênero. Confirmando a condenação do Estado do Rio de Janeiro e da instituição hospitalar ao pagamento de indenização por danos morais coletivos e à implementação de medidas para prevenção e combate à violência obstétrica.

O STJ afirmou que a violência obstétrica pode ser considerada uma forma de discriminação de gênero, pois se baseia em estereótipos de gênero e prejudica as mulheres em sua capacidade de tomar decisões informadas sobre seus próprios corpos e saúde. (STJ, 2021).

Segundo a Lei Maria da Penha, Lei n.º 11.340/2006, são cinco modalidades de violência contra a mulher:

  • Violência física: qualquer ação que ofenda a integridade ou saúde corporal.
  • Violência psicológica: qualquer ação que cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação, como: constrangimento, humilhação, ridicularização, isolamento, perseguição, chantagem, controle, etc.
  • Violência sexual: qualquer ação que limite o exercício dos direitos sexuais ou reprodutivos, como: coação a presenciar ou participar de relação sexual indesejada, impedimento do uso de método contraceptivo, indução ao aborto ou à prostituição, etc.
  • Violência patrimonial: qualquer ação que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de objetos, bens, recursos, documentos pessoais, instrumentos de trabalho, etc.
  • Violência moral: qualquer ação que configure calúnia, injúria ou difamação.

A violência obstétrica é uma realidade preocupante no Brasil, afetando milhares de mulheres todos os anos. E pode se caracterizar em diferentes modalidades; podendo ser física, sexual e psicológica. Essa forma de violência se manifesta por meio de práticas inadequadas ou abusivas por parte de profissionais de saúde durante o parto, tais como a realização de episiotomia sem consentimento, a realização de cesarianas desnecessárias e a negação de métodos alternativos de alívio da dor. Tal qual serve de exemplo o fato referido como base neste trabalho onde como consequência teve a morte da criança durante o parto.

Infelizmente, casos de violência obstétrica, incluindo abuso e violência sexual durante o parto, ainda são uma realidade em muitos países ao redor do mundo. No Brasil, já ocorreram casos que chamaram a atenção da opinião pública, como a divulgação de imagens perturbadoras registradas por uma equipe cirúrgica que suspeitava de comportamentos inadequados de um médico anestesista. Durante o procedimento do parto, o profissional responsável pela aplicação da anestesia geral abusou sexualmente da paciente. O caso gerou uma grande comoção no Brasil e levou a uma série de manifestações contra a violência obstétrica, infelizmente ocorrem casos assim para servir como uma triste ilustração de como a violência de gênero pode se manifestar em contextos de vulnerabilidade, como o parto. (CNN Brasil, 2022).

É fundamental que as mulheres tenham acesso a cuidados de saúde dignos e respeitosos em todas as fases de sua vida, e que a violência obstétrica seja combatida efetivamente. Essas práticas não apenas violam os direitos fundamentais das mulheres e dos recém-nascidos, mas também têm graves consequências para a saúde e o bem-estar das mulheres, podendo levar a complicações físicas e psicológicas a curto e longo prazo.

A violência contra a mulher também pode afetar a sua capacidade de participação na sociedade e na vida pública. Mulheres que sofrem violência muitas vezes ficam limitadas em sua capacidade de tomar decisões e agir de forma autônoma, o que pode prejudicar sua participação na política, no mercado de trabalho e em outros espaços sociais. Os direitos das mulheres incluem a sua universalidade, inalienabilidade e interdependência. Isso significa que esses direitos devem ser garantidos a todas as mulheres, em todas as circunstâncias, e que não podem ser negociados ou retirados. Além disso, os direitos das mulheres estão interligados, de modo que a falta de garantia de um direito pode afetar a garantia de outros.

Entre os direitos das mulheres, destaca-se o direito à igualdade salarial, o direito à saúde, à educação, à segurança e à participação política. Infelizmente, muitas mulheres ainda sofrem com a desigualdade salarial em relação aos homens, têm dificuldades para acessar serviços de saúde de qualidade e enfrentam altos índices de violência de gênero.

Neste sentido, a cientista política Jussara Cardoso em sua pesquisa apresentada na live “Palavra de homem: Mapeando o Imaginário sobre o Feminino” destaca o quanto a falta de representatividade das mulheres no poder de decisão, de aspectos relacionados a si próprias, sobre direitos negados ao longo da história, que impactam duramente na realidade das mulheres brasileiras: “Enquanto os homens forem maioria na política, todo e qualquer projeto para mulheres só passa se eles acharem que mulheres merecem; qualquer projeto proposto por mulheres precisa de aprovação masculina.” Assim, ela defende que os direitos femininos precisam de lutas feministas para serem conquistados, porque são homens que decidiram, e seguem decidindo os limites que eles aceitam que mulheres avancem.

Nessa ótica, a cientista defende que políticas que contemplem as necessidades reais das mulheres; uma licença maternidade coerente com o que significa cuidar de um recém-nascido, uma garantia pública de que não ocorra violência obstétrica, investimento pesado em creches e combate a violência de gênero, por exemplo, só terão resultados satisfatórios quando forem propostos e aprovados por mulheres, que tenham garantido espaço de fala e poder de decisão de forma igualitária neste país.

Enquanto as mulheres continuarem a depender exclusivamente dos homens para decidir sobre seus próprios direitos, eles seguirão negociando esses direitos e todos os outros que impactam diretamente as vidas das mulheres, seus limites e do que eles as limitam. “Aborto, por exemplo, só será regulamentado nesse país, quando for proposto e aprovado por mulheres”, conclui a cientista política.

Ficam evidentes essas desigualdades, se analisamos a participação das mulheres na política. Apesar de representarem mais da metade da população brasileira, as mulheres ocupam menos de 18% das cadeiras no Congresso Nacional e 16% no Senado Federal. Isso significa que as políticas públicas que afetam diretamente a vida das mulheres, são sempre decididas por homens, sem a devida representação das mulheres.

É importante retomar que conforme a decisão do STJ em 2021, a violência obstétrica passou a ser uma forma de violência de gênero e, como tal, está diretamente relacionada à desigualdade que ainda prevalece em nossa sociedade. É fundamental que as mulheres sejam informadas sobre seus direitos e que os profissionais de saúde recebam treinamento adequado para prevenir a violência obstétrica. Além disso, é necessário que a sociedade como um todo se mobilize para erradicar a violência obstétrica e promover a igualdade de gênero em todas as esferas da vida.

Algumas ações que podem ser tomadas ou fortalecidas para alcançar esses objetivos incluem:

  • Educação e conscientização: é importante que a sociedade como um todo seja educada sobre os direitos das mulheres e sobre o que constitui a violência obstétrica. Além disso, a conscientização sobre a igualdade de gênero deve ser promovida desde a infância, por meio da educação nas escolas e da mídia.
  • Denúncia e acompanhamento: as vítimas de violência obstétrica devem ser encorajadas a denunciar os casos e a buscar acompanhamento e apoio. É fundamental que existam canais seguros e acessíveis para denúncias, além de profissionais capacitados para lidar com essas situações.
  • Fortalecimento das políticas públicas: políticas públicas voltadas para a promoção da igualdade de gênero e para a prevenção e combate à violência obstétrica devem ser fortalecidas e ampliadas. Isso inclui, por exemplo, a criação de mais serviços especializados para atendimento às mulheres vítimas de violência obstétrica e o fortalecimento da fiscalização e punição dos casos de violência.
  • Engajamento dos homens: é importante que os homens se engajem na promoção da igualdade de gênero e no combate à violência obstétrica, reconhecendo seus privilégios e responsabilidades nessa luta.

Essas são apenas algumas das ações que podem ser tomadas para promover a igualdade de gênero e erradicar a violência obstétrica. É importante lembrar que a mudança cultural e social é um processo longo e contínuo, que exige o envolvimento de todos os setores da sociedade.

A situação específica de violência obstétrica contra a mulher se torna mais grave quando se tratam de mulheres em situação de vulnerabilidade social, como as mulheres negras e as mulheres de baixa renda. Segundo uma pesquisa realizada pelo Instituto Patrícia Galvão em 2019, as mulheres com menos escolaridade e menos acesso a informações sobre saúde são as que mais sofrem com a violência obstétrica, tendo seu direito à saúde e à integridade física e psicológica violados. A desigualdade de gênero também é um fator agravante, já que muitas vezes as mulheres são desacreditadas e não têm seus relatos de violência levados a sério pelos profissionais de saúde.

Dados do Ministério da Saúde mostram que a violência obstétrica é um problema grave no Brasil. Segundo estudo divulgado em 2018, cerca de 25% das mulheres brasileiras relataram ter sofrido algum tipo de violência obstétrica durante o parto. – Uma em cada quatro mulheres é vítima de violência obstétrica no Brasil –. Esse número sobe para 40,5% entre as mulheres negras. Outro dado preocupante é que, segundo a Organização Mundial da Saúde, cerca de 56% dos partos no Brasil são cesáreas, número bem acima do recomendado pela organização, sendo de no máximo 15%. A realização excessiva de cesáreas pode estar associada a práticas abusivas e desnecessárias durante o parto. (OMS,2018).

O Brasil é frequentemente apontado como um dos países com altos índices de machismo e violência contra as mulheres. Embora seja difícil comparar países em termos absolutos, alguns estudos e indicadores sugerem que o Brasil ainda tem um longo caminho a percorrer em relação à igualdade de gênero. Segundo o relatório do Fórum Econômico Mundial de 2021 sobre a lacuna de gênero global, o Brasil ocupa a 92ª posição entre 156 países avaliados. O relatório considera indicadores como: participação política, igualdade salarial, acesso à educação e à saúde, entre outros. (FEM, 2021).

Além disso, o Brasil tem altos índices de violência contra as mulheres. Segundo dados do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, em 2020 foram registrados mais de 105 mil casos de violência doméstica em todo o país, um aumento de cerca de 2% em relação ao ano anterior. (MMFDH, 2020).

Além disso, o país registra altos índices de feminicídio, o assassinato de mulheres por razões de gênero. O Relatório sobre Feminicídio no Brasil da Organização Internacional do Trabalho (OIT), destaca que o Brasil é o quinto país do mundo com a maior taxa de feminicídio. (OIT, 2019).

Esses dados mostram que a violência de gênero é um problema grave e complexo que afeta as mulheres em todas as regiões e classes sociais do país. Isso não nos deixa dúvidas, que ser mulher no Brasil é uma missão arriscada. Morar em um dos países mais machistas do mundo é conviver diariamente com todos os tipos de agressões. Entre elas está uma prática comum, mas silenciosa, que atinge cada vez mais mulheres, com métodos opressivos por meios e formas diversas e se caracteriza pela apropriação do corpo e processos reprodutivos da mulher pelos profissionais da saúde. Abuso de medicamentos, desumanização, ofensas e até mesmo abusos sexuais, são tipificados como violência obstétrica.

É importante ressaltar que a violência obstétrica é um problema de saúde pública que afeta mulheres em todo o mundo e deve ser abordado por meio de políticas públicas e ações de conscientização para prevenção e proteção das mulheres. É fundamental que medidas sejam tomadas para prevenir e combater essa violência, garantindo às mulheres o direito a uma assistência obstétrica respeitosa e humanizada.

Assim podemos concluir que a luta pelos direitos das mulheres e a luta contra a violência de gênero são duas faces da mesma moeda. É impossível garantir a igualdade e a dignidade das mulheres sem combater a violência de gênero. Destacamos a evolução de conquistas pelos direitos das mulheres através das ações apresentadas neste trabalho, mesmo que as dificuldades e as problemáticas ainda sejam preocupantes.

Decisões como a do STF são uma conquista significativa para os direitos das mulheres no Brasil e representam um passo importante na luta contra a violência obstétrica. Esperamos que essa decisão ajude a conscientizar a sociedade sobre a importância do parto respeitoso e humanizado e contribua para a erradicação da violência obstétrica em nosso país. A decisão do STJ é importante da mesma forma, porque estabelece um precedente jurídico para a proteção dos direitos das mulheres durante o parto. Isso pode ter implicações significativas para a atuação de profissionais de saúde, hospitais e sistemas de saúde em todo o país, que agora podem ser responsabilizados por violações dos direitos reprodutivos das mulheres.

Para haver uma mudança significativa e efetiva, é necessário a unificação de forças, em prol de medidas concretas para garantir a proteção e os direitos das mulheres. Pois, somente com um esforço conjunto e contínuo do governo, órgãos jurídicos, organizações da sociedade civil e indivíduos, será possível acabar com a violência contra as mulheres e garantir que elas possam viver livres, seguras e dignas. Isso envolve a criação de políticas públicas específicas que visem combater a violência de gênero, bem como a implementação de leis rigorosas e eficazes que punam os agressores e ofereçam apoio e proteção às vítimas.

A luta pelos direitos das mulheres e a luta contra a violência de gênero são duas frentes que devem caminhar juntas. É preciso garantir que todas as mulheres tenham acesso aos seus direitos humanos fundamentais e que a violência de gênero seja combatida em todas as suas formas. Além disso, é crucial haver uma mudança cultural que combata a misoginia e o machismo arraigado na sociedade, promovendo a igualdade de gênero e o respeito pelos direitos das mulheres.

Portanto, é de suma importância que todos nós, como membros da sociedade, assumamos o compromisso de nos engajarmos na luta pelos direitos da mulher e trabalhemos unidos na construção de um mundo mais justo e igualitário para elas.

Referências

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BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 1.459, de 24 de maio de 2017. Limita a presença de acompanhantes nos hospitais e estabelecimentos de saúde. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 25 de maio de 2017. Seção 1, p. 72.

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