Kaique Cangirana/Superávit Caseiro

Em artigo publicado no portal da Fundação Getulio Vargas (FGV) na semana passada, o pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da FGV (IBRE), Fernando Veloso, afirma que a qualificação da mão de obra à inteligência artificial (IA) seja a política mais eficiente para garantir a produtividade em meio ao desenvolvimento de novas tecnologias.  

Com base no Relatório Anual do Fundo Monetário Internacional (FMI), o pesquisador considera a complementaridade do uso de IA nas profissões como fundamental para a economia. “A ideia é que o fato de uma ocupação estar exposta à incorporação de IA não significa necessariamente que o trabalhador será substituído por uma máquina, já que a IA pode ter um papel complementar”, afirma.

O FMI aponta que 45% dos postos de trabalho no Brasil estão expostos à capacidade da ação de inteligência artificial, do total, 30% tende a ser substituído pelas novas tecnologias, enquanto apenas 15% dos trabalhadores devem usar a IA de forma complementar. O mesmo relatório aponta um potencial de crescimento de 5% do Produto Interno Bruto (PIB) em dez anos no Brasil, o que deve, na avaliação do economista, ser acompanhado pela capacitação de profissionais para “minimizar os efeitos disruptivos no mercado de trabalho e maximizar o impacto na produtividade e no PIB”.

As capacidades da IA em gerar conteúdo “podem vir a substituir trabalhadores que exercem atividades não-rotineiras”, avalia o economista Fernando Veloso em um artigo publicado no Broadcast da Agência Estado. Atividades não-rotineiras, são aquelas relacionadas ao pensamento e à criatividade. O pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia observa ainda que, há oportunidades para a implementação de IA nas empresas, uma visão otimista frente aos efeitos da IA nos sistemas de produção e mercado de trabalho.

A Recrut.AI, por exemplo, foi desenvolvida para complementar o trabalho de seleção de candidatos para vínculos empregatícios. A tecnologia busca automatizar o trabalho dos recrutadores e segundo o CEO, Patrick Gouy, não substituirá os profissionais. Por mais que a função seja eficiente, considera apenas as informações curriculares, desconsiderando experiências pessoais e características humanas.  

Um relatório conjunto da Microsoft e Linkedin, denominado “Índice de Tendências de Trabalho”, constatou que a IA generativa já é usada por 83% dos trabalhadores intelectuais no Brasil. As motivações principais se concentram em otimizar o tempo, aprimorar a criatividade e priorizar atividades mais importantes. 87% dos gestores brasileiros acreditam que o uso de IA é crucial para se manter competitivo no mercado. A pesquisa que compõe o índice divulgado em maio entrevistou 31.000 pessoas em 31 países.

ChatGPT é um dos recursos de IA mais utilizados contemporaneamente

Outras perspectivas sobre os efeitos da IA

Eduardo Araújo, conselheiro do Conselho Federal de Economia, acredita que o uso de IA confere “uma vantagem competitiva absurda aos usuários”. Em um artigo publicado originalmente no jornal A Tribuna ES, o conselheiro afirma que tecnologias como o ChatGPT já se tornaram “consultores pessoais” no cotidiano. 

A inteligência artificial generativa, aquela que produz mensagens a partir das possibilidades de codificação lógica, é tratada como um processo autônomo pelo conselheiro: “Esse processo, similar ao aprendizado de uma criança, evolui do básico até a capacidade de formular frases complexas e gerar conhecimento”, afirma, ao destacar a divisão que pode se formar entre aqueles que obtêm ou não o acesso a essas tecnologias.

Francisco Gaetani, professor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (FGV EBAPE) e Virgilio Almeida, professor associado a Berkman Klein Center da Universidade de Harvard, destacam, em um artigo conjunto publicado do portal da Fundação Getúlio Vargas, que as aplicações de IA são um risco caso não considerem as implicações sobre a produtividade, o mercado de trabalho e a inovação no Brasil. Para os autores, a discussão se volta à ampliação das desigualdades sociais com um impacto considerado “devastador” para o mercado de trabalho. 

Nessa perspectiva, a discussão passa a acompanhar os avanços mundiais enquanto articula políticas públicas para uma transição dos sistemas de produção: “Como desenvolver políticas que evitem que a IA contribua para um aumento na disparidade de renda? O apartheid digital tem várias facetas, mas neste caso talvez permita também enfrentamentos diferenciados” ressaltam.

Movimentos contra a Inteligência Artificial 

Em 2023, uma série de manifestações explodiram no meio artístico contra o uso de Inteligência Artificial Generativa (IAG). Artistas entraram com ações judiciais e paralisaram suas atividades profissionais para protestar contra a cópia de seus estilos por tecnologias de empresas do setor. A reivindicação do direito autoral acontece pela emergência da percepção de substituição da mão de obra. 

O uso das técnicas e traços intelectuais sem o devido crédito, compensação ou consentimento dos autores, resultaram em discussões sobre alternativas para o setor empresarial e detentores intelectuais, um problema contemporâneo que segue em debate. 

No Brasil, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE)  determinou o aviso obrigatório do uso de IA em conteúdos divulgados na campanha eleitoral de 2024.  A ausência de legislação que regulamente o uso, aumenta o  temor da criação e propagação de notícias falsas. 

Durante anos, momentos de grande transformação dos setores e sistemas de produção foram reconhecidos pela história como revoluções industriais. Atualmente, especialistas afirmam que já vivenciamos uma nova revolução, que em seus procedimentos, buscam gerar riqueza ao utilizar os mecanismos de inteligência artificial (IA) para ampliar a produtividade. Como alternativa que contrasta a contratação de mão de obra, essa operação, segundo especialistas, pode levar a economia a um colapso socioeconômico ou reformar completamente a realidade já conhecida pela sociedade global.