Kaique Cangirana/Superávit Caseiro

A educação financeira tem ganhado mais destaque nos últimos anos. O acesso à informação, a democratização de ferramentas de conhecimento e a necessidade de uma população mais consciente sobre suas finanças, contribui para um cenário otimista quando o assunto é ampliação da sabedoria na gestão de recursos financeiros implicados desde a educação básica. Como universitário e ex-aluno de escola pública, aqui deixo a minha contribuição sobre o assunto em um breve artigo de opinião que não reflete a posição deste site.

Estudos demonstram que a alfabetização financeira no Brasil ainda não é ideal. O Índice de Alfabetização Financeira (IAF) varia entre 30% e 40% em algumas pesquisas, mostrando que muitos brasileiros têm dificuldades em entender conceitos financeiros básicos. A partir desta problemática, o questionamento que fica é: por que não aprendemos sobre finanças na escola? 

Este tema é relevante por se tratar da principal motivação do site “Superávit Caseiro” e um dos meus objetivos como extensionista ao aprender e contribuir neste processo de aprendizado. Uma grande falta acontece hoje nas escolas, a falta de educação financeira. A administração de recursos, os temas básicos de finanças e  as consequências das ações de responsabilidade com o dinheiro são temas riquíssimos e que hoje nos fazem trabalhar com a produção de conteúdos como este texto. 

Nossas crianças obtêm diversos aprendizados como seno, cosseno e tangente, mas quem as garante que tal material é útil? A maioria das pessoas certamente não usarão esses conceitos, fórmulas e princípios matemáticos. A matemática financeira possui uma riqueza grandiosa, em meio a estatísticas, porcentagem e probabilidades. Na escola, meu interesse se localizou neste eixo e, como alguém que sempre detestou matemática, minhas economias hoje podem agradecer por esse interesse genuíno. Perguntei-me sobre a motivação inusitada de gostar do tema quando estudante no ensino médio e cheguei a conclusão de que visava a utilidade da matemática financeira ao invés do interesse por temas totalmente desconectados com a minha realidade.   

Se vamos ter de declarar o Imposto de Renda, por que não somos introduzidos a temas como a alíquota, finalidade, tabela e critérios da contribuição? Se precisamos realizar um financiamento atrelado à taxa básica de juros, por que não conhecemos o Comitê de Política Monetária do Banco Central e suas principais funções? Se reclamamos por ter de deixar de comer doces, pois seu preço aumentou e o salário não, por que não somos introduzidos ao conceito de inflação e suas principais causas? Todas essas situações e questionamentos poderiam ser feitas por uma criança, uma criança comum, curiosa e que questiona o tempo todo. Ainda fica minha indagação: Será que ainda resta dúvidas sobre a suficiente relevância deste assunto nas escolas onde cidadãos são formados? 

Quando deixei o ensino médio passei a ouvir mais termos como “tributação”, “juros”, “imposto de renda”, etc. Era claro para mim que a vida adulta havia chegado e era mais claro ainda que não estava preparado para lidar com todos os problemas que poderiam me afetar financeiramente. Antes de começar a estudar no esforço incessante de “tirar o atraso”, passei mais de um ano gastando todo o salário conquistado através do meu primeiro emprego. 

É claro que aproveitei as experiências com meus gastos e de certa forma ainda não me arrependo por considerar os aprendizados, mas imagine o estrago financeiro na vida de uma pessoa sem qualquer instrução ou virada de chave. Uma mentalidade despreparada pode custar anos de qualidade de vida. Interessantemente, hoje posso conversar com outras pessoas que sentem a mesma sensação de que falta algo em sua formação, algo que permita garantir uma maior estabilidade e qualidade de vida. Quando o assunto é felicidade, acredito que o primeiro passo para tal seja as contas no azul. Por isso, busco cada vez mais a qualificação e a reordenação de hábitos que possam sabotar essa estabilidade financeira. 

A falta de estudo sobre finanças pessoais na escola faz falta ao longo da vida

Essa observação que tenho não obtive por professores nas escolas, tudo isso começou com o alerta de pessoas próximas e a tutela de pessoas integralmente voltadas à educação financeira. A esses profissionais devemos um grande agradecimento e valorização, pois ainda assim, observamos a pouca visibilidade e reconhecimento de que a gestão de recursos carece. Quando observo minha família, gostaria que obtivessem a melhor educação possível e isso inclui a educação financeira, também inclui uma sociedade melhor e consequentemente, uma sociedade menos desigual. 

Apesar da amplitude do tema, me restrinjo a importância deste nas escolas de ensino médio e fundamental, pois quando adultos, nos vemos forçados a lidar com cenários em que necessitamos de conhecimentos da gestão financeira. Diferente de temas específicos como citado anteriormente no exemplo da trigonometria, pois temas ligados à economia familiar são extremamente úteis e certos na vida de qualquer cidadão. Agora, cabe a nós como sociedade, reconhecermos a soberania deste assunto sem desconsiderar a utilidade dos componentes atuais da grade estudantil, pois, sem estes, o raciocínio lógico também pode ser impactado. Falta capacitação, vontade política ou investimento? Os mistérios por trás da ausência de educação financeira nas escolas me levam a acreditar que este assunto é desejado em profundezas, frias e obscuras.  

Um estudo do Instituto XP e da Nova Escola entrevistou mil profissionais de escolas públicas, dentre eles, professores que em sua maioria (74%) assumiram que o assunto “Educação Financeira” deve ser debatido nas escolas, porém, mais da metade (59%) admitem sentir falta de formação específica na área para empenhar esforços em qualquer material que seja didático as aulas sobre a temática. As escolas públicas são obviamente as mais afetadas pela desigualdade social, uma vez que há vontade comum e idealização de projetos voltados ao aprendizado, o que falta para a ação de instituições, comissões e casas de poder político?   

A própria educação financeira tem o poder de reduzir essa desigualdade social. A grade curricular das escolas pode contar com temas que formem pessoas e as aproxime do êxito financeiro, o que impacta também no âmbito socioemocional. Abordei minhas experiências e considerações sobre o tema na esperança de contribuir para os olhares sobre a educação financeira, assim como faço em minhas atividades de extensão e em minhas finanças pessoais. Ter objetivos e ações que os favoreçam é um motivo para se orgulhar, seguiremos, empenhados e entusiasmados, aprendendo juntos por aqui.